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Fomos TAPeados (2)

Ideias

2022-12-30 às 06h00

Carlos Abreu Amorim Carlos Abreu Amorim

A TAP transformou-se num poço sem fundo – político e financeiro. Ainda hoje custa a acreditar como é que, em 2016, os governantes de então, com fama e sinais exteriores de não se encontrarem desprovidos das suas faculdades de discernimento e de lucidez, não tiveram qualquer pejo em desfazer a privatização realizada pelo Governo anterior e, alegremente, voltaram a nacionalizar os incessantes prejuízos passados, presentes e futuros dessa companhia aérea. A obsoleta obsessão ideológica (“a TAP tem de ser pública, é a nossa companhia de bandeira”), embora evidente e confessada, comporta uma tal dose de irracionalidade que não pode explicar tudo.
Os milhares de milhões de euros que foram derramados em cima da TAP serão sempre insuficientes para repor o equilíbrio financeiro (ou outro) de uma empresa repleta de vícios, com o lastro de uma longa tradição de incongruências de gestão e de uma lógica assumida de empresa ao serviço do regime, dos seus favoritos e das suas prebendas.
O problema não se reduz a dinheiro – mais do que isso, a questão principal reside na “filosofia da empresa” que ali se gerou nas últimas décadas. Não querendo comparar diretamente realidades e escalas muito distintas, quando, no endogâmico universo lisboeta, escuto relatos acerca dos modos rotineiros de funcionamento da TAP vêm-me à memória as histórias que ouvi sobre os antigos Estaleiros Navais de Viana do Castelo antes de serem privatizados e se tornarem numa empresa pujante e robusta.



O Governo de António Costa apostou tudo na TAP pública. Depois, sem pestanejar, garantiu que esse teria sido um mero primeiro passo para conseguir o objetivo final da reprivatização – ou seja, para regressar ao exato ponto em que a companhia aérea já se encontrava em 2015 mas milhares de milhões de euros depois…
Só que o problema TAP embrulhou-se com uma chaga originária do Governo que já tinha infetado fatalmente antes mesmo das Legislativas antecipadas: a luta pela sucessão de António Costa. Costa queria sair em 2024 e anunciou-o internamente – até porque estava longe de esperar eleições em 2022 e logo com maioria absoluta. De imediato gerou-se uma luta fratricida e sem quartel, dentro do PS e do Governo, entre as fações Medina e Pedro Nuno Santos. O novo Governo, mesmo absoluto, não foi capaz de suster essa guerra civil. Pelo contrário, os ministérios, as secretarias de Estado e as assessorias, assim como todos os demais lugares de poder do Estado que o PS empilhava para os seus, foram arrumados em função dos equilíbrios bélicos entre as forças em presença. Costa assistiu a tudo incapaz de deter esse fenómeno corrosivo da sua própria autoridade – até porque não foi capaz de deixar de exibir uma evidente preferência pessoal por Medina.
O imbróglio da TAP em que Pedro Nuno Santos se atolou era apetitoso demais para que a fação rival não tentasse aproveitar os múltiplos percalços daquela pista de aviação para o fazer cair sem paraquedas. Aparentemente, no palco de guerra intestina entre socialistas em que o Governo se converteu, a demissão de Pedro Nuno Santos terá dado a vantagem esperada para as hostes do ex-presidente da câmara de Lisboa.
Talvez, uma mera vitória de Pirro.
Mesmo com a colaboração de secretários de estado trânsfugas, é impossível que Medina escape incólume desta última trapalhada. O acordo pornográfico pela saída da Administração da TAP de Alexandra Reis ainda é do tempo em que a sua esposa dirigia o departamento jurídico da empresa e é impossível que o ministro o ignorasse - se não sabia tinha a indeclinável obrigação de o saber. A escolha da ex-administradora para dirigir a NAV também é da sua responsabilidade (em conjunto com o ministério das Infraestruturas). E a nomeação para secretária de estado do Tesouro foi uma inequívoca escolha pessoal sua. No último ano, pelo menos, Medina foi o mentor da carreira de Alexandra Reis e ligou o seu destino político ao desta última. Fingir que nada tem a ver com o que se passou é um privilégio, por enquanto, apenas ao alcance do primeiro-ministro.
No meio disto tudo resta Portugal. Sem um Governo digno desse nome, com um presidente da república que se esvai em declarações em qualquer esquina, contraditórias e que já quase ninguém leva a sério, com uma Oposição que ainda não recuperou totalmente da derrota nas Le- gislativas, os portugueses vivem cada vez com mais dificuldades e menos esperança, emigram, alheiam-se e, alguns, enfurecem-se. Para já, em silêncio.

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