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De pouco amado... ao título conquistado!

A utilização de veículos elétricos

De pouco amado... ao título conquistado!

Ideias

2023-09-23 às 06h00

Vítor Oliveira Vítor Oliveira

Couros estava esquecido. Basta recuar ao início deste milénio. Janeiro de 2003. Na altura, exercia eu as funções de Diretor do CyberCentro de Guimarães, o primeiro equipamento que foi inaugurado no Complexo Multifuncional de Couros. O então Presidente da República entrava no quarteirão e, no seu estilo cordial e diplomático, quis satisfazer a sua curiosidade e perguntou por pormenores da história que fizeram o local.
Institucional por natureza, o então Presidente da Câmara, António Magalhães, concedeu-me a palavra. Expliquei, resumidamente! Jorge Sampaio ouviu, sorriu e comparou Couros às antigas Docas de Lisboa, hoje transformadas no singular Parque das Nações. A síntese não poderia ter sido mais perfeita, objetiva e elucidativa.
Disse ainda, em conversa informal, depois da cerimónia protocolar de inauguração, que os primeiros tempos iriam ser complicados. Até porque, na sua opinião, não se eliminam assaltos ou toxicodependência de um determinado local, de um dia para o outro. Viver e dar vida ao espaço ajudaria a extinguir gradualmente esse flagelo. Tinha razão.
No momento de definir o horário de funcionamento do CyberCentro, a Direção concordou, por unanimidade, abrir as instalações às 08 horas da manhã e encerrar às 02 horas da madrugada: 16 horas diárias de funcionamento, de segunda a sexta, mais o horário do fim de semana e feriados! O CyberCentro apenas encerrava no dia de Natal, dia de Páscoa e no dia 1 de janeiro. Assim foi.
Solicitamos uma reunião à PSP a comunicar o alargado horário de funcionamento. Objetivo: fiscalizar a Zona de Couros amiúde e com mais frequência, sobretudo em horário noturno, de modo a evitar situações tão confrangedoras como assistir a episódios de crianças da escola Egas Moniz a entrar no CyberCentro, em lágrimas, pedindo auxílio porque tinham acabado de ficar sem os seus telemóveis.
Hoje, Couros não é assim! Duas décadas depois, a regeneração do quarteirão é uma outra realidade, com a Pousada da Juventude e a sede da Fraterna, pelo meio, a muito contribuírem igualmente para a mudança de um paradigma, de padrão, de um estado de coisas pouco abonatórias, mas que fizeram efetivamente parte deste percurso, hoje vitorioso.
Seguiram-se, mais recentemente, o Ciência Viva, o Instituto de Design e a Universidade das Nações Unidas a dar mais vida a Couros – zona de Guimarães conhecida pela indústria do trabalho, da dignidade e da conjugação de ambos na construção do próprio burgo vimaranense.
Há, porém, muitos alicerces que estão na base desta elevação a Património da Humanidade por parte deste importante e dinâmico núcleo da indústria de transformação de peles em couros, com uma produção assente em técnicas tradicionais e no labor manual. Dessa época remanescem secadouros e tanques de tinturaria a céu aberto, mas também edifícios, transformados hoje em serviços destinados aos cidadãos e habitantes vimaranenses.
O primeiro reconhecimento, a nível nacional, desta área de Guimarães ocorreu em julho de 1977, quando a Zona de Couros foi classificada como Imóvel de Interesse Público, pela mão de Maria João Vasconcelos, então Diretora do Museu de Alberto Sampaio.
A arquiteta Alexandra Gesta, o rosto pela classificação do Centro Histórico, esteve na coordenação do processo até 2017, altura em que a candidatura de Guimarães foi inscrita na Lista Indicativa da Comissão Nacional da UNESCO, após desafio proposto por Domingos Bragança, acompanhado pelo então Reitor da UM, António Cunha.
Neste longo processo, o Ministério dos Negócios Estrangeiros validou a candidatura, na sequência de um trabalho realizado por Ricardo Rodrigues, que anteriormente tinha realizado um estágio no Município de Guimarães com um tema dedicado a Couros. Rita Matos acompanhou-o nos procedimentos seguintes e um parecer “muito positivo” de um Professor da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Sevilha homologou todo o trabalho desenvolvido.
Mais recentemente, no início do mês de junho deste ano, a candidatura de Couros foi avaliada, em Paris, pelo órgão executivo da UNESCO. Passou! E quando passa em Paris… o destino está traçado! Já tinha sido assim com o Centro Histórico, em 2001. Foi assim também com Couros. A Assembleia Geral, de 19 de setembro, limitou-se a confirmar o que se anunciava: o alargamento da zona classificada, duplicando-se em Guimarães a área de Património da Humanidade, incluindo agora todo o sistema hídrico proveniente da Costa e da montanha da Penha, com uma série de linhas de água oriundas, igualmente, de Urgezes.
Além do estatuto internacional, Couros conquistou automaticamente outro título. Os tanques, com o seu valor arquitetónico natural, são agora Monumento Nacional – objetivo que nunca tinham logrado desde a década 70, mas que passam agora a ser considerados como tal, ao abrigo dos direitos e obrigações que estão associados ao reconhecimento concedido pela UNESCO.
Falta falar dos moradores, os verdadeiros heróis de Couros! Se um dia houver uma festa para evocar a elevação a Património da Humanidade, não bastará um simples “obrigado”! Merecem inteiramente uma medalha comemorativa, acompanhada por excertos de textos da candidatura apresentada por Guimarães. Para cada um deles. Em forma de agradecimento. É simbólico. Mas lembrará memória… futura!

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