Correio do Minho

Braga, quarta-feira

- +

'Adolescência' é um murro no estômago

26.ª Conferência Mundial na área da sobredotação, em Braga!

'Adolescência' é um murro no estômago

Ideias

2025-03-24 às 06h00

Carlos Pires Carlos Pires

A série “Adolescência”, recentemente lançada pela Netflix, surge como um retrato sensível e realista dos desafios que os jovens enfrentam no mundo contemporâneo. Com uma abordagem autêntica e sem filtros, a produção mergulha nas complexidades emocionais, sociais e digitais que moldam a juventude de hoje.
A adolescência sempre foi uma fase de descobertas, crises e construção da identidade. No entanto, o século XXI trouxe novos desafios, amplificados pelo impacto das redes sociais, das expectativas irreais e da constante exposição mediática. A série capta precisamente esse contraste entre o desejo de aceitação e a luta pela individualidade, explorando temas como saúde mental, bullying, sexualidade e a pressão pelo sucesso.

Um dos aspetos mais marcantes da produção é a forma como representa a influência das redes sociais na vida dos jovens. Se, por um lado, as plataformas digitais proporcionam uma sensação de conexão e pertencimento, por outro, geram ansiedade e insegurança, com a cultura da comparação e a busca incessante por validação. Os protagonistas enfrentam dilemas modernos, desde a construção da autoimagem à privacidade num mundo onde tudo é partilhado. Os jovens encontram-se num turbilhão emocional que muitas vezes os adultos não compreendem. A série mergulha de cabeça nestes temas, expondo ansiedades, medos e inseguranças que definem a juventude atual
Outro tema central é a saúde mental, um tópico que, felizmente, tem vindo a ganhar mais espaço na sociedade, mas que ainda enfrenta estigmas. “Adolescência” expõe a realidade de muitos jovens que lidam com depressão, ansiedade e transtornos emocionais, muitas vezes sem o apoio necessário. A série alerta para a importância do diálogo e da empatia, mostrando que o sofrimento silencioso pode ter consequências devastadoras.

Além disso, a narrativa também explora as relações familiares e as dificuldades de comunicação entre gerações. Pais e filhos parecem falar línguas diferentes, e a incompreensão mútua gera conflitos e distanciamento. A série não busca culpados, mas sim evidenciar como a falta de diálogo pode agravar os desafios enfrentados pelos adolescentes. As personagens são reais, falíveis, contraditórias – tal como qualquer adolescente no mundo de hoje. Não há soluções fáceis nem finais felizes garantidos, apenas a luta diária por um lugar num mundo que, muitas vezes, não parece feito para acolher quem ainda está a descobrir-se.

Mas mais do que uma série sobre jovens, “Adolescência” é um retrato brutal da sociedade que construímos. A cada episódio, somos confrontados com a pressão constante da imagem, a solidão mascarada por redes sociais e a fragilidade da saúde mental num mundo que exige sucesso imediato. A série não embeleza a realidade nem oferece respostas fáceis. Pelo contrário, expõe a ansiedade, a depressão, o bullying e a falta de empatia que se tornaram quase normais no quotidiano dos adolescentes. E, ao fazê-lo, obriga-nos a refletir: que tipo de sociedade criámos? Os adultos da série, muitas vezes ausentes ou incapazes de compreender o que se passa, refletem um problema maior – a desconexão entre gerações. Enquanto os jovens lutam para sobreviver emocionalmente num mundo hiperconectado, o apoio que deveriam receber parece, muitas vezes, insuficiente ou inexistente.

Com uma estética envolvente, atuações genuínas, planos de realização que seguem de perto as personagens, envolvendo-nos, e uma narrativa que ressoa com o público jovem e adulto, “Adolescência” é mais do que um mero entretenimento; é um espelho da realidade. Ao trazer à tona questões urgentes da sociedade contemporânea, a produção não apenas sensibiliza, mas também convida à reflexão sobre como podemos construir um ambiente mais saudável e acolhedor para as futuras gerações. Não é apenas mais uma produção sobre dramas escolares e paixões passageiras. É uma narrativa crua e sincera sobre os desafios de crescer num mundo cada vez mais complexo. E que por isso deveria ser de visionamento obrigatório. por adolescentes, pais, educadores, governantes, por toda a sociedade.

É impossível assistir a “Adolescência” sem sentir um aperto no peito. Talvez porque nos obriga a encarar de frente aquilo que muitas vezes preferimos ignorar: crescer nunca foi fácil, mas, no século XXI, pode ser ainda mais difícil. “Adolescência” não é apenas sobre os desafios da juventude, mas sobre todos nós. Sobre como vivemos, como educamos, como ignoramos problemas que deveriam ser debatidos abertamente. Se a série nos dá um murro no estômago, talvez seja porque a realidade que espelha é mais dura do que queremos admitir.

Deixa o teu comentário

Usamos cookies para melhorar a experiência de navegação no nosso website. Ao continuar está a aceitar a política de cookies.

Registe-se ou faça login Seta perfil

Com a sessão iniciada poderá fazer download do jornal e poderá escolher a frequência com que recebe a nossa newsletter.




A 1ª página é sua personalize-a Seta menu

Escolha as categorias que farão parte da sua página inicial.

Continuará a ver as manchetes com maior destaque.

Bem-vindo ao Correio do Minho
Permita anúncios no nosso website

Parece que está a utilizar um bloqueador de anúncios.
Utilizamos a publicidade para ajudar a financiar o nosso website.

Permitir anúncios na Antena Minho