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Ideias
2025-01-04 às 06h00
Permitam-me começar com uma confissão: o diretor, num rasgo de rara magnanimidade, permitiu-me hoje escrever não uma, mas duas crónicas na mesma edição. Um verdadeiro dois-em-um! O senhor leitor paga apenas um jornal e leva dois diferentes assuntos debaixo do braço. “E se, por azar, nenhum me agradar?”, lamento dizer que o seu rico dinheirinho não será devolvido, a época de saldos não chega a tanto e pechincha como esta não encontra noutro lado.
Antes que me acusem de segundas intenções, aviso desde já: os dois temas que trago não têm absolutamente nada a ver entre si. Só uma mente retorcida pensaria o contrário. Mas, claro, o senhor não é esse tipo de leitor, pois não?
Primeira Crónica: Os Gambuzinos
A Amazónia peruana é um palco de maravilhas e assombros, povoada de criaturas que parecem saídas de sonhos febris. Há o Chullachaqui, com a sua perna de cabra que o denuncia, o Tunchi, que espalha assobios fantasmagóricos, o aquático Yacuruna, e muitos mais. Estes seres, e tantos outros, fazem da selva um lugar onde o impossível ganha forma quando a noite cai.
Sempre que visito a Amazónia, confesso que me invade uma pontada de inveja. Os habitantes destas terras têm toda uma galeria de monstros e mistérios para enfrentar. Nós, na nossa infância entre quintais das avós, tínhamos apenas… o Gambuzino.
Ah, Gambuzino mítico! Quanta épica caçada foi armada em teu nome. Tudo começava num qualquer serão familiar, quando os primos mais velhos, fartos da conversa dos adultos e com aquela irreprimível ânsia de fumar às escondidas, diziam com autoridade: “Embora ao quintal caçar Gambu- zinos!” Era magia pura. Os adultos riam-se, e nós, putos ingénuos, seguíamos religiosamente os nossos mentores para o escuro desconhecido.
O quintal transformava-se num mundo de sombras e tensão. Imaginávamos a criatura a rondar, pronta para nos apanhar ou ser apanhada. Andávamos pé-ante-pé, tentando silenciar os risos nervosos e apertando bem as duas metades do traseiro, porque nos diziam que os Gambuzinos eram de ouvido fino e melhor nariz; certamente detetariam as toneladas de emoção que lutavam para se escaparem pelas tripas.
Nunca vi nenhum, mas procurei muitos. E, se quer saber, não me arrependo.
Segunda Crónica: Este país inseguro e cheio de imigrantes
Sendo eu emigrante no Peru — um país que me acolheu com generosidade —, é natural que me intrigue a forma como certos grupos falam dos imigrantes no meu país. Vivendo num lugar onde a insegurança é mais do que uma perceção, observo atento o discurso sobre crime e imigração em Portugal.
Afinal, o que dizem os factos? Segundo o Global Peace Index, em 2023 Portugal foi o sétimo país mais seguro do mundo e o quinto na Europa. À nossa frente, apenas lugares como Singapura, Nova Zelândia e Islândia, esse pequeno paraíso de bacalhaus e auroras boreais.
“Pois é”, diz-me o vizinho do lado, “mas estamos cheios de imigrantes, e com eles é só crime!” Intrigado, fui verificar os números. E, surpresa das surpresas, encontrei boas notícias. Em 2023 (Relatório Anual de Segurança Interna), os crimes violentos diminuíram. Os homicídios, por exemplo, decresceram, e quase metade deles ocorrem em contexto de relações pessoais ou familiares. Isto ao mesmo tempo que aumentava a imigração.
Os verdadeiros problemas? Violência doméstica, crimes financeiros, corrupção e burlas, nomeadamente informáticas. E quanto aos imigrantes? Apenas 16,7% dos presos são estrangeiros, muitos deles não-residentes, detidos em operações internacionais relacionadas com o tráfico de drogas, apanhados em trânsito nos portos e aeroportos. Para se ter uma ideia, no Peru há uns 50 portugueses presos por tráfico no aeroporto de Lima, isto para uma bem integrada e próspera comunidade de umas 300 almas lusitanas a viver neste país. Imagine se os peruanos tirassem daquelas conclusões de precipitada proporcionalidade sobre nós!
Voltando aos Gambuzinos
E agora, caro leitor, regresso à minha primeira crónica. A preguiça impede-me de alterar o texto anterior, mas lembrei-me de algo importante. Apesar de nunca ter visto um Gambuzino, acredito que eles existem… ou melhor, que foram criados.
Tudo não passava de uma perceção, uma perceção que nos criavam, para que os adultos se rissem da nossa candura, para que os primos mais velhos pudessem fumar à custa da nossa ingenuidade e nós, enfim, éramos apenas gaiatos com a patetice de gaiatos. No fim, a perceção criada passava a ser a realidade e a realidade a perceção que nos criaram. Tivessem os primos um discurso mais pomposo e já até diriam: “Há que organizar uma batida, porque os putos estão acagaçados com uma tremenda perceção de Gambuzinos”, e então seria a nossa perceção a gerar mais perceção, porque se aqueles primos matulões achavam que era preciso, então era mesmo verdade.
Parece que reabriu a época. Senhoras e senhores, vamos à caça de perceções…
16 Fevereiro 2025
16 Fevereiro 2025
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