Um batizado especial
Ideias
2020-06-13 às 06h00
Uma das características da contemporaneidade é o desconhecimento da causa das coisas. Enfim, estou a tentar ser simpático connosco, com o nosso tempo: talvez, em rigor, numa certa perspetiva, seja a ignorância e a falta de reflexão. O conhecimento sobre as mais variadas coisas é transmitido rápida e superficialmente; é transmitido, por exemplo, à velocidade dos cliques de navegação na net ou dos ruídos mais ou menos estridentes (mas, também por isso, efémeros), selecionados pela imprensa. Não temos tempo; a própria reforma de certos graus do ensino faz-se de acordo com imperativos de tempo, numa lógica de produção em massa e uniformizada de técnicos especializados. Pessoas que saibam sobretudo fazer e fazer rapidamente; não interessa saberem pensar – isso é assunto para uns exóticos a quem chamamos filósofos! Que, por via de regra, são pouco produtivos e pouco eficientes, na lógica industrial especializada que nos domina.
É certo que António Damásio (entre outros), desde o seu “Erro de Descartes” nos demonstra que a separação estanque entre a suposta racionalidade e a emoção é mais ilusória do que pensávamos até há uns anos atrás. Mas, o sentido patológico com que, muitas vezes, hoje em dia, encaramos e usamos o (não) conhecimento não é bem esse…. Não é bem o da inteligência emocional. Na realidade, vivemos um paradoxo: reclamamos por uma democracia cada vez mais direta, queremos intervir e decidir sobre matérias cada vez mais complexas e técnicas e cada vez mais, proporcionalmente, faltam-nos o tempo, os meios e a capacidade para nos informarmos adequadamente, para conhecermos a causa das coisas. Conhecê-la por nós próprios, sem aderirmos (“engolirmos”) o “mainstream” dominante, repetido acriticamente para e pela denominada “opinião pública” (cada vez mais sensitiva e menos refletida). Claro que este estado de coisas tem reflexos diretos no estado das democracias ditas liberais, clássicas que ainda resultam das nossas constituições políticas! Estão também na base dos populismos, dos entorses ao Estado de Direito, da crescente descredibilização popular (popularucha?!) da atividade política, enfim, da aceitação – apesar do aparato de protesto e de crítica (mesmo por vezes violenta!) – de todo o tipo de indignidades e atentados à liberdade individual e da aceitação inconsciente de todo o tipo de manipulações, por parte de quem quer mesmo, em proveito próprio, usar esta ignorância quase geral e irrefletida.
Vem isto a propósito de dois factos que gostaria de registar e que, para mim, também marcaram a semana que agora termina – o Leitor entenda, por favor, o que escrevi até agora, como uma espécie de desabafo e de auto penitência, pois também faço parte deste tempo!
Por um lado, o ato de vandalismo – mimetizando uma realidade norte – americana – materializado na estátua do Padre António Vieira, em Lisboa. Padre António Vieira que – note-se – era neto de uma escrava negra, jesuíta, defensor dos índios e exímio cultor da língua…. Isto de se ver a História com os olhos de hoje e, sobretudo, sem a conhecer, andando a cavalgar as ondas mediáticas das revoluções (que revoluções?!) de rua, à boleia dos EUA, é no que dá! Tantas estátuas e símbolos de uma realidade chocante, definitivamente tributárias de uma cosmovisão racista e foi logo o Padre António Vieira que apanhou com a força das leituras histórica descontextualizadas!
Importa, por outro lado, não esquecer a posição clara, nada titubeante e exemplar em termos diplomáticos (a diplomacia da transparência) da Comissão Europeia que veio dizer, inequivocamente, que temos que estar atentos, temos que nos precaver contra a onda – com provas que a Comissão disse ter – dos movimentos de desinformação que têm sido promovidos pela China, pelo regime de Xi-Jiping, na sequência da crise do Covid-19. A defesa do “modo de vida europeu” também passa por aqui: tolerância significa responsabilidade e esta depende do conhecimento correto das coisas, da vida e da política. Do conhecimento da causa das coisas.
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