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… ainda habitação!

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… ainda habitação!

Escreve quem sabe

2023-01-23 às 06h00

Filipe Fontes Filipe Fontes

Várias vezes escrevi que a folha branca é um cenário que atormenta quem escreve ou desenha regularmente, num processo de materialização de reflexão e questionamento, próprio e dos outros, de temas e assuntos que, entendendo-se ou percepcionando-se, são importantes e relevantes, mas que, perante a folha branca, se acantonam num silêncio incómodo e infrutífero.
Todavia, também já várias vezes escrevi que, rapidamente, constatamos a inexistência da folha branca, antes, agora ou amanhã, e que existirá sempre algo que nos interpelará a começar, como se diz popularmente, a “abrir a torneira”, libertando tudo o que há a dizer.

Na actualidade e por cá, neste território português tão periférico em tantas coisas, mas absolutamente central para quem cá vive e trabalha, o tema da habitação é recorrente e, cada vez mais, incontornável e inevitável, correndo o risco (de tão importante ser e de nada acontecer) de se tornar quase exclusivo e único.
Lemos esta semana a confirmação do diagnóstico tão repetido quanto surpreendente: faltam “casas”, a necessidade de combater a precariedade e a indignidade habitacional é premente, a disponibilização de habitação acessível é urgente e controlar e mitigar eventuais “bolhas imobiliárias” é indisfarçável. Surpreendemente, lemos também que o valor das “casas” aumentou e que os programas de apoio e criação habitacional marcam passo e tardam a concretizar-se. Na verdade, o discurso e a prática não casam, duvida-se mesmo que se conheçam para lá da superficialidade.
E tal é preocupante e grave, não só pela relevância do tema e pela urgência da resposta, mas também pelo tempo que um processo desta natureza leva para, primeiro ser planeado e projectado, depois executado e disponibilizado à população, finalmente surtir efeito.

A habitação é tema complexo, envolvendo múltiplos actores e exigindo diferenciadas respostas em função da natureza e diversidade das carências e intenções.
Primeiro, importa realizar levantamento das necessidades e possibilidades. Apesar das tão propagadas estratégias locais de habitação estarem maioritariamente concluídas e aprovadas, encerrando um suposto levantamento exaustivo da indignidade habitacional; apesar dos estudos realizados sobre habitação acessível e carência a nível de públicos específicos (como alojamento universitário) indiciarem abrangência, na verdade, os “números” das necessidades não param de crescer e alterar, num fenómeno de dúvida sobre o real conhecimento da situação.

Depois, as várias possibilidades de solução – desde a reabilitação urbana, passando pela construção nova, aquisição ou arrendamento de fogos no caso da indignidade habitacional; desde a salvaguarda de créditos construtivos nos instrumentos de gestão territorial, passando pelo alargamento do âmbito das cedências de espaço de utilização colectiva para a dita habitação acessível e | ou custos controlados, por benefícios fiscais e redução de taxas urbanísticas, entre outras hipóteses, no âmbito da habitação acessível; desde construção nova a parcerias com plataformas gestoras de habitação e universidades para o alojamento estudantil – revelam-se complexas e morosas na sua concretização real, exigindo o cumprimento de um conjunto de normas e procedimentos, de projectos e estudos complementares que não se concretizam rapidamente, não sendo possível obte-los simplesmente com um passo de magia…

E, na verdade, no presente, este parece ser o maior problema: apesar de todo o pensamento já elaborado, apesar de todas as manifestações de fé e vontade (não se duvida), apesar de todo o trabalho feito, ainda há muito por fazer, muito por percorrer e superar. E tempo que, obrigatoriamente, não se conseguirá eliminar ou ultrapassar.
No presente, sabemos da necessidade e, supostamente, atravéz do plano de recuperação e resiliência (PRR), temos dinheiro suficiente e disponível. Falta-nos projectos e concretização. Tal não deixa de ser irónico: a necessidade resulta da realidade e da nossa incapacidade de satisfação das respostas inerentes às exigências da vida urbana. É o resultado do tempo vivido e, nesse, já não podemos actuar, apenas corrigir e melhorar; o dinheiro deriva de negociações, partilha e acesso a mecanismo financeiro europeu. Para muitos, inevitabilidade, para outros, generosidade. Para todos, realisticamente, oportunidade datada de investimento.

Entre um e outro, entre a herança e a oportunidade, fica o projecto e a obra que dependem directamente e somente de nós, dir-se-á, do nosso trabalho exclusivo e que, de uma forma ou outra, só nós podemos fazer. E, julga-se, será aqui que estaremos a falhar enquanto país, revelando-se uma incapacidade de gestão e concretização que preocupa e interroga: preocupa porque o dinheiro disponível tem prazo ; interroga porque o problema é consensualmente grave, alargado e corresponde à salvaguarda de um direito básico de cidadania: direito à habitação.
“Arrepiar” caminho não é solução. Acelerar o passo talvez seja o mais avisado, tentando chegar mais depressa, mas sempre alerta para não cair na tentação do facilitismo…
Hoje, este afigura-se ser o grande desafio do país: saber acelerar, acelerar muito e bem, com cuidado e sabedoria para (porque ainda a tempo) dar corpo a uma necessidade evidente, dar expressão a um direito básico, dar alegria e qualidade à população deste país que, apesar de todos os fenómenos de emigração, desertificação e litoralização e afins, (ainda) é feito de uma massa humana única e irrepetível que nele quer habitar e morar!

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