Um batizado especial
Ensino
2019-12-14 às 06h00
Já tivemos oportunidade, aqui, nestas pagumas do Correio do Minho, de falar sobre uma recente série de referência da HBO: Years & Years (Junho de 2019). Criada por Russel T. Davies e contando com a participação de excelentes atores, propõe-nos uma reflexão sobre o Reino Unido “pós-Brexit” e, por decorrência, sobre a Europa e, no fundo, sobre a democracia e a nossa vida de cidadãos europeus. Ora, as eleições de anteontem no Reino Unido são, para mim, um possível primeiro passo do caminho imaginado (sugerido) para o Reino Unido e para a Europa, nessa excelente série que pressupõe, efetivamente, uma realidade (imaginada), com o “Brexit” consumado e assimilado.
A vitória dos Conservadores de Boris Johnson, com maioria absoluta e o esfrangalhar do partido trabalhista de Corbin (um péssimo candidato, como se comprovou nas urnas), garante capacidade e “elan” político para um corte definitivo e rápido (pelo menos, simbolicamente rápido) com a União Europeia. Concretizou-se o “Brexit”, no passado dia 12 de Dezembro, três anos e meio após o famigerado referendo em que os britânicos, por uma margem mínima, decidiram sair da UE. Ratificaram, agora e de uma forma clara essa vontade. Nada a dizer e, com este resultado, caiem alguns mitos que uma certa intelectualidade académica (sobretudo) gosta de adotar, para justificar derrotas eleitorais das ideias que lhe são mais próximas. No fundo, desculpas de mau pagador e, de certo modo, de quem não sabe jogar o jogo da democracia (pelo menos, da democracia formal).
Passemos rapidamente em revista alguns desses mitos: dizia-se que o resultado do referendo era imputável, em parte, ao alheamento dos jovens. Ora, desta vez, houve cerca de 4 milhões de novos eleitores e grande parte deles com menos de 36 anos.
O resultado foi um crescimento da votação nos Conservadores e, por decorrência, na promessa de um “Brexit” rápido e definitivo. Por outro lado, muitas vezes acusa-se a onda digital, a dependência relativamente às novas tecnologias de comunicação de manipularem o sentido de voto dos eleitores desprevenidos, com pouca literacia, despreocupados, irritados ou, de alguma forma, pré-dispostos à contestação.
A narrativa dominante foi nesse sentido, relativamente á eleição de, por exemplo, de Trump e de Bolsonaro. A desculpa das “fake news” foi repetida até á exaustão. Claro que uma análise um pouco mais fina provocaria desconforto a partir dessas conclusões: como é que quem é iletrado ou desprevenido está, por outro lado, tão ligado e em interação com o mundo digital?! Poderá ser, mas não tão linearmente como isso! Ou seja, a influência das campanhas digitais (facebook, whatsapp, etc) pode não ser assim tão automática e mecanizada como isso. Na realidade, os Trabalhistas investiram enormemente (muitissimo mais do que os Conservadores) nos meios e nas campanhas digitais e, contudo, tiveram o pior resultado dos últimos 80 anos de história!
Pessoalmente, creio que os cenários de alguma dificuldade (com ou sem acordo) para ambos os lados (Reino Unido e UE) serão os mais plausíveis, pelo menos a curto e médio prazo. Também penso que os danos políticos para a integração serão limitados (ao contrário do que muitos catastrofistas anunciam). Não só não haverá nenhuma desagregação da UE, como, em reação direta ao “Brexit”, poderá assistir-se a um reforço da unidade europeia (pelo menos, sem Inglaterra).
Porém, a prazo poderá estar em curso a construção de um novo cenário geopolítico mundial, polarizado pelos EUA ao estilo de Trump (com ou sem Trump), passando a UE a ser um ator relativamente secundário.
No entanto, resta-nos aquilo que é a nossa verdadeira riqueza: uma visão cultural e civilizacional que sirva de exemplo e de referência para o mundo. A tão discutida identidade ou especificidade europeia (assente nos princípios da inclusão, da tolerância, do respeito pelos Direitos Fundamentais e da liberdade individual), pela qual deveremos lutar!
18 Julho 2024
06 Junho 2024
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