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Direitos Humanos: Tribunal Europeu não consegue responder ao número de queixas - juiz português

Nacional

2011-01-24 às 11h36

Lusa Lusa

O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) não tem meios humanos nem materiais para responder às queixas que lhe chegam, mais de “cem mil” das quais continuam pendentes, afirma o juiz português no TEDH, Ireneu Cabral Barreto.

Citação

O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) não tem meios humanos nem materiais para responder às queixas que lhe chegam, mais de “cem mil” das quais continuam pendentes, afirma o juiz português no TEDH, Ireneu Cabral Barreto.

Em entrevista à agência Lusa, o juiz Ireneu Cabral Barreto - cujo mandato termina em fevereiro e que espera um substituto, que poderá ser conhecido já esta terça-feira, na votação da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa - reconhece: “Temos uma grave dificuldade, estamos numa situação em que é impossível responder ao número de queixas.”

O magistrado realça que há “mais de cem mil queixas pendentes” no TEDH e que “todos os meses” essa pendência sobe. “Há queixas pendentes de cinco anos”, aos quais acresce “todo o tempo que a pessoa já esteve à espera de uma decisão a nível interno”, pormenoriza.

“Temos meios, humanos e materiais, que não são suficientes”, admite Ireneu Cabral Barreto, precisando que o tribunal conta com seiscentos funcionários mas que precisa de mais “umas 200 pessoas”.

O tribunal está a tentar “emagrecer o processo, reduzir ao mínimo de formalismos”, garante o juiz, defendendo que uma “reforma”, atualmente em debate no seio do TEDH, deveria passar pela criação de “um comité de triagem, de filtragem, que se ocupasse das queixas que não têm interesse, para que o tribunal se pudesse ocupar das queixas que têm verdadeiramente interesse”.

Por outro lado, sublinha, a solução do TEDH não está em Estrasburgo, cidade francesa onde se encontra o tribunal instituído em 1959 e que hoje serve 800 milhões de cidadãos europeus de 47 Estados. A solução, aponta o representante português no TEDH desde 1998, “reside nos países membros”, porque antes de se dirigir ao tribunal europeu o queixoso “tem de esgotar os meios internos”. Portanto, “o que é preciso é que haja em todos os países meios internos eficazes, acessíveis, previsíveis”, conclui.

Ao mesmo tempo, defende a utilidade do recurso de amparo, que existe nalguns países europeus, nomeadamente em Espanha, e que permite aos cidadãos dirigirem-se diretamente ao Tribunal Constitucional para se queixarem de violações de direitos humanos.

Nesta terça-feira, o Conselho da Europa volta a votar a lista portuguesa - o TEDH é composto por 47 juízes, cada um representando o respetivo país-membro - com três candidatos a substitutos de Ireneu Cabral Barreto.

A primeira candidatura - que incluía o professor Paulo Pinto de Albuquerque, o procurador-geral adjunto e representante português no Eurojust, João Silva Miguel, e a ex-diretora do Centro de Estudos Judiciários Anabela Rodrigues - foi rejeitada pelo Conselho da Europa, que alegou “falta de qualidade” dos últimos dois candidatos. Ainda assim, Portugal resolveu manter a mesma lista à segunda votação, mas Anabela Rodrigues optou por sair, sendo substituída pela professora Maria Eduarda Azevedo.


É preciso ensinar o Tribunal Europeu
à magistratura nacional

A Convenção Europeia dos Direitos Humanos, e o tribunal europeu que com ela foi instituído, não são muito conhecidos em Portugal, sendo necessário ensiná-los à magistratura nacional, defende o juiz Ireneu Cabral Barreto.

Representante de Portugal no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) desde 1998, o magistrado - cujo mandato termina em fevereiro e cujo substituto poderá ser escolhido esta terça-feira - considera que a Convenção “não é muito conhecida” em Portugal. É-o “do ponto de vista formal”, mas “há uma profunda diferença na interpretação dos conceitos”, precisa. A “jurisprudência profunda e vasta do tribunal sobre determinados valores” é desconhecida pela magistratura portuguesa, acrescenta.

É, por isso, “essencial” que se ensine a Convenção, “primeiro nas faculdades”, mas também nas escolas profissionais - como o Centro de Estudos Judiciários - e na formação dos advogados, sustenta. Não só o texto da Convenção, que “é pequenino” e “datado”, mas a jurisprudência do tribunal, que o tem “enriquecido” com “uma interpretação atualista”.

Simultaneamente, Portugal tem “das mais baixas” médias do TEDH, com cerca de “200 a 250 queixas por ano”, o que revela que os cidadãos desconhecem esta possibilidade, mas também que os advogados não a utilizam e que os juízes não a aplicam, avalia Ireneu Cabral Barreto.

“Há determinados tribunais que aplicam com propriedade a nossa jurisprudência, nomeadamente o Tribunal Constitucional”, assevera. Mas há casos em que há “uma profunda divergência” entre a jurisprudência do tribunal e a jurisprudência portuguesa, que é o “caso repetido e conhecido da liberdade de expressão”. Não é que haja muitas queixas respeitantes a esta matéria - “uma dúzia”, que resultou em nove condenações entre 1959, data da criação do TEDH, e 2009 -, mas em Portugal, “normalmente”, condena-se “excessos” que não o são.

Já os cidadãos europeus, em geral, “queixam-se muito”. O TEDH recebe “uma média anual de 55 mil queixas”, aponta o juiz, sublinhando, porém, que se “queixam muitas vezes não pelos bons motivos” - 90 por cento das queixas acabam por ser rejeitadas, porque “ou não respeitam os pressupostos formais” (para recorrer ao TEDH é preciso esgotar primeiro os recursos judiciais nacionais e as queixas têm de ser apresentadas no prazo de seis meses após a decisão interna definitiva) ou porque “chegam sem fundamento, sem conteúdo, por motivos irrisórios, sem qualquer interesse do ponto de visa da Convenção Europeia dos Direitos Humanos”.

A lentidão da justiça é a queixa dominante nas 187 decisões em que o TEDH considerou, no seu meio século de existência, que Portugal violou a Convenção, tendo resultado em 71 condenações.

Em todos os 47 Estados-partes, as decisões do TEDH “foram executadas com maior ou menor dificuldade”, sendo Portugal “um país exemplar”, resume o juiz, referindo que atualmente há “mais queixas, portanto, é natural que haja mais condenações” e que “a maior parte” das queixas resulta em condenação do Estado em causa. “Normalmente, os Estados não têm dificuldade em pagar” as indemnizações fixadas, “as dificuldades existem quando se pede ao Estado que modifique a sua prática”, realça.


Tribunal Europeu 'tem muita cautela'
com 'questões novas'

O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) tem demonstrado “muita cautela” quando colocado perante “questões novas”, mas tem tentado “responder à sociedade atual”, considera o juiz português Ireneu Cabral Barreto.

Casamento entre pessoas do mesmo sexo, adoção por casais homossexuais, fecundação in vitro, aborto - o TEDH já teve de se pronunciar, numa altura ou noutra, sobre estas “questões novas”. O tribunal “pode ter uma determinada visão das coisas, mas não a pode impor”, começa por frisar o magistrado português que representa Portugal no TEDH, cujo mandato termina em fevereiro e cujo substituto poderá ser escolhido na terça-feira, em sessão plenária da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa.

Escolhe o exemplo do casamento entre pessoas do mesmo sexo, admitido por cinco dos Estados-membros do Conselho da Europa. “O tribunal já disse que parece haver uma tendência nesse sentido, mas, por enquanto, não há um número de Estados suficiente que ‘autorizem’ o tribunal a dizer que o artigo 12.º da Convenção deve ser interpretado nesse sentido”, refere, realçando: “O tribunal não pode ser, ou não deve ser, o motor da sociedade europeia.”

Confirmando que há “algumas” queixas no TEDH relativas à orientação sexual, Ireneu Cabral Barreto recorda que o TEDH já mudou no que toca à adoção por homossexuais. “Tínhamos uma jurisprudência restritiva, que dizia que permitir ou não permitir a adoção por homossexuais pertencia à margem de apreciação dos Estados, mas há dois anos, numa decisão relativa à França, decidimos que não era mais possível sustentar a proibição da adoção com base na orientação sexual”, refere. Melhor explicado, o “simples facto de alguém ser homossexual não deve ser impedimento à adoção”.

O tribunal ainda não se pronunciou sobre a adoção por um casal de homossexuais, sendo esta jurisprudência apenas válida para um indivíduo homossexual solteiro que queira adotar. Já no que toca ao casamento: “Ainda não dissemos que proibir o casamento entre pessoas do mesmo sexo ofende a Convenção [Europeia dos Direitos Humanos], o que aceitámos é que a lei que o autoriza não a ofende.”

Juiz no TEDH há 12 anos, Ireneu Cabral Barreto diz que “o respeito pelos direitos humanos na Europa é feito de avanços e recuos” e realça que “há campos onde se progrediu imenso”, mas também “outros em que, infelizmente, por razões muitas vezes circunstanciais, se regrediu”. Referindo os “conflitos latentes” checheno, curdo, georgiano e russo, reconhece: “Temos casos graves na Europa, na nossa Europa, onde os direitos humanos sofrem e são violados de uma forma quase sistemática.”


Novo juiz português
do Tribunal Europeu
escolhido na terça-feira

Paulo Pinto de Albuquerque, Maria Eduarda Azevedo e João Manuel Miguel são os três portugueses candidatos a juiz do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH), mas apenas um deverá ser escolhido na terça-feira, num processo que já gerou polémica.

O ministro da Justiça, Alberto Martins, aceitou a lista de candidatos designada pela comissão independente para o procedimento de seleção dos candidatos a juiz português do TEDH.

A comissão independente, nomeada pelo ministro da Justiça, foi composta por quatro membros, designados pelo Conselho Superior da Magistratura, Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, Procuradoria-Geral da República e Ordem dos Advogados.

Esta comissão foi encarregada da verificação da admissibilidade das candidaturas, com base no método da avaliação curricular, e desempenhou o papel de órgão consultivo na decisão quanto à escolha dos três candidatos a apresentar ao Conselho da Europa, segundo o Ministério da Justiça.

O mandato do atual juiz português no TEDH, Ireneu Cabral Barreto, termina em fevereiro próximo, por limite de idade.

O próximo juiz português será eleito na terça-feira pela Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, com base na lista de três candidatos apresentados por Portugal.

O Conselho da Europa rejeitou em outubro passado a primeira lista apresentada por Portugal, que integrava já o procurador-geral adjunto João Manuel da Silva Miguel e o professor e jurista Paulo Pinto de Albuquerque, assim como a professora Anabela Rodrigues, que, perante a situação, manifestou indisponibilidade para uma recandidatura.

O júri e o Ministério da Justiça decidiram na altura manter os três elementos para o TEDH, mas dada a indisponibilidade de Anabela Rodrigues para uma recandidatura a escolha recaiu depois em Maria Eduarda Azevedo, jurista e ex-deputada do PSD à Assembleia da República.

Na altura, Alberto Martins considerou incompreensível a “natureza da deliberação da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa” ao recusar a lista apresentada por Portugal, realçando estarem em causa “pessoas de alta qualidade técnica, científica e cívica'.

“É uma posição que não prestigia o Conselho da Europa”, disse ainda Alberto Martins.

*** Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico ***

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