Correio do Minho

Braga, quinta-feira

- +

Ainda as controversas relações institucionais

Entre decisões e lições: A Escola como berço da Democracia

Ainda as controversas relações institucionais

Ideias

2025-04-22 às 06h00

Jorge Cruz Jorge Cruz

Com este texto, proponho-me concluir a abordagem que tenho vindo a produzir sobre as relações entre a Câmara Municipal de Braga (CMB) e as principais instituições que operam na área deste município.
Como os leitores se recordarão, anteriormente abordei algumas questões mais sensíveis e controversas no âmbito do relacionamento quer com a Universidade do Minho (UMinho) quer com o Sporting Clube de Braga (SCB). A reflexão de hoje terá por foco as relações com a Igreja bracarense, uma realidade que também se tem pautado por um extenso rol de polémicas.
Na verdade, o relacionamento entre a CMB e a Arquidiocese de Braga (AB) não tem sido sempre pacífico, sendo certo que nos últimos anos as tensões entre as duas instituições têm aumentado consideravelmente. Tais desencontros geralmente extravasam para a opinião pública, o que conduz ao envolvimento das forças vivas. Situação perfeitamente compreensível, deve dizer-se.
O diferendo entre a câmara e a arquidiocese a propósito da propriedade do Parque da Ponte, questão que só foi resolvida por via judicial, é um dos vários exemplos da inconstância do relacionamento entre as duas instituições. E tratando-se de um espaço público muito apreciado pelas populações, que dele usufruem para convívio e actividades de lazer ao ar livre, é óbvio que a ideia de o perder gerou grande controvérsia na comunidade. Além do mais, o Parque da Ponte corresponde a uma das mais tradicionais e simbólicas áreas urbanas de Braga.
Outro caso a provocar grande discussão, foram as centenas de milhar de euros pagas pela CMB à Igreja, verbas sustentadas por um contrato de arrendamento do edifício do antigo cinema S. Geraldo, mas que nunca foi utilizado nem sequer intervencionado. Em boa verdade, foi alvo de estudos e projectos, mas sem se vislumbrar qualquer início de obra, até porque os especialistas da Universidade do Minho acabaram, entretanto, por concluir que a estrutura não tinha condições para receber o projecto, nos moldes em que o município o elaborou para o local.
Em conclusão, a postura desleixada, roçando até uma certa negligência, atrasou o arranque das obras e transformou decisivamente em pesadelo o sonho de ter o “Centro de Media Arts” durante a Braga25.
Para os responsáveis municipais, os montantes perdidos com uma parte do longo aluguer (contratualmente uma parcela reverteria para a eventual aquisição do imóvel) foram contabilizados como custos de oportunidade. Para alguns dos contestatários, essas verbas traduziram-se em donativo.
Como quer que seja, o processo concluiu-se recentemente, com os dois edifícios a passarem para a esfera municipal. Contudo, as obras que irão transformar o imóvel continuam a ser uma miragem.
Mas as questões entre as duas instituições não se esgotam nas matérias de predomínio marcadamente de interesse mercantilista, como aquelas atrás descritas. Algumas intervenções públicas de altos responsáveis da Igreja levam-nos a concluir que, de facto, a relação não será propriamente idêntica aquela que Deus terá com os anjos.
Há tempos, o Deão da Catedral de Braga não se coibiu de criticar em público a Câmara, em particular pela sua estratégia relativamente ao espaço envolvente da Sé. As críticas, na sequência da autuação, pela Polícia Municipal, de viaturas de fiéis estacionadas junto ao templo, apontam para a existência de “demasiada coisa” à volta da Sé, sugerindo a mudança de local dos bares noturnos ali sediados. Na altura, o cónego José Paulo Abreu lembrou que “andamos a candidatar a Semana Santa a Património Imaterial”, mas, por outro lado, “estamos a pôr tanta coisa ali à volta que depois nem uma procissão se pode fazer.”
Por essa razão, por entender que os bares comprometem o funcionamento de várias atividades religiosas promovidas naquela zona, lançou o repto à autarquia para incentivar a deslocalização dos botequins para o Campo da Vinha. "Os bares podem ocupar, podem vir para o meio da rua e fazer o que lhes apetece, e as pessoas para ir à missa no sítio onde está a catedral de Braga é um Deus me livre", acusou.
A lista de desencontros, de choques ou de queixumes não ficaria completa se não referisse a última entrevista do anterior arcebispo ao Diário do Minho, pouco antes de abandonar as funções. Nela, este “braço de ferro” foi abordado, mas Jorge Ortiga apresentou outras queixas.
“Houve um tempo em que a Arquidiocese era considerada por aquilo que era e fazia”, situação normal tendo em conta que “tem uma história que é preciso respeitar”, disse na altura, antes de concluir que hoje, as coisas não são assim. O prelado afastou, contudo, a ideia de que “seja desconsiderada”, mas notou que “falta muito diálogo”, apesar de o ter tentado, debalde, “milhentas vezes”.
Entre algumas das queixas contava-se o programa da frustrada candidatura de Braga a Capital Europeia da Cultura, no qual a Arquidiocese não terá sido envolvida. “O que é a Capital Europeia da Cultura sem a presença da Arquidiocese”, questionou. E lançou outras interrogações: ”o património, material e imaterial, faz parte da cultura ou não faz? Será que património são essas festinhas que se fazem? Qual a razão de a Igreja de Braga não estar presente na (comissão de candidatura) Capital Europeia da Cultura?”.
Que a percepção pública sobre o relacionamento entre instituições pode ser influenciada por comentários ou notícias de alegados privilégios, ou de falta de transparência, nos processos decisórios que as envolve, é um facto indesmentível. Como indesmentível também é o descontentamento que tais situações provocam entre a população.
Por essa razão, e não só, as relações inter-institucionais, todas elas, devem pautar-se por diálogos abertos, transparentes e respeitosos, pois essa forma de actuação facilitará, naturalmente, a busca de soluções que satisfaçam as partes e tranquilizará a comunidade. Será esse o caminho a seguir.


Em tempo: A morte do Papa Francisco, ontem ocorrida, constitui uma enormíssima perda, e não apenas para os católicos. O Papa que veio dos confins do mundo, como ele próprio disse, foi bastante mais do que o líder da Igreja Católica. Foi uma voz que nunca se calou na defesa dos pobres, das vítimas das guerras, em suma dos mais frágeis, e, nessa medida, foi uma das figuras mais respeitadas em todo o mundo.
Curvo-me respeitosamente perante a sua memória e, com a esperança de que o seu exemplo frutifique, cito uma breve passagem da sua derradeira mensagem na bênção Urbi et Orbi do passado domingo de Páscoa, em parte dedicada à guerra em Gaza: “?. "A luz da Páscoa convida-nos a derrubar as barreiras que criam divisão e estão carregadas de consequências políticas e económicas".
Que descanse em paz!

Deixa o teu comentário

Usamos cookies para melhorar a experiência de navegação no nosso website. Ao continuar está a aceitar a política de cookies.

Registe-se ou faça login Seta perfil

Com a sessão iniciada poderá fazer download do jornal e poderá escolher a frequência com que recebe a nossa newsletter.




A 1ª página é sua personalize-a Seta menu

Escolha as categorias que farão parte da sua página inicial.

Continuará a ver as manchetes com maior destaque.

Bem-vindo ao Correio do Minho
Permita anúncios no nosso website

Parece que está a utilizar um bloqueador de anúncios.
Utilizamos a publicidade para ajudar a financiar o nosso website.

Permitir anúncios na Antena Minho