A armadilha da gratuidade universal
Ideias
2023-09-24 às 06h00
“A Europa é feita de cafetarias, de cafés. Estes vão da cafetaria preferida de Pessoa, em Lisboa, aos cafés de Odessa frequentados pelos gangsters de Isaac Babel. Vão dos cafés de Copenhaga, onde Kierkegaard passava nos seus passeios concentrados, aos balcões de Palermo. Não há cafés antigos ou definidores em Moscovo, que é já um subúrbio da Ásia. Poucos em Inglaterra, após um breve período em que estiveram na moda, no século XVIII. Nenhuns na América do Norte, para lá do posto avançado galicano de Nova Orleães. Desenhe-se o mapa das cafeterias e obter-se-á um dos marcadores essenciais da ideia de Europa.”, diz-nos uma das grandes mentes literárias da atualidade, um dos grandes filósofos da atualidade.
E não é um café qualquer, é um café com esplanada. Em Portugal, e em Braga, não somos diferentes. Somos europeus, temos cafés, temos esplanadas e gostamos de nos encontrar na esplanada.
“O café é um local de entrevistas e conspirações, de debates intelectuais e mexericos, para o flaneur e o poeta ou metafísico debruçado sobre o bloco de apontamentos. Aberto a todos, é todavia um clube, uma franco-maçonaria de reconhecimento político ou artístico-literário e presença programática. Uma chávena de café, um copo de vinho, um chá com rum assegura um local onde trabalhar, sonhar, jogar xadrez ou simplesmente permanecer aquecido durante todo o dia. É o clube dos espirituosos e a posterestante dos sem-abrigo.” diz-nos, ainda, Steiner.
Quantos de nós já não estiveram numa esplanada a beber um café de saco na Brasileira, ou um fino com amendoins, um chá acompanhado com uns fidalguinhos, um copo de vinho ou até mesmo um martini com cerveja? E quantos de nós não o fizeram enquanto se lê o jornal, um livro, se aprecia a vista, se conversa ou se discute? Certo é que gostamos de “esplanar”! Em alguns sítios criam-se até hábitos e rotinas, e sabemos que àquela hora, naquele dia, o amigo está ali naquele sítio. Há rituais sagrados na arte de esplanar ou de ir ao café. Até temos esplanadas que se cobrem e fecham no inverno! Local de encontros, de conspirações, de mexericos, de amizades, de gizar o futuro. Nos cafés, e nas suas esplanadas, acontece o mundo!
As esplanadas e os cafés fazem parte da definição da cultura europeia. Na América ou na Ásia não há disto. Há outras coisas.
O retorno económico para uma cidade que tem esplanadas é considerável, mas mais do que isso, o bem-estar, a socialização, o impacto cultural, a saúde mental de quem usufrui destes locais merecia uma revisão até no custo de ocupação.
Em Braga, o preço de ocupação de espaço público de esplanadas varia entre os 20 e os 40 euros por metro quadrado. Uma esplanada com 5 mesas e cadeiras custa entre 500 e 1000 euros por ano e várias pessoas usufruem desse espaço. As autoridades fiscalizam com rigor todos os metros de esplanada, de toldos, de horários. Até chegam a obrigar à remoção de bandeiras de clubes nas fachadas.
Em sentido contrário, 93% dos lugares de estacionamento automóvel na rua são grátis e o estacionamento proibido em 2.ª fila, lugares de cargas e descargas, passeios, passadeiras, lugares para pessoas portadoras de dístico de deficientes é fiscalizado de uma forma pouco rigorosa. É praticamente inexistente, perante toda a impunidade e sentimento de impunidade que existe. É uma triste realidade.
Duas ocupações de espaço público, uma com tanto retorno para a cidade, é taxada e zelosamente fiscalizada pelas autoridades. Outra, que prejudica a cidade, não é taxada e ainda vemos as autoridades a fechar os olhos e a permitir tudo. Depois há ainda o tema da utilização do espaço público, mas esse dará para um outro artigo.
Eu preferia que as esplanadas ficassem isentas de taxas, e taxassem o estacionamento à superfície. É estranho que se abram guerras contra as esplanadas e os comerciantes que tanto nos dão.
19 Fevereiro 2025
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