Entre a vergonha e o medo
Escreve quem sabe
2017-11-21 às 06h00
Ao longo dos anos fomos ouvindo que os bolos se fazem com uma pitada de dedicação, de bem-querer. Para dar sabor, condimentar a massa, fazê-la crescer. Para criação de um momento de prazer, que passa pelos sentidos, e que, usualmente, sabe muito bem ser apreciado em boa companhia. Os bolos fazem-se também com trabalho, com passos, com atenção, podendo resultar da memória ou da ajuda de uma receita. Em geral, os bolos fazem-se para os outros, e para nós em relação com os outros.
Os bolos fazem-se e constroem-se através de treino, de prática. Não é do dia para a noite que se aprendem os pequenos truques que dizem respeito à doçaria e se desenvolve aquele sentido de colocar “a pitada de sal” - pitada essa que, além de dar gosto, acrescenta equilíbrio. Os bolos feitos em casa são, habitualmente, sinónimo de herança, de tradição. Significam a pertença a algo maior. Significam que existiu uma transmissão de conhecimentos e rituais de passagem. Significam, possivelmente, que um momento de partilha fez parte das nossas vidas e que nos cabe a nós, a partir dali, manter o legado.
Não são fáceis estas pertenças a algo maior. Na realidade, são patrimónios que exigem respeito, tanto pelos ritmos do seu desenvolvimento como por aquilo que os constitui.
E por todos aqueles que, no passado, contribuíram para que, atualmente, dê certo. Aliás, o presente e aquilo (que achamos) que sabemos são fruto de anos de experiências e de transferências. Verticais, de pais para filhos, de avós para netos, de tios para sobrinhos; ou horizontais, de irmãos para irmãos, de primos para primos, de amigos para amigos. Ou até mesmo fruto dos contextos de trabalho, de estudo, de atividades de voluntariado e, quiçá, fruto do contexto da fila de supermercado. O que importa, no fundo, é o respeito que se impõe no sentido de comunidade, de vínculo aos outros - de conexão.
Os laços e as uniões possibilitam-nos uma identidade. Não de forma total, de substituição dos nossos traços individuais, mas sim uma identidade de referência. Tanto na aprendizagem daquilo que consideramos bom, como no reconhecimento daquilo que, realmente, não desejamos - e até nem sabíamos, ou não nos lembrávamos. Esta identidade possibilita-nos, ainda, uma procura de compatibilidades e afinidades, que nos permitem viver mais em relação, descobrir mais daquilo que somos, conhecer mais do que nos rodeia. São laços e uniões que nos levam por um caminho de maior apoio, de maior saúde, de maior estabilidade. E que nos ajudam a enfrentar os desafios, a discernir novas estratégias, a procurar novas soluções. A criatividade, aliada dos bolos feitos em casa, permite-nos arriscar e o desenrolar de um certo atrevimento - que dá, tal como “a pitada de sal”, maior sabor.
Fazer um bolo é sempre uma tarefa que exige um pouco de nós. Pelo esforço que lhe dedicamos ou pelo objetivo para que é feito. Implica as dosagens certas, o conhecimento dos truques e a imaginação. E pelas competências que são colocadas em prática. Hoje almocei com as minhas colegas do trabalho, num momento de partilha, de construção de identidade e de aprendizagem. Foi-nos apresentado, à sobremesa, bolo de maçã e canela e, com isto, decidido o título deste texto. Bolo de maçã e canela, símbolo do bem-estar, da conexão e da originalidade, que carateriza todas as frutíferas uniões.
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