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Lelé da Luta

Os perigos do consumo impulsivo na compra de um automóvel

Lelé da Luta

Ideias

2024-04-30 às 06h00

João Marques João Marques

Comemoraram-se na passada quinta-feira os 50 anos do 25 de abril. Uma data marcante não só porque assinala um número redondo e pleno de simbolismo no que ao grau de maturidade da nossa democracia diz respeito, mas sobretudo porque separa o país de um lastro de 48 anos de ditadura e aponta para a sua contínua e incremental ultrapassagem.
E se esse processo de construção e curadoria dos processos, meios e resultados que nos conservam no lado seguro da liberdade não é um dado adquirido e deve, como é óbvio, estar assente em princípios cívicos de alerta e comprometimento constantes, o facto é que o 25 de abril de 2024 foi um assinalável acontecimento popular que clarificou qualquer réstia de dúvidas sobre se esta é uma data divisiva ou unificadora.
Também por isso era importante que alguns resquícios de tentativas de privatização desta data, sobretudo pelas alas políticas que mais abominam o capitalismo e a propriedade privada, fossem definitivamente superadas, já que nem os mais intrincados pensamentos freudianos conseguem explicar este complexo.
Para lá desses episódios de apropriação absolutista que não desconsidero nem menorizo, o que fica como nota dissonante desta marcante celebração é claramente a errática e pesporrente intervenção do Presidente da República, ainda antes do dia propriamente dito.
Valha a verdade que o espanto com as declarações de Marcelo Rebelo de Sousa já não é muito, independentemente do que diga, sinónimo bastante do desvalor da palavra com que ele próprio decidiu apoucar o seu “magistério de influência”.
Desta vez, o tempo, o modo e o conteúdo uniram-se numa coerência plena de destempero lógico, de tal grau e tipo que há muitas décadas (quem sabe mais de cinquenta) nenhum registo se lhe aproximara.
O que o Presidente da República, e não um cidadão qualquer, decidiu relatar ao país e ao mundo é de uma desconcertante desnecessidade e despropósito, sobretudo se pensarmos no contexto histórico em que estamos e o momento político por que passamos.
Não há perdão nem compreensão que cheguem, nem na mais ímpia alma cristã, que permitam a qualquer português médio, seguramente urbano-rural, lento e enigmático, classificação onde me incluo, perdoar o ensombramento de uma data límpida e solarenga perpetrado por quem ocupa o mais alto cargo da nação.
Que necessidade pode existir na cabeça de alguém lúcido e sumamente inteligente que torne inevitável a revelação de pensamentos do próprio sobre o caráter pessoal, a capacidade intelectual e até sobre a aptidão para governar dos atual e anterior Primeiros-Ministros perante uma plateia de jornalistas estrangeiros, no curso de um jantar, entre a sopa e o prato principal, como se de um fait-divers se estivesse a tratar? Desmerecer, porventura com classificações e considerações que podem ser tidas por levemente xenófobas, alguns diriam mesmo neo-colonialistas, chefes de governo de Portugal, eleitos pelo povo e que com ele conviveram, traz algum benefício de causa que me esteja a ultrapassar?
E que necessidade pode satisfazer dizer tudo isso “em on”, bem sabendo que de outra coisa se não falará e que tal condicionará a relação com os protagonistas políticos a quem antevê (no caso de Costa) ou é obrigado a reconhecer (Montenegro) presente e futuro políticos?
E como pode, ainda, nessa mesma cabeça lúcida e sumamente inteligente (todos o reconhecem), encontrar-se a disposição, motivação e criatividade distópica, para se dividir um país em retalhos, o mesmo país que nesse exato instante se encontra a celebrar uma das suas datas (re)fundadoras em clima de união, ao invocar a necessidade de reparação às ex-colónias não se sabe bem pelo quê, como, quanto e até quando?
Sem consultar ou concertar qualquer posição de política externa com o Governo, sem dar cavaco a nada nem ninguém, naquilo que parece ser apenas um ato político de autocomprazimento e de submissão aos gostos dos espectadores de ocasião – repito – o Presidente da República portuguesa vinculou-se perante estrangeiros. Fê-lo com a supremo cinismo de saber que, da parte dele, a vinculação se restringe a uma obrigação de meios, enquanto ao Governo força a uma obrigação de resultados. A Montenegro sobrava uma de duas embaraçosas soluções: ou capitular envergonhadamente e assentir nos caprichos presidenciais ou fleumaticamente defletir tal ideia, confrontando o Presidente numa fase muito primária da governação, mas não quebrando as pontes essenciais para garantir uma convivência…urbana. Escolheu a segunda. Do mal o menos, já que alguém teria de manter a dignidade do país em primeiro lugar.
A pergunta, no entanto, mantém-se, e evito sequer comentar as diatribes familiares que funcionaram como a bolorenta cereja em cima do recesso e indigesto bolo marcelista, qual o porquê desta triste demonstração de força divisiva, mais típica de um ímpeto de ganadaria do que da vã refrega política?
Só pode explicar-se com uma grande dose de maquiavelismo, porque a alternativa não é nem lúcida nem sumamente inteligente.

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