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Corredores Humanitários

Entre a vergonha e o medo

Corredores Humanitários

Escreve quem sabe

2022-03-15 às 06h00

Analisa Candeias Analisa Candeias

Ouvir ou ler as notícias, nos dias atuais, significa estar perante uma realidade que à maioria custa aceitar. Digo à maioria, porque há por aí quem concorde com as atrocidades que estão a ser cometidas neste momento, ou, pelo menos, que faça «vista grossa» ao que se está a passar – o que talvez seja ainda uma forma um pouco mais sórdida de estar perante isto. No entanto, penso que para essa maioria a situação que a Europa (e o resto do mundo) se encontra a viver não passa ao lado, muito pelo contrário: os que pertencem a esse grupo sentem-se horrorizados com este quadro que acontece na Ucrânia.
É difícil ficar indiferente. É ainda é mais difícil assistir a uma pequena – mas extensa – loucura, que parece ser uma espécie de birra ou cisma. Talvez tivesse bastado a situação pandémica para nos fazer, a todos e num nível mundial, repensar a necessidade que existe no fomento da amizade entre povos e nações. Porém, há um não sei quê de urgente na imposição da força e das ideias. É difícil ficar alheio a tudo isto, sendo a demanda contra essas teimosias uma das realizações mais árduas de manter.
Uma das coisas que me deixou atónita em tudo isto foi(é) o impedimento da ajuda humanitária. Muitas das organizações que procedem a esta ajuda apresentam já muitos anos de experiência no terreno, tendo tido sempre a sensatez de se irem mantendo neutras em situações de guerra, catástrofe ou calamidade. Aliás, esta ajuda foi revista e fortalecida durante a situação pandémica, visto que conseguiu muitas vezes chegar onde alguns, por mais que tentassem, não conseguiam chegar.
Gostaria de realçar a ação de três dessas organizações que se encontram no terreno neste momento, mas que realmente são apenas algumas das outras tantas que estão a ajudar a população ucraniana, tanto lá como cá. A verdade é que estas organizações foram criadas em cenários muito específicos, que se encontraram relacionados com consequências de guerra, genocídio ou outro tipo de confronto entre povos – pena é que ainda existam e que tenham um papel ativo nas comunidades atuais. Algum dia, talvez, chegaremos ao momento em que estas organizações já não sejam necessárias, e aí sim, algo mais terá sido feito em conjunto por todos.
A primeira dessas organizações é a Cruz Vermelha, fundada em 1863 pelas mãos de Henri Dunant, em Genève. Criada primariamente para a ajuda às vítimas de guerra e, consequentemente, sua assistência, a Cruz Vermelha tem realizado um trabalho fora de série desde a sua fundação, tendo como bom exemplo da sua atividade o desenvolvimento do Crescente Vermelho, que tem apresentado uma ação fundamental nos países de matriz muçulmana. Na verdade, esta organização mantém ainda presentes os valores tidos em conta nos seus primórdios, mantendo a sua atenção não apenas em questões de vida ou de morte, e por isso de sobrevivência, mas igualmente naquilo que diz respeito à manutenção da dignidade humana.
Outra dessas organizações é a Caritas, criada por Lorenz Werthmann, em 1897, na Alemanha. Apresentando uma orientação católica ao nível assistencial, que perdura até aos dias de hoje, foi reconhecida como uma organização internacional em 1954. A sua missão passa pelo auxílio aos mais necessitados, promovendo a caridade espelhada no Evangelho, assim como a justiça a nível global. A visão da Caritas será transformar as vidas e o mundo para algo melhor, assistindo e ajudando naquilo que for necessário, e também urgente.
Por último, menciono aqui a terceira organização, que no nosso país é conhecida como Médicos Sem Fronteiras. De inspiração e fundação mais recente, a Médicos Sem Fronteiras foi criada em 1971 por médicos e jornalistas, devido aos conflitos bélicos que aconteciam à época no Biafra. Esta organização foi estabelecida tendo em conta a justiça e a equitatividade no acesso aos serviços de saúde, devendo aí ser esquecidas questões de raça, género, religião ou política. A Médicos Sem Fronteiras tornou-se essencial em locais onde ocorram catástrofes ou calamidades, tendo vindo sempre a lutar contra a exclusão no âmbito da saúde.
Todas estas organizações são fundamentais em cenários semelhantes à situação que tem acontecido na Ucrânia, sendo promotoras dos tais corredores humanitários. No entanto, a sua ação, muito ligada à neutralidade e à manutenção das vidas de civis, encontra-se a ser limitada pelo controlo desses corredores, que, infelizmente, não têm vindo a acontecer da forma que foi estipulada – ou da forma mais correta. Se esses corredores não forem estabelecidos, ou se forem interrompidos por algum motivo, esses mesmos civis não recebem a assistência e os cuidados devidos. E, infelizmente, é isso que tem sucedido, ainda que por vezes de maneira algo discreta, mas que vem isolar a população ucraniana que ainda se encontra no país e aquela que já se encontra a ser assistida nos países vizinhos. Aliás, esse isolamento é uma boa estratégia: para quem sente que está sozinho é mais difícil pedir ajuda.
No entanto, o resto do mundo está alerta e tenta ajudar da melhor forma possível. Se talvez ainda não é a ajuda ideal? Talvez. Mas, para já, será a possível. Acredito que os corredores, os humanitários e os outros, chegarão a todos aqueles que necessitarem de apoio e de auxílio – porque, na realidade, costuma ganhar a maioria.

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