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A nossa ‘fauna’ política

Automatocracia

A nossa ‘fauna’ política

Ideias

2020-03-07 às 06h00

Borges de Pinho Borges de Pinho

Há anos que vimos seguindo o filme que se tem vindo a desenrolar desde 1974, anotando alguns dos episódios ridículos, críticos e picarescos que vêm sendo ‘rodados’ e sublinhando muitas das mais curiosas cenas registadas. Com muitos figurantes e diversos actores e actrizes, anote-se, sendo que muitos deles já se foram e se perderam nos caminhos da vida enquanto outros se alcandoraram a lugares e funções proeminentes no mundo da política, usando suas artes, efeitos, benesses e golpes para subir na vida e ascender ao poder. Umas vezes até, diga-se, mudando de ‘cor’ e de partido, o que se compreende dado que na democracia em que todos enchem a boca, e muitos os ‘bolsos’, o que sobretudo sobressai é o papel e a importância dos partidos, já que se está perante uma ‘partidocracia’. E daí haver quem diga, e com razão, que não importa tanto trabalhar, ser alguém, ser uma pessoa séria e de bem, saber comportar-se, respeitar, estudar, tirar um curso e ser um bom profissional para se subir socialmente e ser feliz. Aliás, dizem, o melhor que um pai tem a fazer por um filho é filiar logo o miúdo num partido, ‘recomendá-lo’ ao ‘leader’ local , ensiná-lo a ‘pichar’ paredes, a ‘colar’ cartazes, a levar ‘bandeiras’, camisetes e bonés, a ir a comícios, a acompanhar os ‘maiorais’ locais e distritais, a aparecer e a subir aos palcos para mudar uma cadeira, compor um cartaz, puxar o pano à boca de cena, e... bater palmas, fazer barulho e ‘vomitar’ slogans. O resto... e o futuro... virá por acréscimo, tal como uma boa escolha do ‘chefe’, ter suas ‘simpatia’, ‘apoio’ e subir nas ‘estruturas’.

Sendo óbvio que as memórias dos tempos e dos anos nos poderiam levar a apontar nomes e casos concretos, a realidade aconselha-nos a fazer vingar a prudência de evocar e dizer tão só que os ‘conselhos’ e ‘orientações’ paternas têm levado muitos dos actuais ‘poderosos’ e ‘manda-chuvas’ da ‘fauna’ política portuguesa a lugares e cargos muito importantes e de prestígio no país e no mundo, ainda que não tenham conseguido de todo ‘despir’ e ‘pôr de lado’ os cueiros malcheirosos da meninice que lhes conhecemos e a que nos habituaram, nem perder o feio hábito de ‘tirar macacos’ do nariz, de que muito abusavam. Hoje e agora, é certo, mostram-se mais limpos, mais bem vestidos, mais apresentáveis e importantes, aliás como figuras bem falantes e muito faladas, bem da vida, com bons carros e bons cargos, muito dinheiro, recebendo chapeladas e mesuras, sorrisos, beijos e abraços, e “gozando” a vida entre os media que os veneram, os seguidores que os bajulam, e os poderes de que dispõem em Portugal, na Europa, nos USA e no mundo.

Mas são tão só aqueles homens e mulheres, os ‘Zés e Marias’ de ontem, em quem se apostou através dos partidos para marcar presença nos vários palcos do poder e da vida económico-política internacional, na ONU, CEE, Bruxelas, Frankfurt, Estrasburgo, etc, e que se vêm pavoneando entre reuniões, alguns deles dispersando-se por várias capitais e países, alguns outros desdobrando-se em visitas e viagens de cortesia e negócios, e muitos ainda ‘alavancando’ em representação as funções e os cargos que o poder político lhes atribuiu. Mas se na verdade são imensos os figurantes e os actores neste ‘jogo’ e no ‘negócio/partidário/político’ de cariz democrático(?) que domina, enforma e compõe a actual ‘fauna’ política nacional, impõe-se-nos de todo admitir e reconhecer que muitas das suas ‘virtudes’, ‘coragem’, ‘qualidades’ e ‘valias’, agora ‘descobertas’ nas suas caminhadas de vida e vivências, se ficaram a dever tão só a um ‘bambúrrio do acaso’, a fortuita ‘sorte’ ou simplesmente ao episódico facto de estarem no lugar e momento certos para acolher um ‘feliz empurrão’. E daí terem chegado a primeiros ministros, presidentes da república, deputados, autarcas, eurodeputados, embaixadores, ministros, administradores na banca, comissários e a altos cargos na ONU e CEE, etc, muitos Manuel, José, João, António, Maria, Rosa, Paula e outros, aliás todos umas abstractas e desconhecidas figuras que naturalmente assim continuariam pela vida fora se não tivessem tido a oportunidade de seguir os ‘conselhos’ paternos e os ensinamentos adquiridos no colar cartazes, pichar paredes, soltar slogans, agitar bandei- ras, frequentar comícios, e escolher ‘bem’ e a ‘hora’ de ingressar nas Jotas e o momento ‘ético’(?!) da filiação partidária.

E falamos em ‘ética’, evidentemente no seu sentido mais pejorativo e picaresco de acoplagem à política e sua ‘fauna’, porquanto é de todo incontornável e impossível esquecer e ultrapassar os mil e um casos de trafulhices, bandalheiras, compadrios, jeitos e macacadas em que tal ‘fauna’ se vem metendo e envolvendo quando está na administração dos dinheiros públicos e no exercício do poder. Aliás, como é também de todo inquestionável ter aumentado a criminalidade de origem, natureza e pendor político, desenrolando-se em corrupção, peculato, dolosos aproveitamentos, burlas e falcatruas, como nos revelam os mil e um processos da esfera criminal que têm vindo a acontecer ao longo dos anos, com particular destaque aquando da mudança de cor partidária na administração local. São queixas e mais queixas, a que há a acrescentar as insinuações, os rumores, os inquéritos e as ‘habilidades’, com os tribunais a serem invadidos por processos de cariz político, onde é insuportável o ‘cheiro’ a compadrios, a amizades, a parentescos, a pagamento de promessas e favores e é possível constatar e ver o carácter das pessoas a perder-se no ‘enxurro’ de uma generalizada falta de ética e de uma gorda imoralidade, anexadas a uma alargada perda de respeito por princípios e valores, como a honra, a dignidade, a verdade, a honestidade e a seriedade.

Dir-se-á que tudo isto não será tanto devido à política nem aos seus jogos, mas tão só uma consequência natural do exercício da democracia e do uso da liberdade e seus direitos, mas impõe-se-nos concluir que subjaz a todo este clima e infeliz realidade toda uma falência dos valores humanos morais e tradicionais de um povo, que perdeu o respeito por si próprio e pelos outros. Um povo que se deixou dominar e guiar por um feroz egoísmo e uma tola vaidade e não se importa de atropelar realidades, violar a verdade, pisar a honestidade e maltratar a seriedade nos seus comportamentos diários e na sua vida profissional e concreta. Aliás tão só se quer subir socialmente, ter mais dinheiro, obter bons negócios e ‘trepar’ na vida de qualquer maneira, mesmo com ‘jogos’ de ganância pura e egocêntricos e a dizer ‘barbaridades’. Uns ‘Zés Marias’ medíocres que no poder falam nas possíveis vantagens comerciais do coronavírus, comentam a ‘estupidez’ das aves na questão de ultrapassagem ao impacto ambiental, falam em vacas a voar e nas mil e uma maravilhas (?) do país e sua situação, embora, admita-se, haja que ter mais confiança após a viagem de Marcelo à India.

Atendendo à genética de Costa e sua costela oriental, aliás de paciência como o próprio referiu, não será de se pôr de lado uma “possível parceria luso-indiana na produção de aviões” (JN, 15.2.20), e termos finalmente as ‘vacas a voar’.

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