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Da globalização à gestão urbanística…

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Da globalização à gestão urbanística…

Ideias

2019-03-25 às 06h00

Filipe Fontes Filipe Fontes

Hoje, o mundo vive em plena mudança., parecendo que este se transformou na sua natureza e extensão: já não é um momento, passou a ser um estado. Já não é uma acção (seja de ruptura, reforma ou ajustamento), passou a ser um processo. Estado e processo que se foi perpetuando no tempo contemporâneo de forma instável e mutável a uma velocidade que, pese todos os estudos, análise e esforços feitos, ainda não se revelam domináveis e controláveis.
Um dos factores que mais contribui para esta realidade foi (e é) a globalização, esse fenómeno ocorrido à escala de todos nós e à escala supra de todos nós que transformou o “espaço local”, tradicional- mente nosso, num espaço aberto e acessível a todos e qualquer um, e que transformou o mundo – antes motivo de sonho de viagem ou projecto de emigração difíceis de concretização – numa oportunidade, cada vez mais provável, de descoberta, trabalho e conhecimento. Ou seja, a globalização abriu a porta da nossa casa aos outros, oferecendo-nos o inverso, isto é, a porta aberta da casa dos outros para todos nós entrarmos.
De múltiplos efeitos, e conjugada com outras realidades próprias (mas que se entende poder todas elas serem incluídas no conceito lato e abrangente de globalização), esta realidade gerou um movimento turístico, uma projecção patrimonial e cultural e a singularidades das cidades para o centro das atenções da população em geral, afirmando-se a cidade, cada vez mais, como polo agregador de atenção, disponibilidade de acesso e oportunidade de visita, turismo, negócio e trabalho.
Porque se julga consensual esta leitura, as cidades foram conhecendo uma valorização das suas áreas urbanas centrais – ou, de alguma forma, os seus centros – exponencial e aqueles mesmos centros, antes “abandonados”, desinteressantes e sem vivência urbana, transformaram-se em áreas plenas de atracção de pessoas e negócios, de oportunidade de trabalho e investimento, num processo que, independentemente das suas vantagens e problemas (afinal, haverá sempre duas perspectivas: “copo meio cheio” ou “copo meio vazio”) visibilizou o confronto entre “os que estão e habitam” e” os que vão e vêm”, “os que ficam porque são de cá” e “os que chegam porque descobrem oportunidades de negócio”. E, novamente sem tomar partido nem exercer juízo, verificou-se um novo fenómeno de “esvaziamento dos “autóctones” destas áreas centrais em detrimento da pulverização do “ambulante ou temporário”, o qual é o espelho fiel de uma constante valorização destas áreas urbanas que se revela capaz de responder aos interesses e perspectivas de investimento mas incapaz de equilibrar e satisfazer a necessidade, dir-se-á mesmo obrigação.
Chamado de gentrificação, este processo revela-se perigar a bondade dos efeitos da dita globalização, retirando destas áreas centrais aquele que é o seu maior potencial (como hoje se diz, activo) e maior riqueza identitária de um lugar: as pessoas.
Esta realidade – da globalização à gentrificação – demonstra o quanto se torna necessário e prioritário focalizar a atenção na gestão urbana das cidades. E gestão urbana na sua holística e abrangência. Ou seja, gestão urbana significa um espectro de visão e acção que toca o governo da cidade na sua escala mais macro e política até à sua gestão urbanística na sua escala mais micro e técnica.
Não chega dizer que a globalização e gentrificação são processos que ultrapassam o limite de cada cidade e que dependem de acções, medidas e gestos políticos “daqueles que comandam o mundo”. Antes pelo contrário. É necessário actuar à escala de cada cidade e exercer acção e esforço em (sem deixar de acompanhar e responder às tendências que se observam, já que é necessário estar a par do “movimento do mundo”) defender “o que é de cada um” e salvaguardar a singularidade e riqueza de cada cidade. E, não tenhamos dúvidas, isto faz-se, defendendo e valorizando as pessoas porque, ainda sem maiores dúvidas, as cidades são feitas de pessoas e para as pessoas.
Por tudo isto, a gestão urbana é cada vez mais fundamental (aliás, sempre o foi). E tal engloba a construção de uma estratégia e visão para a cidade, saber “o que se quer” e “para onde se quer ir”, que o governo político deverá responder e perseguir (e não evitar e silenciar-se em função do que ocorre para lá dos limites da cidade, em função de que “tudo é técnica e não política”). E tal engloba a construção de um edifício técnico de planos, regulamentos, acções e gestão urbanística que o seu corpo técnico deverá saber erguer e aplicar (fazendo de cada caso específico uma oportunidade de construir “essa ideia”, de corrigir o erro, de acertar a medida, mesmo que tal seja apenas “uma gota num imenso oceano).
Na verdade, globalização e gentrificação são fenómenos que chegaram e excedem a escala de cada urbe. Mas não deixam de ser fenómenos que também dependem de cada uma destas urbes para se imporem e ficarem. E cabe a cada urbe munir-se do que melhor tem para, na sua justa medida, tudo reverter para benefícios de todos, para benefício próprio. Que significa, seja qual for o cenário, as pessoas!

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