Automatocracia
Ideias
2015-04-05 às 06h00
Poucos dias atrás, revoltava-se a porta-voz do Bloco de Esquerda contra a sugestão de pública lista de pedófilos. Não é que o BE precise de se desfazer em argumentos para se opor a qualquer medida governamental - deste executivo em particular, ou outro qualquer. Mas, no caso em apreço, a iniciativa da Ministra da Justiça seria não só abjectamente reaccionária, - meu juízo -, como inteiramente contrária à constituição.
Brandindo o trunfo legalista, pode o BE dispensar-se de carregar tintas na adjectivação. A Lei fundamental salvaguarda a individualidade, a intimidade, as estranhezas minoritárias, relevem ou não de deturpações gravosas da sexualidade. Estritamente dentro das margens da Lei, dirá o BE que a pedofilia é um crime devidamente tipificado, regularmente julgado, com penas atribuídas e cumpridas, findo o que, no melhor interesse social, se presume a regeneração plena do criminoso. Dirá o BE que, preso a uma lista infame, carregará o prevaricador o seu crime para todo o sempre, inviabilizando o seu renascimento liberto de tamanha iniquidade. Dirá o BE que a lista visa a prevenção de crimes que possam jamais vir a acontecer, mas, ainda assim, tornando impossível a vida normal de alguém certa vez condenado.
Não é difícil concordar com o BE. Sou sensível a princípios abstractos e a direitos absolutos, mas, para maior conforto da minha alma de cidadão, gostaria de ouvir o BE a advogar o direito inalienável e absoluto à singularidade disfuncional e perversa, gostaria de ver o BE pronunciar-se pela supremacia dos direitos do potencial agressor sobre os direitos das vítimas que algum dia se descobrirão nessa condição.
Talvez oscilemos entre a realidade e a ficção. No terreno da fábula cinematográfica de 2002 - Relatório Minoritário - deparamo-nos com a punição severa de crimes por cometer. Ainda antes de perpetrados os propósitos criminais, os desviantes são percebidos pelo trio superiormente consciente em que assenta a sociedade, sendo perseguidos e silenciados. Do mitema da perfeição descaímos automaticamente para o horror fascista maior. No plano da realidade, porém, - por muito que me custe pronunciá-lo, em virtude dos dramas vividos -, melhor exemplo não teríamos nos dias correntes que o da escola primária de Villefontaine, pequena comuna do departamento de Isère. Um senhor professor, de quem se esperaria toda a respeitabilidade, tanto que com as funções de director, abusou repetidamente de alunos, meninos e meninas entre os 6 e os 7 anos. Tem às costas 9 participações e mais 14 em caminho, e isto num ano lectivo por terminar.
Cumpra ele a pena que lhe estipulem, e em escolas públicas jamais sujeitará seja que criança for aos seus delírios eróticos, isto porque muito confortavelmente foi objecto de exoneração.
Só que o senhor Romain Farina - tal é seu nome - trazia historial pedófilo de 2008. Certo que por frequência de sites pedopornográficos, o que é totalmente diferente. Bom, mas foi julgado. Pena leve - 6 meses remíveis a multa. Até houve um perito forense que atestou que não seria o réu alguém de “perigosidade particular”. O senhor até reconhecia as faltas e delas muito se penitenciava. O senhor iria fazer terapia. E pronto, deu no que nós já sabemos.
E, com lista ou sem lista, o senhor que já era professor à altura dos factos, não tomou de per si a decisão de pôr um continente entre si e o alvo das suas fantasias eróticas, nem o tribunal lho exigiu, nem a dita terapia que realizou lhe proporcionou uma tomada de consciência que favorecesse a sua auto-regulação. Convenhamos no seguinte: ninguém escapa à sua sexualidade, regular ela seja ou pejada de complexos arabescos.
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