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Da deceção

A Cruz (qual calvário) das Convertidas

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Ideias

2013-06-09 às 06h00

Felisbela Lopes Felisbela Lopes

São tempos sombrios, estes os que atravessamos. É difícil encontrar sinais que nos devolvam algum otimismo. Em todas as áreas, há sintomas de crise. Os mais novos confrontam-se com níveis assustadores de desemprego; os que têm um vínculo laboral veem os seus salários diminuir drasticamente; os pensionistas já não podem contar com as reformas esperadas. Em fim-de-semana prolongado, grande parte das pessoas que conheço tira umas miniférias. Porque há estilos de vida que não se perdem de um momento para o outro.

Poder-se-ia pensar que esta austeridade que paira sob nós resulta mais de uma realidade discursiva construída na esfera mediática do que de um real assustador que nos impõe outros modos de vida. Seria excelente que assim fosse. Todos os me-ses, o confronto entre o que recebemos e o que gastamos comprova que muito mudou nos últimos tempos. Para pior, claro. Aos poucos, lá vamos reformatando os nossos estilos de vida, embora estas mudanças não sejam fáceis de operar. Durante muito tempo, habituámo-nos a fazer férias no estrangeiro, a ir com frequência a restaurantes, a trocar de roupa em cada estação, a usar o carro para distâncias curtas... O país em que nos transformámos não permite isso.

Basta um pequeno passeio pelos centros das cidades para apanhar a pulsação do país. Os cafés estão com menos pessoas, as lojas abertas são cada vez mais em menor número e as que existem fazem sucessivas promoções de produtos que deixaram de ser de grande qualidade. Em contexto pré-eleitoral autárquico, os candidatos de todas as forças partidárias terão uma enorme dificuldade pela frente: fazer com que os cidadãos acreditem que é possível dar a volta a esta conjuntura, apresentando políticas públicas consistentes e capazes de frutificar a curto e médio prazo.

Por estes dias, leio “A Sociedade da deceção”, de Gilles Lipovetsky. Nele o autor da célebre obra “A Era do Vazio” fala, logo no início, da “espiral decetiva”. Não estaremos mais pobres do que os nossos antepassados, mas somos mais ávidos de bens de toda a espécie e isso torna-se cada vez mais inacessível. Há, claro, o grande flagelo do desemprego, mas há também uma classe (muito alargada) de trabalhadores que estão “céticos, insatisfeitos e indiferentes”.

Num livro escrito sob o registo do desencantamento do mundo, talvez fosse improvável encontrar um último capítulo intitulado “a esperança sempre renovada”, mas é assim que a obra termina, defendendo-se que “não faltam razões para ter esperança”. A saber: a mundialização permite-nos escapar ao subdesenvolvimento; vivemos mais e com mais saúde, estamos integrados numa sociedade aberta sem percursos predeterminados.

“Quanto mais a sociedade é decetiva mais ela desenvolve condições de uma reoxigenação da vida”, conclui Lipovetsky nas páginas finais. É evidente que esta declaração tem subjacente uma profunda crença num individuo “que pensa, que cria, que luta, que constrói”. Também acredito que este não será o tempo para os vencidos da vida, mas nem sempre é fácil encontrar espaço para respirar bem quando o ar se torna tão rare-feito.

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