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À boleia no camião do lixo

Entrevistas

2010-05-01 às 06h00

Patrícia Sousa Patrícia Sousa

Trabalham, enquanto dormimos, a limpar o lixo que fazemos. Todas as noites é assim. Motoristas e cantoneiros da AGERE encontram-se nos estaleiros da empresa para cumprir uma missão: manter o concelho limpo. Agostinho Lopes, João Paulo e Rui Duarte abriram-nos as portas do camião e seguimos viagem com os homens do lixo.

Citação

São 21.30 horas e ao estaleiro da Agere começam a chegar motoristas e cantoneiros. Homens fardados de amarelo fluorescente seguem até ao bar para tomar um café e “dar duas de treta”, como confidenciam. “A vida é mesmo assim. Esta é a nossa segunda casa”, atiram alguns, enquanto tomam o cafezinho. Afinal a noite vai ser longa e é preciso ânimo.

Aproximam-se as dez da noite. Os motoristas ligam os camiões e verificam se as máquinas estão em ordem. O motor dos camiões e as máquinas das traseiras que trituram o lixo fazem um barulho ensurdecedor. Está tudo pronto para arrancar. Em fila lá saem do estaleiro da empresa. Um ritual diário. Alguns metros à frente começam os camiões a dispersar. Cada equipa segue o trajecto já pré-definido.

Agostinho Lopes, Rui Duarte e João Paulo Oliveira abriram-nos as portas do camião. Entrámos e seguimos viagem com os homens do lixo pelas ruas de Dume.
Passam dez minutos das dez na noite, a equipa pára ao lado do Estádio Municipal de Braga. O camião está a fazer um barulho estranho e Agostinho, o motorista e responsável pela equipa, pede a Rui para confirmar o que se passa. “É a biseira do lixo”, explica Agostinho, enquanto mexe em alguns botões no computador de bordo. Problema resolvido, Agostinho lá admite, então, que o trabalho de equipa é fundamental para chegarem ao fim da noite com a missão cumprida.

“Muitas vezes funciona os três em um. Tento sempre cativar e ser um bom colega de trabalho. Aqui há espírito de grupo e se os chefes precisarem de nós, estamos sempre prontos para fazer aquele extra quando é preciso ir ajudar os colegas ou por causa de um furo, de um acidente ou uma outra coisa qualquer”, refere Agostinho.
A volta não tem hora de terminar. “Quando corre bem o trabalho acabamos mais cedo. Mas há dias que vamos ao horário ou até mais tarde, no caso de greves, de acidentes de percurso ou avarias”, salienta.

O motorista lá confidencia que trabalha na empresa desde 2004 e confessa que hoje não está arrependido. Era motorista noutra empresa, mas antes tinha sido carpinteiro durante 26 anos e meio. A empresa onde trabalhava entrou em crise e acabou por arranjar emprego na Agere. “No início foi um bocadinho confuso, porque vinha de um ritmo de trabalho diferente, aqui tem regras, normas e tem que se fazer o que está marcado. Além disso, ao conduzir tenho muita responsabilidade com o camião e os colegas”.

Nunca tinha trabalhado à noite, a não ser a vida de militar, por isso, os primeiros meses não foram fáceis. Mas com o tempo, Agostinho superou tudo. “A noite passo bem, habituei-me a isto e hoje se calhar já não trocava pelo dia. Não trocava, estou a falar concreto. Quem nos comanda é o sono e depois de nos habituar a um ritmo de vida, dificilmente mudamos. Faço isso normalmente e já tenho o hábito de dormir sempre uma hora antes de vir”.

Casado e com duas filhas, a família de Agostinho também já se habituou a este novo ritmo de vida e o motorista não gosta de falhar. “Estamos num mundo em que não há horários nos empregos. Gosto de chegar muito cedo ao trabalho. Sou pontual, precavido. Pode-me acontecer qualquer coisa imprevista e assim tenho tempo de comunicar aos meus superiores”.

Agere recolhe por dia 170 toneladas de lixo

Na cidade de Braga são recolhidos diariamente 160 a 170 toneladas de lixo. Um trabalho, segundo o administrador-executivo da Agere, Nuno Alpoim, “que tem pouca visibilidade, porque normalmente se faz em horário nocturno, mas que é de importância fundamental para todos”.
Contrariamente ao que acontece nas outras cidades europeias, no concelho de Braga há recolha seis vezes por semana, com excepção apenas na madrugada de sábado para domingo. “Nas cidades europeias o normal é fazer recolha dois ou três dias, daí dá para perceber a intensidade de trabalho que temos”.

Por isso, “a cidade aparece com um índice de limpeza elevado, no entanto, sem a colaboração dos utentes não é possível, porque não podemos ter uma varredura atrás de cada cidadão”.
O modelo de recolha de lixo também é inovador. “No passado, a cidade estava cheia de contentores de lixo. Há cidades que têm contentores externos, outras internos, onde cada prédio tem que ter um contentor. Da experiência que esta empresa tem, este sistema, se for um sistema respeitado, é o que causa menos impacto e menos problemas na cidade”.

E justificou: “os contentores externos não se usam hoje nas cidades, são focos de maus cheiros, de atracção de insectos, moscas e quando ficam cheios as pessoas colocam o lixo fora. Em relação ao contentor interno não é uma boa solução, porque ter um contentor enorme no hall de entrada do prédio também traz problemas. Com este sistema que trabalhamos, temos aquele impacto negativo dos sacos, mas por um breve período de tempo”. Por isso, Nuno Alpoim deixou o apelo “para que sejam respeitados os horários de modo a minorar os impactos negativos. Se houver respeito pelos horários e dias, efectivamente este é o sistema que causa menor impacto e que dá melhores resultados”.

No entanto, para aquele responsável, os comportamentos cívicos nesta área têm evoluído de forma significativa e vê-se a evolução. “Aqui é fundamental a acção formativa que se fazem a nível das escolas primárias e secundárias. É um trabalho extremamente importante de sensibilização, de tal maneira que verificamos que são os mais jovens que impõem comportamentos aos mais velhos”.

E Nuno Alpoim foi mais longe: “quero aqui prestar a minha homenagem a esse trabalho, que muitas vezes é mal apreciado, de sensibilização e educação que se faz a nível das nossas escolas e é por aí que é o caminho. Quanto maior é a educação e sensibilização menor é o esforço deste lado e mais limpa está a cidade, mais bonita e arranjada se apresenta a todos”.
Os mais jovens, através da sensibilização escolar, tiveram efectivamente, segundo o responsá- vel da empresa, “um papel dinamizador na alteração de comportamentos”.

Na cidade e na zona rural já há recolha selectiva “e o curioso é que há cada vez mais pedidos para instalar ecopontos”. E para responder a essa situação, a empresa já fez um protocolo com a Braval para a aquisição de mais cem ecopontos que vão ser distribuídos pelo concelho. “Já temos um nível de recolha selectiva extremamente importante”, assegurou.

Apesar de todo o trabalho, há ainda alguma repressão que é preciso fazer. Aqui actua a brigada de fiscalização. “Às vezes a acção repressiva contra comportamentos incorrectos, nomeadamente os de não desrespeitar os dias e os horários para a deposição dos sacos, não é uma tarefa muito grata”. Mas Nuno Alpoim esclarece: “há uma intenção pedagógica. Normalmente na primeira infracção há alguma tolerância e nas seguintes não há. Mas não é essa função repressiva que a nós nos interessa”.

Através do conteúdo dos sacos do lixo consegue-se saber, curiosamente, que “em zonas visivelmente mais desfavorecidas recolhe-se mais matéria orgânica o que significa que encontramos mais restos alimentares que noutras zonas da cidade aparentemente ocupadas por extractos sociais mais ricos, onde aqui temos menos restos alimentares, menos matéria orgânica mais embalagens, vidros e cartão”, referiu o responsável da empresa.

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