A culpa
Ideias
2012-04-26 às 06h00
Ontem, 25 de Abril, uma vez mais cada português teve a oportunidade de (não)festejar esse dia como mais lhe agradou, facto que guarda em si a marca distintiva de um regime democrático alicerçado no respeito pelas liberdades individuais.
Os órgãos políticos procuraram alegrar, talvez pela primeira vez desde a revolução, um ritual cerimonioso acinzentado que há muito vem empalidecendo o vermelho circunscrito ao ‘porque sim’ das lapelas. Reconheço que a cerimónia ocorrida na Assembleia da República, teve uma especial beleza emotiva e compreendo que haja quem a considere uma das cerimónias mais bonitas de sempre.
Não deixa porém de ser no mínimo curioso que as instituições políticas se tenham empenhado em dar mais coração às cerimónias de Abril, num momento em que mais se têm empenhado na destruição da nossa cidadania social, constitucionalmente consagrada, contando para tal apenas com escassa resistência por parte de algumas forças partidárias e de alguns nomes maiores da política nacional.
Com bolos se enganam os tolos. Com senhas e sonhos de Abril cantados à capela, o nosso sistema de governação procurou ontem apaziguar-nos pela emoção e pelo afecto. Mas não chega. Não chega porque ao acordar, hoje, sabemos que o que tem sido despudoradamente feito não está desfeito. Que o que tem sido retirado aos cidadãos nos últimos meses e o que continuará a ser-lhes retirado nas próximas gerações, não lhes será restituído.
Hoje, a destruição do património de Abril é-nos apresentada como uma inevitabilidade - palavra academicamente mais elegante e menos lacrimosa para traduzir o Fado que teima em nos amesquinhar a vida. É nosso destino, assim parece de facto, termos de viver com a mediocridade doutíssima.
Mas também não pensemos que se recorda melhor Abril, com amuos, e mais, como se quem amua nunca tivesse tido uma palavra a dizer no processo de construção de um Abril que sempre foi incompleto e múltiplo de sentidos e de caminhos possíveis.
Ontem, por isso, alheia a estas danças de véus e de interpretações sobranceiras de uns sobre outros, a autenticidade de Abril andou mais por outras bandas, por entre as iniciativas nascidas da vontade da sociedade civil, dos cidadãos anónimos. Expressões mais ou menos espontâneas, mais ou menos eruditas, na forma de poemas soltos, de cantares, de encenações, de pinturas, em palcos e nas ruas, todos eles convergentes numa só linguagem pela qual se ensina hoje o sentido mais profundo de Abril: possibilidade, vontade, escolha. É por aí, por entre a cidade concreta dos indivíduos que trabalham e que resistem, que Abril correrá sempre, em bando.
19 Janeiro 2021
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