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(Des)Sensibilizar

Entre a vergonha e o medo

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Escreve quem sabe

2014-01-15 às 06h00

Analisa Candeias Analisa Candeias

Adiferença que marca cada um de nós, juntamente com aquilo que nos coloca em comum, ajuda a que as nossas sociedades sejam mais ricas, plenas e admiráveis de diversidade a nível físico, pessoal, emocional e até profissional. A criatividade é algo que carateriza o ser humano, e a sempre busca pela inovação marcam-no no sentido de não parar, de avançar no tempo, de progredir no espaço. Somos feitos de matéria pensante, e cada pessoa poderá influenciar o meio onde vive através da ação dessa matéria, criar novos rumos de desenvolvimento, fomentar o bem-estar de todos.

E é exatamente através dessa diferença e criatividade que a Enfermagem pode continuar a exercer a sua dedicação às diferentes populações, promovendo as melhores (e mais adequadas) respostas das pessoas aos processos de transição.

Estes processos rodeiam-nos no dia-a-dia, acompanham-nos desde a nossa conceção e são fundamentais para a estabilidade, para o nosso equilíbrio. Alguns de nós conseguem a manutenção desse equilíbrio de forma mais adequada - aceite socialmente por todos - do que outros, porém, é exatamente naqueles cuja harmonia - de motivo, de comportamento, de ação - se encontra desajustada que a Enfermagem se pode focalizar. Aliás, compete-nos, a mim e aos restantes enfermeiros, encontrar as necessidades a estes níveis, para que seja possível que as pessoas em desarmonia (ou consideradas na desarmonia daquilo que é acolhido como normalidade) possam encontrar caminhos de resposta claros e eficazes em comunidade.

Neste momento encontro-me a realizar estudos no âmbito da Enfermagem de saúde mental e psiquiatria, e tenho encontrado, pelo percurso percorrido, inúmeras pessoas a quem o desequilíbrio mencionado surgiu. Primeiramente cabe-nos, como profissionais de saúde, a distinção (nem sempre concreta e fácil) daquilo que é o limite para lá do equilíbrio, e tentar estabelecer estratégias terapêuticas para que estas pessoas voltem, ou mantenham, um estado de vivência adaptada, aceitável pela lei e autónomo. Uma das maiores dificuldades que encontrei - e sem dúvida alguma - é a aceitação destas pessoas consideradas em desarmonia mental pelos outros e pela sociedade.

O que pensaria como inimaginável, como retrógrado e já ultrapassado, afinal ainda existe. O estigma presenciado no tratamento social das pessoas com patologia mental é ainda muito presente e complexo, sendo que, estas pessoas (já em equilíbrio próprio e funcional) apresentam extremas dificuldades na inserção comunitária e/ou profissional, aceitação pelos pares e não-pares e, ainda, na adequação de recursos às suas extraordinárias capacidades e funções - eventualmente, dificuldades essas estimuladas pelo medo do que poderá acontecer ou pelo ceticismo no melhor que poderá vir.

Esta é uma das áreas de ação da Enfermagem em que é possível realizar cuidados com ganhos em saúde excecionais, e em que, provavelmente, o maior retorno e satisfação possíveis serão ao nível das pequenas conquistas diárias das pessoas com problemas de saúde do âmbito mental. Compete-nos, como profissionais de Enfermagem, estarmos atentos, libertos para aceitar a diferença e estimulados para a ajuda naquilo que poderá ser quase impercetível.

São pequenas alterações que levam ao contacto das pessoas com a desarmonia interior, muitas vezes continuadas no tempo, e outras vezes promovidas pelos contextos políticos e económicos em que vivemos, assim como pelo tão atual isolamento social e frieza afetiva que pautam (porém, nem em regra, nem em exceção) as comunidades contemporâneas.

As mudanças que são indispensáveis e urgentes para a diminuição do estigma para com a pessoa com patologia mental devem surgir, não só e apenas por parte dos profissionais ligados à saúde, todavia também, e de forma forte, quase agressiva e estruturada, por parte de cada um de nós, civis, com a responsabilidade de ajudar o outro que vive ao nosso lado.

Visto sermos matéria pensante, somos igualmente matéria responsável pela aceitação da diferença, e pela promoção do bem-estar, autonomia e desenvolvimento de capacidades daquele que se encontra em desequilíbrio. Afinal, todos nós vivemos nessa linha ténue do que é considerado como normal, e muito facilmente poderemos entrar em desarmonia com o nosso interior - não esquecendo, semelhantemente, a igual responsabilidade de cuidar de nós, como seres únicos e singulares.

Hoje faço um apelo à mudança. Não só e apenas o apelo ao (re)despertar da Enfermagem para estas problemáticas, mas sim o apelo a todos nós, que constituímos as comunidades e populações, e que nos encontramos lado-a-lado e em igual circunstância com as pessoas em momentâneo desequilíbrio - que devemos ter o dever de ajudar e promover, e o direito de saber acolher e integrar, de acordo com o que de melhor temos e somos.

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