Correio do Minho

Braga, terça-feira

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Aos Pais com Filhos Especiais

Viver melhor aqui e agora!

Escreve quem sabe

2025-06-30 às 06h00

Redacção Redacção

Lucinda Vilaverde
Cuidadora

Escrevo esta crónica num tempo em que pululam notícias que me deixam cada vez mais triste, apreensiva e, porque não dizê-lo, frustrada:” Pai ameaça com greve de fome em reivindicação por uma vaga em CACI em Braga para um filho autista”; “Movimento Pais em Luta reivindicam vagas em CACI ou em CAVI ou outra resposta semelhante por parte do Estado”. Para quem não está familiarizado com esta temática – CACI – quer dizer Centro de Atividades e Capacitação para a Inclusão e – CAVI – Centro de Apoio à Vida Independente.
Como é possível que um estado que afirma, com frequência” governar para as Pessoas esqueça, sistematicamente, os mais frágeis dos seus concidadãos que são, sem dúvida, as Pessoas com Deficiência Mental ou Incapacidade. Isto parece acontecer porque o poder central, local, a sociedade civil, bem como a comunidade de pertença não imaginam o que é ter um filho especial a vida toda!
Nenhum de nós é capaz de imaginar o sentimento dos pais que “sonham” com o nascimento de um filho normal e se vêem confrontados com a diferença! Numa primeira fase, há um período de difícil aceitação, aquilo que alguns estudiosos designam “por luto do filho especial”, porque os pais, perante esta realidade ficam completamente incrédulos, com sentimentos de angústia, frustração, sem saber o que fazer. Se nenhum pai ou mãe se sente completamente habilitado para educar uma criança, o que passará pela cabeça dos pais quando confrontados com a realidade de um filho especial! Um tempo de alegria, de magia, de sol… dá lugar às trevas, ao desamparo e, sobretudo à insegurança. Mas o amor tudo vence! E perante esta espécie de fatalidade, os pais vão à luta, reorganizando toda a dinâmica familiar, procurando todos os meios ao seu alcance para minimizar a problemática do seu filho/a.
Mas tudo se complica quando têm de procurar uma creche adequada às necessidades daquela criança. Quantas portas se vão fechar; quantas perguntas, sinais verbalizados e não verbalizados vão ter de suportar!
Depois surge a entrada na escolaridade, onde os filhos vão permanecer durante 12 anos. E como este meio é mais alargado, o grupo de pertença é maior e mais aberto, as preocupações aumentam na mesma proporção. Isto porque o universo escolar embora tenha evoluído na aceitação da diferença, está ainda longe de ser um lugar seguro, adequado, devidamente apetrechado com os recursos materiais e humanos para fazer face às necessidades e capacidades de todos e cada um dos seus membros. Para uma parte significativa dos alunos com deficiência mental e incapacidades, as aprendizagens estritamente académicas pouco ou nada importam. A escola para estes alunos deve preocupar-se, essencialmente, com o desenvolvimento e aprendizagens ao nível da autonomia pessoal, social, das interações com os pares, do bem-estar, da preparação profissional, quando possível, isto é, do desenvolvimento integral das suas capacidades remanescentes para tornar estes alunos o mais autónomos, mais adequados e felizes possível, sempre num diálogo aberto, sincero e realista com os pais para que estes possam verbalizar, com verdade, o que esperam que a escola possa fazer pelos seus filhos.
Mas como é possível depois de 18 anos de luta, de sofrimento, de alguns “muros e barreiras” ultrapassados, de expetativas criadas, da ilusão da inclusão… que a única resposta que a sociedade tem para dar é, quase e exclusivamente esta: deixe de trabalhar e fique em casa a cuidar do seu filho/a, porque ele apesar de ser um membro com plenos direitos, não tem para onde ir! As respostas pagas com o erário de todos nós: CACI, CAVI não têm vagas para os atender.
Gastámos milhões em Festas, equipamentos de lazer, prática desportiva, meio ambiente, direitos dos animais, inteligência artificial… tudo muito importante e necessário, mas deixar para trás os que mais precisam, aqueles que muitas vezes são invisíveis aos “olhos sem coração”, isso é que não!
Criam-se grupos de trabalho, comissões ministeriais para tudo e mais alguma coisa e gostaria de ver a criação de um grupo de trabalho com os pais e com os agentes que lidam no terreno, aqueles que sentem e sabem das necessidades para fazer um levantamento objetivo, com realismo e seriedade, capaz de verificar qual será a melhor política de educação, durante os 12 anos de escolaridade obrigatória, para que possamos dizer que a inclusão existe de facto e não apenas nos normativos legais. Não podem ser os legisladores, fechados em gabinetes a traçar a vida desta Gente e das suas famílias, sem ouvir quem sabe, quem vive, quem cuida, quem sente de facto o que é necessário fazer para que os direitos consagrados nos normativos legais vigentes sejam uma realidade e não uma miragem!
Mas ainda existe uma outra fase difícil na trajetória destes “pais heróis” quando a vida já nãos lhes permite ser pais cuidadores e necessitam de um Lar Residencial para que os seus filhos possam usufruir das condições dignas durante todo seu percurso existencial. Nos meus 51 anos de vida a lidar com esta problemática já perdi a conta ao número de vezes que ouvi este desabafo: “o que vai ser dele/a quando eu partir? Deus o leve na minha frente”. Isto acontece em todos os meios socioeconómicos e culturais, bem como em famílias mais alargadas ou mais restritas. Porque estas Pessoas parecem uma “espécie de Filhos de Um Deus Menor” que ninguém quer!
A vida nem sempre é um mar de rosas para o comum dos mortais, mas a vida dos Pais com filhos Deficientes é sempre uma “calçada íngreme, dura de trilhar, com vários pedregulhos gigantes no seu caminho!

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