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E farei de ti minha escrava

Enfermeiros portugueses em convenção internacional

E farei de ti minha escrava

Voz aos Escritores

2024-11-22 às 06h00

Joana Páris Rito Joana Páris Rito

Há lugares no mundo, mais do que em toda a geografia do planeta dominado por homens, em que ser mulher é uma maldição. Moçambique, concretamente a província de Cabo Delgado, é um desses lugares. Desde a colonização pelos portugueses até aos dias de hoje, milhares de mulheres são perseguidas e escravizadas. Se durante a colonização e a Guerra Colonial as moçambicanas trocavam sexo por comida, moeda de câmbio de alguns militares portugueses, que plantavam sementes em corpos famintos e povoavam Moçambique de mulatos, na segunda década do presente século são os terroristas muçulmanos que lá procriam violentamente fiéis de Alá. Militantes ligados ao Estado Islâmico (ISIS) e ao grupo Al-Shabab (ou mashababos) encontram na província de Cabo Delgado um pasto pródigo em meninas e jovens mulheres. Assaltam aldeias armados, escolhem as casas onde habitam meninas e jovens mulheres, agridem os homens que lhes fazem frente e as mães que se oferecem no lugar das filhas raptadas. Alguns dos pais e mães opositores são degolados. Os terroristas buscam carne tenra e saudável, de preferência virgens intocadas por machos e males venéreos, sem vícios de corpo, meninas na adolescência e jovens mulheres capazes de árduos trabalhos sem o quebranto dos anos, que laborem nas lides domésticas e os apapariquem, cozinhem, lavem roupas, curem ferimentos e maleitas, cultivem as terras dos acampamentos, faxinem sujeiras e consolem primárias vontades viris. As mulheres servem-nos nos catres e nas mesas, ou no chão, nas prováveis ausências de mobiliário e modos civilizacionais. As de pele menos escura são as mais apetecidas. No reino do terror também existe racismo. As meninas e jovens mulheres são troféus entregues pelos chefes dos bandos aos seus sequazes, prémios das chacinas, femininas recompensas no regresso das operações militares em que espalham o terror, o medo e a mortandade no desmesurado domínio territorial e intrínsecas riquezas. Para evitar conflitos entre machos as mais requisitadas são violadas por todos os que as ambicionam. E como entre mulheres outrossim subsistem deploráveis hierarquias, as bajuladoras são nomeadas capatazes pelos cabecilhas, mulheres que vigiam as outras, as doutrinam na sagrada palavra do Alcorão e lhes incutem um Deus mudo e cego, um Deus que lhes dita o destino de escravas. Mulheres capatazes que nos cios dos machos lhes bichanam as impuras para a fornicação, por estarem menstruadas ou peçonhentas. Se as raparigas seleccionadas se recusam a saciar-lhes a libido, são espancadas e deixadas sem comer e sem beber por três ou quatro dias. Se não cumprem as obrigações com zelo são chamadas de infiéis inúteis e encarceradas em solitárias fétidas, onde o calor sufoca e desidrata, o abandono atormenta e os fantasmas da desgraça agigantam-se. O cubículo escuro e claustrofóbico é mais temido que a brutalidade das agressões e da cobrição. Além de escravas do sexo e dos trabalhos forçados, as cativas são fonte de chorudos rendimentos, vendidas como noivas na Tanzânia ou feiradas por avultadas quantias quando as famílias logram pagar-lhes os resgates. Também são isco no aliciamento dos rapazes das aldeias que os terroristas engajam com a promessa de mulheres à discrição, sexo fortuito ou marital, gratuito, polígamo, cada macho tem direito a quatro mulheres legitimadas pela lei de Deus e outras tantas à disposição dos seus ímpetos genitais. Nos cativeiros não existem contraceptivos nem assistência médica nas gestações e partos. Algumas morrem a dar vida. As gravidezes indesejadas, consequências das reiteradas violações, agravam-lhes a escravidão e dificultam-lhes as fugas. Se têm filhos, evadir-se não é uma opção, largar os filhos às garras dos sanguinários é-lhes inconcebível. Muitas não querem voltar às famílias pela vergonha das prenhezes e dos filhos inocentes, fêmeas usadas e abusadas que perderam a honra e a serventia, prisioneiras nos cativeiros e ostracizadas nas aldeias de origem que não perdoam barrigas ilegítimas e enjeitam os descendentes dos facínoras, meninas e jovens mulheres que germinam as sementes do inimigo, mães de espúrios, provas cabais da submissão de um povo aos mandos ditatoriais dos invasores, intrusos ferozes numa terra que não lhes pertence, uma terra que não visiona o fim da imiscuição e da cobiça, onde as mulheres são eternas servas do poder.

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