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Braga, sexta-feira

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Contas da História

Entre a vergonha e o medo

Contas da História

Ideias

2021-05-25 às 06h00

João Marques João Marques

É incontornável falar da história que o Sporting Clube de Braga fez no passado domingo, ganhando mais uma Taça de Portugal e consolidando a sua posição de quarto grande no futebol profissional nacional.
Fica a faltar o almejado e já merecido título de campeão nacional, tal é a competitividade demonstrada contra os chamados 3 grandes. Será uma questão de tempo, certamente, ou não estivéssemos a falar de história.
Ora, esta história recente conjuga-se com uma outra mais antiga – a do centenário do clube. Apesar da polémica sobre a data de fundação, este foi oficialmente o ano em que o Braga passou a contar como instituição centenária na bimilenar Bracara Augusta.
A efeméride contou, por isso, com uma ilustração de relevo na forma de um dos títulos mais cobiçados das competições nacionais.
Ao lado desta história de triunfo vem-se contando uma outra, paralela, ligada à gestão do SC Braga e protagonizada por António Salvador. Já aqui o disse, e repito, para ele estará reservada uma página de ouro no livro da vida daquela agremiação. Títulos, presenças regulares em competições europeias e até uma final da Liga Europa são o sólido testemunho de uma liderança que, goste-se ou não, é ímpar no registo histórico do clube.
Agora que foi reeleito para mais um mandato à frente dos destinos do Braga, ver-se-á como fica o projeto de emancipação infraestrutural que propôs ao longo da campanha interna. Falo, claro está, da migração da “Pedreira” para o velhinho “1.º de Maio”, um anseio compreensível, mas dificilmente concretizável.
Percebe-se a ânsia de abandonar um espaço pouco amigo do adepto, com um potencial limitado de rentabilização e com um futuro incerto, dadas as aventadas possibilidades de alienação a quem nele estiver interessado.
Também se percebe e aplaude o intuito de voltar a uma casa que nunca deveria ter deixado de ser a do Braga. O 1.º de Maio foi a grande vítima do processo de delapidação de dinheiros públicos à boleia do Euro 2004, idealizado e concretizado pelo Partido Socialista. Ninguém entende como quase vinte anos volvidos ainda estamos a descobrir novas faturas de uma obra que estava pronta em 2003!!! E muito menos gente consegue racionalizar como pôde uma cidade média como Braga arrumar para um canto um estádio funcional, central e multidisciplinar, trocando-o por um desconfortável, descentrado e unidimensional.
O que se perdeu na centralidade do desporto, e do futebol em particular, na vida do concelho e de uma zona de Braga profundamente animada pelos jogos de fim-de-semana, não foi sequer transposto para o cinzento Municipal. Sem prejuízo da sua beleza e singularidade arquitetónica, a “Pedreira” é tão cara quanto altiva e trata a população e os adeptos como o seu ornamento, ao invés de servir como acessório para o verdeiro espetáculo que é o jogo e são as gentes que o coloram. O reflexo perfeito da vontade cega de um prefeito que não olhou a meios para ter a sua marca.
O que acontece é que, como costumo dizer, na vida pública, muita gente se esquece que a ânsia de deixar uma marca rapidamente se transforma num legado em forma de nódoa. Borrão dificilmente apagável do seu currículo.
Como dizia, percebe-se a bondade das intenções do Presidente do Braga, mas como o Presidente (do município) de Braga lhe tentou demonstrar, não há remissão para o pecado original que não seja o da longa penitência.
Perdoando-se o maior ou menor ajustamento arquitetónico que defende para a requalificação do 1.º de Maio e sua envolvente, o que verdadeiramente importa hoje é garantir que não acabemos com dois elefantes brancos. Como todos sabem, as despesas em que o Braga incorre para jogar e usar o Estádio Municipal são insignificantes face ao custo de manutenção daquele espaço. Só que nem toda a gente tem a coragem de assumir que a alternativa seria o abismo. Mais de centena e meia de milhões de euros a apodrecer a expensas do município.
De resto, a insistência na migração para o Parque da Ponte aparece como contraditória com o investimento na estrutura do nado-morto que foi a piscina olímpica (agora reconvertida em útil e real pavilhão multiusos) e com a concentração da atividade do clube permitida pela proximidade da “Cidade Desportiva”.
Tudo isto não deve significar o abandono de um monumento nacional que reclama e merece uma intervenção de monta. Só que tudo tem um preço e um tempo. Sem desmerecer a urgência dessa intervenção, basta ler as notícias locais e perceber que o município se prepara para investir mais de 2 milhões de euros para recuperar a Ínsula das Carvalheiras, um projeto de que se fala há décadas, mas que só com Ricardo Rio vê a luz do dia.
Eu que joguei à bola bem perto das ruínas, não relativizo a premência e preferência deste investimento face à renovação de um estádio que me é muito caro e onde criei memórias ainda hoje bem vivas. Isto, claro, com o pressuposto de que premência e preferência não sejam confundidas com esquecimento e desistência.

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