Os amigos de Mariana (1ª parte)
Ideias
2015-04-03 às 06h00
O BusinessDictionary.com define “burocratização” como “tendência para gerir uma organização adicionando sempre mais controlos, procedimentos formais rígidos e atenção a um número crescente de detalhes”. Nenhuma entidade pública ou privada lhe consegue hoje escapar.
Trata-se de um fenómeno característico das sociedades modernas, que não deixou de afetar as universidades, minando nelas a cultura de livre inquirição e pensamento necessária para se chegar à descoberta científica, à inovação tecnológica e à criação artística-literária-filosófica.
E até nas escolas de Letras e Humanidades, das quais mais se esperaria que lhe oferecessem oposição ou resistência, dado o seu enraizamento numa longa tradição de reflexão e ação críticas, ela tem vindo a ser acolhida com aparente gosto por aqueles que circunstancialmente as dirigem, inebriados no desempenho do papel de gestores sem tirocínio.
Eis dois exemplos, dentre tantos, colhidos no quotidiano da instituição de ensino superior em que trabalho. Fazer sumários das aulas. Antes, bastava uma folha de papel, uma caneta para registá-los e um dossiê para proceder ao seu arquivamento. Agora, para inseri-los numa plataforma eletrónica chamada Blackboard é preciso repetir, para cada um deles, séries de 15 cliques com o rato, para além da redação do próprio sumário, claro.
Os custos de armazenamento não consigo calculá-los, mas serão certamente superiores aos do velho sistema. Um responsável pela manutenção desse sistema informático de gestão de cursos académicos sugeriu-me, com toda a seriedade, que expusesse formalmente o caso para poder encetar o estudo de um modo de chegar a apenas 13 cliques por sumário.
Planear a distribuição de serviço docente do ano letivo. Antes, uma simples tabela criada em Word ou em Excel era suficiente para rascunhar as disciplinas atribuíveis a cada docente, respetivo semestre de aulas e número de horas semanal e total. Agora, depois de um gabinete de apoio técnico se ter ocupado durante meses da conceção de raiz de um programa informático para esse mesmo propósito, o monstro recém-nascido está a ser alimentado por uma legião de diretores de curso e de departamento, e seus adjuntos, e auxiliares de secretaria, a quem foram ministradas sessões de formação, distribuídos guiões com dezenas de páginas e vídeos explicativos de como engordá-lo com dados e dados.
E, mais perturbador, todo este trabalho irá ser duplicado dentro em breve, pelos mesmíssimos, no programa informático oficialmente adotado para o efeito - cujos guardiões fazem parte de um eufemisticamente denominado gabinete de apoio ao ensino - por sinal, usando um palavrão da moda, não interoperável com o primeiro.
Este par de exemplos mostra essencialmente duas coisas. Por um lado, que nas universidades, os cargos de chefia parecem estar a cumprir com redobrado zelo a primeira das “sete regras da burocracia” inventariadas pelos académicos estadunidenses Lloyd Pettegrew e Carol Vance: apregoar todo o seu empenho na resolução dos problemas existentes e ao mesmo tempo agudizá-los, porquanto - disso bem parecem estar cientes - eles são a base do seu poder.
Por outro lado, que muitos professores universitários, cada vez mais distanciados da prática do ensino e da investigação, para a qual estão vocacionados e preparados, progressivamente se têm vindo a assemelhar aos mangas-de-alpaca de outra era, agora colocados ao serviço de secretarias de escolas e gabinetes disto e daquilo.
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