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A Flor do Paraíso

Premiando o mérito nas Escolas Carlos Amarante

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Conta o Leitor

2022-07-21 às 06h00

Escritor Escritor

Texto Suelita Nogueira Almeida

Ana era uma jovem com o estranho hábito de passear por lugares nada convencionais. Seria mais uma versão da lenda ‘Flor do cemitério’? Nesta, porém, tem mais amor e menos terror. Diz-se que ela era fascinada pela arquitetura, o paisagismo e a arte dos túmulos. As pessoas não veem a beleza oculta naquele lugar, porque só o visitam em momentos de dor e saudade. Para muitos ali é a última morada, para ela é só o começo de uma nova jornada.
Inicia sua visita a caminhar devagar e em silêncio, em respeito aos que descansam em paz. Observa as fotos para saber como era o rosto de quem está ali. Fica a admirar as flores e por fim, lê os epitáfios consagrados pelos herdeiros dos defuntos. Uma forma curiosa de saber o quão amado era o finado.
Adiante, avistou um túmulo branco. Sobre ele havia uma linda flor, que se assemelhava a um pássaro exótico. Suas pétalas eram alaranjadas e azuis. Na lousa tumular, havia a foto de uma jovem e logo abaixo estava grafado: “Ângela da Luz. Amor eterno”. Mesmo tendo ficado emocionada com o que leu, não resistiu a tentação, apanhou a flor e deixou aquele local sem olhar para trás.
Caminhou até à paragem, apanhou o autocarro e foi ao centro comercial, onde comprou alguns produtos. Ficou por ali até ao entardecer. Depois saiu, entrou em um táxi e retornou a casa. Ao chegar, tomou banho e logo adormeceu. Ouviu um choro baixinho, tão perto de seu ouvido, que ela chegou a sentir a presença de alguém. Acordou assustada, acendeu a luz e não viu ninguém. Reclinou-se na cama, segurou o lençol próximo do rosto e dormiu. De repente, o lençol estava sendo puxado, lentamente e tocava sua pele. Sentiu um calafrio de medo. Olhou para baixo e aos pés da cama estava uma mulher a chorar, com a mão estendida, sussurrava: “devolva-me a flor”. Ana deu um grito de medo e saltou da cama. Perdeu o sono. Aquele rosto era familiar e fez com que ela lembrasse da flor que retirou do jazigo. Apavorada, Ana revistou toda a casa em busca da flor, mas não a encontrou.
Amanheceu e ela não conseguiu lembrar-se onde poderia tê-la deixado. Procurou por todos os sítios onde havia estado, sem sucesso. Teve a ideia de comprar outra flor e devolvê-la com um pedido de perdão, uma oração e a promessa de jamais retirar qualquer coisa daquele lugar. Sentiu-se aliviada.
Na noite seguinte, chegou a casa, deitou-se no sofá, ligou a televisão e adormeceu. De repente, ouviu um choro melancólico. Pressentiu que não estava sozinha. Uma mão fria segurou seu braço. Ela abriu os olhos e deparou-se com uma jovem que falou com voz chorosa: “eu quero a minha flor”. Aterrorizada ela deu um salto do sofá. O medo era tanto, que sua respiração quase parou. Ela abriu a janela e já era dia. Respirou fundo. Não entendia por que a mulher continuava a perturbar seu sono, se já havia devolvido a flor.
Decidiu desvendar esse mistério. Foi até ao cemitério e pela primeira vez não estava ali para visitar, e sim para investigar. Aproximou-se do túmulo e perguntou a um funcionário local se ele conhecia aquela miúda e ele respondeu que não. Mas que, semanalmente, o túmulo era visitado por um Senhor, que trajava o uniforme dos Correios. Porém, fazia muito tempo que ele não aparecia por ali. Ela agradeceu.
Com seu telemóvel tirou uma foto dos dados pertinentes e foi direto para a loja dos correios mais próxima. Inquiriu a servidora mais antiga, que lhe respondeu: “Esta é Ângela, o único amor do Sr. Pedro Santos. Eles eram apaixonados. Ela faleceu dias antes de se casarem e ele ficou só. Trabalhou aqui até sua reforma. Hoje, está internado em um lar para idosos.” Ela agradeceu e foi até a casa de repouso. Perguntou pelo Sr. Pedro, a rececionista apontou para um idoso que estava em uma cadeira de rodas. Ana aproximou-se, mostrou-lhe a foto e perguntou se a reconhecia. Com os olhos lacrimejados ele respondeu: “Esta é o amor da minha vida, que partiu para o paraíso e está a esperar por mim”. E começou a chorar. Para acalmá-lo ela contou-lhe toda a história da flor e dos sonhos e perguntou-lhe se poderia ajudá-la, pois estava arrependida.
Emocionado ele falou: “A primeira vez que a vi, ela segurava uma flor colorida, que se assemelhava a uma ave pousada. Para ela, parecia uma ave a olhar para o alto, cujo nome era flor do paraíso. Símbolo do amor, da consideração e da liberdade, por isso era a sua favorita. Desde então, em todas as ocasiões especiais eu a presenteava com essa flor. Mesmo depois que ela partiu, continuei a presenteá-la”.
Ana achou a história comovente. E ele continuou: “Se queres ajuda, saiba que tenho de beijar a flor antes de devolvê-la. Esse era nosso ritual. Ela saberá que é um presente meu”. Ela devolveu a flor devidamente beijada e a jovem nunca mais apareceu em seus sonhos.
O Sr. Pedro faleceu e descansa ao lado de sua Ângela. Ana ainda os visita. Sobre o túmulo deles é possível ver duas flores unidas, em forma de pássaros pousados.
Ela jura que são dois pássaros a olhar para o céu, em busca do paraíso.

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