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Braga, sexta-feira

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A História é difícil e não é “sexy”?

Maravilhas Humanas

A História é difícil e não é “sexy”?

Ensino

2025-03-26 às 06h00

Gonçalo Maia Marques Gonçalo Maia Marques

In Memoriam Eduardo Lourenço (1923-2020). Filósofo

Infelizmente, nos últimos anos e décadas, eivados, quantas vezes de boas intenções e com seguras esperanças em construir um mundo melhor para todos, consideramos que era importante eliminar “dificuldades” nos percursos escolares dos nossos alunos. Tal conduziria a um necessário nivelamento que procurava reduzir “desigualdades estruturais” da sociedade portuguesa - em grande medida justificados pelo quase meio século de ditadura e pelo analfabetismo secular.
A Matemática é difícil? Introduza-se a calculadora científica (e antes disso a mais básica) para auxiliar os alunos nos cálculos e nas operações mais complexas.
O Português é difícil? Pois introduza-se nos livros cada vez mais ilustrações que os alunos vão gostar muito e assim, claro, não se “assustam” com os “calhamaços” e volumes “imponentes” porque “têm muitas letras” e cansam… Assim se abandonam os clássicos em prol de uma literatura mais “ligeira”.
As ciências são difíceis? Já não será então necessário saber nomes latinos que classificam animais e plantas… mas que grande chatice que é… e afinal que utilidade possível poderia ter? “Para que é que é preciso saber”?
E então o que dizer da História? Para quê “traumatizar” as crianças com a aprendizagem de algo “distante e aborrecido”? Coitadas! Isso já nada lhes diz. As pessoas já morreram quase todas e a realidade é hoje tão diferente e distante… haverá mesmo necessidade de “saber” isso?
Pois. Claro que há!
Esta forma de pensar conduziu-nos a construir crianças que cresceram em ambientes demasiado auto-regulados, previsíveis, em que os caminhos e as soluções eram (são), à partida, mais seguros e (porque não dizê-lo?) fáceis de alcançar? Claro que se aparecer um obstáculo/dificuldade surge a frustração e, necessaria- mente, a imaturidade.
Tudo se reduziu ao prático, ao útil, ao imediato. Claro que nesta equação a História estaria - logo à partida - condenada no “tribunal da moda”. Racionar historicamente com rigor e exigência exige concentração, estudo e, sobretudo, vontade, porque muitos sinais e evidências do passado não são percepcionadas senão com indução, análise de textos e raciocínio lógico, mas em que a dedução seja feita com base nas fontes, claro.
Nas minhas crónicas anteriores falo também no “caldo curricular perfeito”, numa “tempestade”, no fundo, que também possibilitou que o conhecimento histórico fosse considerado “dispensável”.
E repare-se que considero que avançamos muito em termos de metodologias pedagógicas, de estratégias didáticas e de uma valorização crescente dos processos de ensino e aprendizagem. Mas não chega! É preciso conhecer, é preciso ler, em primeira mão e não pelos resumos de outros, pelas citações de outros ou pela mão da inteligência artificial (que nos leva onde o perguntador quiser e, pior, se satisfizer…).
Um povo sem memória, um povo sem História é, sabemos todos, um povo condenado. Já o escrevia, há muitos séculos, Edmund Burke. Portugal tem milénios de História para conhecer e para contar - e é humanamente natural querer contá-la: porque essa é a única forma de perpetuarmos a espécie e de sobrevivermos à morte, que nos está destinada. Não tenhamos sobre este aspeto a menor dúvida!
Ao contrário de países de fundação mais recente e que, também por isso, investiram menos no conhecimento sobre si próprios (com os resultados que estamos a ver), Portugal vive no “labirinto da saudade” sobre o seu passado - como muito bem lhe chamou Eduardo Lourenço, que hoje evocamos.
Se os filhos não contarem aos pais o que viveram e sentiram - e deixarem essa função apenas aos avós, porque têm mais tempo, disponibilidade e vontade (além de menos tempo estatístico) - transmitindo valores, princípios e “normas invisíveis”, não esperemos que seja (só!) na Escola que as crianças o façam. E é preciso louvar o que a Escola faz - muitas vezes com muito poucos recursos e à custa da abnegação de muitos. De (quase) todos.
A Educação Parental de Valores não está a funcionar na sua plenitude. E instituições sociais envolventes não a podem substituir! Podem, apenas, complementar.
É nossa convicção que uma anedota, uma curiosidade, uma vivência curiosa, podem bem ser o início de um novo caminho de revalorização do nosso Passado. Porque ele é sempre motivo de aprendizagem: no que de bom e menos bom teve!
Estudemos, conheçamos, tenhamos a ambição de perceber o que se passa à nossa volta para, dessa forma, edificarmos um amanhã mais esperançoso.
Continuaremos e aprofundaremos esta reflexão.?

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