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A TV dos Jornalistas

A Cruz (qual calvário) das Convertidas

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Ideias

2011-11-06 às 06h00

Felisbela Lopes Felisbela Lopes

Edito, esta semana, um e-book a que dei o título “A TV dos Jornalistas”. Trata-se de uma obra assinada por mim e que conta com a colaboração de outros académicos que estudam a televisão. Durante um ano, analisámos a informação de seis canais portugueses: três generalistas (RTP1, SIC e TVI) e três temáticos (SICN, RTPN e TVI 24). Não é eufórico o retrato traçado, mas isso não subtrai a importância da informação televisiva. Pelo contrário. Porque é um eixo estruturante do campo mediático, merece toda a atenção.
 
A TV mudou bastante nos últimos anos. Nem sempre no sentido de se dotar de mais qualidade. O fenómeno não é apenas português. A televisão é cada vez mais sinónimo de espectáculo, mesmo quando se fala em programação informativa. Muitos anunciam já uma “nova era da informação televisiva” ou um “novo ecossistema informativo”. Já não se valorizam os valores-notícia tradicionais que se conjugavam no sentido de ajudar os jornalistas a construir uma imagem fidedigna do mundo. Agora, esses “new values” declinam-se mais com traços do “dramático, divertido, espectacular”, considerados mais propensos para atrair facilmente audiências. Neste contexto, são necessários novos actores: hoje a TV não precisa apenas de apresentadores credíveis, necessita de pivots com acumulado capital de notoriedade mediática; hoje a TV não valoriza somente convidados que saibam do que falam, construindo discursos racionais alicerçados em argumentos bem fundamentados, carece de interlocutores conhecidos do grande público, que conversem ao ritmo (veloz) do audiovisual, fazendo uso da maior expressividade possível. Nesta TV das celebridades, a que actualmente temos, cabem poucas pessoas. Em Portugal o bilhete de entrada nos plateaux informativos é prioritariamente dado aos jornalistas e aos políticos, notando-se, nos últimos tempos, um crescente domínio dos primeiros. São eles que controlam os alinhamentos. São eles que dominam a opinião em estúdio.
 
No livro que será publicado esta semana, analisámos a informação televisiva de seis canais portugueses entre Setembro de 2010 e Junho de 2011. Um ano televisivo, se excluirmos aqui o período de veraneio, que, como sabemos, configura um tempo atípico de consumo televisivo. A base do nosso trabalho assenta nos programas de informação emitidos entre as 18h00 e a 01h00, de segunda a sexta-feira, um estudo que implicou a análise de 1673 emissões e, consequentemente, de 2158 convidados em estúdio.
 
Não retiramos deste estudo conclusões optimistas. Hoje a TV portuguesa é dominada por um grupo muito restrito de convidados. Uma elite, poder-se-ia considerar. Preferimos falar de uma confraria que circula essencialmente pela capital. São poucos aqueles que entram nos estúdios de informação e repetem-se muitíssimo no pequeno ecrã. Esta tendência de chamar sempre os mesmos fortalece naturalmente um “star system” que é resultante de uma sobreexposição nos palcos televisivos, mas também resulta numa evidente saturação do público, que vê sempre as mesmas personalidades, cujo discurso se adivinha com facilidade.
 
Esta TV informativa que temos precisa de ser mais do que o país e o mundo em cena. Precisa de anunciar, mas também explicar o que se passa. Precisa de montar palcos com interlocutores diversificados que acrescentem valor àquilo que é debatido nos estúdios de informação. Precisa de instalar portas de entrada abertas à participação de todos aqueles que podem integrar de forma significativa o processo de produção de noticiabilidade. A TV que temos (ainda) não é isto. É uma televisão pouco diversificada na informação que promove, elitista nos plateaux que cria e ainda muito longe de ser uma TV dos espectadores…É preciso, pois, inverter um caminho que, a continuar assim, acabará por nos fazer despenhar num espaço público apático, monocórdico, anestesiante… Para os tempos que correm, eis tudo o que não precisamos.

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