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As refeições escolares

Os bobos

Voz às Escolas

2017-10-12 às 06h00

José Augusto José Augusto

O serviço de refeições escolares constitui um pilar fundamental das políticas públicas de promoção do acesso universal à educação escolar. A garantia do fornecimento de refeições a custos controlados para todos os alunos permite assegurar a rentabilização do tempo escolar e o alargamento dos períodos diários de frequência e permanência nas escolas. Porém, a importância maior do serviço de refeições escolares reside na possibilidade de integração na vida escolar dos alunos das localizações mais periféricas, das famílias ocupadas com empregos exteriores a tempo inteiro e das crianças com menos recursos económicos. Também por isso, o serviço de refeições escolares está instituído no nosso sistema educativo como uma medida da ação social escolar que abrange todos os alunos. Adicionalmente, os mais necessitados usufruem ainda de redução do preço das refeições ou de acesso gratuito a essas refeições.

Por outro lado, o modelo adotado - fornecimento de refeições confecionadas no momento e, maioritariamente, no local - configura uma melhor alternativa alimentar que as adotadas noutros países, predominantemente baseadas em alimentos embalados ou em refeições confecionadas em casa.
As refeições escolares deveriam ainda ser um instrumento privilegiado para continuar uma boa educação alimentar trazida da família. Aliás, não merece reparo a composição prescrita para as ementas que os fornecedores do serviço devem respeitar, configurando refeições completas, equilibradas e em quantidades adequadas para as idades a que se destinam. Problemas diversos são os que resultam do seu consumo parcelar pelos utentes, por exemplo, não incluindo a sopa, o pão e a fruta.

Porém, não há educação sem participação no ato educativo e não há participação sem aceitação. Ora, nas últimas décadas, mercê do aumento geral do poder de compra das famílias, da mitigação dos casos de carências alimentares básicas e do crescimento de ofertas de consumo mais atrativas, as refeições escolares estão estigmatizadas aos olhos dos alunos, beneficiando também de larga complacência dos pais na consolidação de estereótipos sobre a alimentação nas cantinas escolares. Paralelamente, florescem à volta das escolas negócios de comidas rápidas, favorecendo consumos menos saudáveis e mais caros que os satisfeitos pelos refeitórios escolares, sem que isso mereça preocupação da generalidade dos encarregados de educação.

Aliás, em muitos casos, as refeições escolares só são importantes se, por algum contratempo, não existirem. Existindo, são genericamente desprezadas e têm uma procura limitada que vai decaindo com o aumento da idade dos alunos. Na verdade, frequentemente, o discurso negativo sobre as refeições escolares serve às crianças e jovens como estratégia para obter dinheiro e consentimento dos pais para consumos alternativos no exterior das escolas. Ao mesmo tempo, a reprodução acrítica desse discurso, pelos pais e encarregados de educação, serve como estratégia para aliviar consciências do peso de aceitar alternativas piores, bem como para evitar “confrontos” assertivos com os filhos. Curiosamente, menos frequentemente surgem soluções de deslocação a casa ou de consumo de refeições trazidas de casa.

Muito se perde com este estado de coisas. Além dos erros e dos maus hábitos de consumo alimentar que se vão instalando, troca-se a convivialidade no espaço escolar pela segregação dos jovens em espaços alternativos, em função do poder de compra das famílias. Por outro lado, aumentam paulatinamente os riscos de exposição das crianças e dos jovens a outros contactos sem supervisão ou vigilância no exterior dos espaços escolares. No meio de tudo isto, salvo algum alarido ocasional, ainda que fundamentado, temos uma completa ausência de reivindicação do incremento da qualidade e da diversidade, com o aumento da utilização do serviço e com medidas ativas de controlo das ofertas alternativas desreguladas, não saudáveis, mais onerosas e deseducativas.

Atualmente, os serviços de refeições escolares estão generalizadamente concessionados a empresas especializadas do setor da restauração. Essa é uma boa solução, considerando as exigências legais, os critérios de qualidade e segurança alimentar e as qualificações profissionais desejáveis para garantir serviços de fornecimento confecionadas às crianças e jovens à guarda das escolas.

Porém, a concorrência feroz entre as principais empresas do setor e a cegueira economicista dos adjudicantes levaram a um esmagamento contínuo de preços que não augura nada de bom para a qualidade do serviço. Aliás, compreendo cada vez pior que o Estado esteja a ganhar dinheiro com as refeições dos alunos nos refeitórios concessionados. Aos alunos que não beneficiam de comparticipação é cobrado o valor de 1,46€ por refeição. Na região norte, à empresa concessionária é pago o valor de 1,18€ por refeição (mais IVA, que regressa ao Estado como receita fiscal), menos 0,20€ do que no contrato anterior.

Um euro e dezoito cêntimos por refeição! Com estes valores, são muitos os receios de degradação contínua deste importante serviço e poucas as esperanças de incremento da sua qualidade, diversidade e agradabilidade para as crianças e jovens. Haverá alguém preocupado com isso?

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