Entre a vergonha e o medo
Escreve quem sabe
2021-02-09 às 06h00
Já sabemos: estamos a viver tempos difíceis, tempos que nos forçam a sobreviver. Lemos e ouvimos nas notícias algumas palavras difíceis, como por exemplo «medicina de catástrofe», «escolha», «sofrimento moral» ou até «morte». Esta última palavra torna-se particularmente difícil de escutar, pois simboliza aquilo que já não é possível fazer mais. É uma palavra importante e acredito que temos vindo a conhecer muito com ela - também com as derrotas é possível aprender para o futuro. No entanto, longe de dramas. A esperança nasce muitas vezes em terreno inóspito.
Não sei se será das questões pandémicas - que acreditei que viessem unir as pessoas num espaço de curto prazo -, mas vou identificando, conhecendo e observando, com maior regularidade, comportamentos algo dúbios naquilo que diz respeito à honestidade. E estes passam por ultrapassagens rápidas nas filas dos supermercados (com usufruto de uma via verde autoaplicada), aproveitamento de vacinas, por acentuação dos compadrios relativos aos locais de trabalho ou até pelos supostos amigos que, afinal, não são assim tão próximos como pensado. E, atenção, estes incríveis desempenhos são também relatados por pessoas mais e menos próximas ao meu quotidiano, expostos nas notícias e até ouvidos através da televisão. Infelizmente, não são produto do meu imaginário, antes fossem.
Talvez não seja apenas uma questão de honestidade, porém, essas performances estão igualmente relacionadas com a dimensão da integridade, da honra, da vergonha e do pudor. Parecem palavras antigas, certo? Porém, ainda existem nos dias de hoje, sendo urgentes de utilizar para os momentos atuais. Até que ponto, neste momento de sobrevivência, nos estamos a esquecer destas palavras? Destes significados? Será que é algo que tem vindo a acontecer nas últimas décadas, e que agora se acentuou, ou estamos todos numa fase do «tudo vale»? Afinal, o que é que foi esquecido? E porquê?
E, provavelmente o mais importante, como permitimos que estas coisas aconteçam à nossa volta? Há um cansaço visível, uma exaustão perante esses tais comportamento, que talvez nos puxem para a ação mais fácil, que é da não reação. Estamos demasiado cansados para a indignação, sentimos que não temos energia suficiente para enfrentar aquilo que não está correto - que, diga-se de passagem, é facilmente identificado. Ainda assim, até onde será possível levarmos isto? Somos valentes o suficiente para dizermos que já é suficiente? Acredito que sim. A minha esperança transformou-se num plano de médio/longo prazo, mas creio que ainda existem bons exemplos e pessoas que se manifestam contra a injustiça. E são esses que devemos seguir, esses líderes não corruptos, sem cúmplices e meritórios dos seus sucessos. Eles existem, habitualmente discretos e recatados, talvez à espera de companhia para combater esta onda de dubiedade que paira no ar.
É verdade que nos encontramos a atravessar uma crise. Mas isso não nos dá o direito de não respeitarmos os limites perante a dignidade dos outros, tampouco de nos atravessarmos nos caminhos dos mais frágeis, não os protegendo. Qual é o nosso dever, enquanto cidadãos? Mais: qual é o nosso dever enquanto pessoas? Se cada um de nós fizer a sua parte de bem, o mundo será melhor. Aliás, o mundo será diferente, passo a passo. Talvez a honestidade ande por aí um pouco perdida, escondida com a integridade, a vergonha e o pudor - talvez seja a hora de a honra os fazer aparecer.
13 Junho 2025
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