Fala-me de Amor
Ideias
2023-04-30 às 06h00
Saberão alguns leitores que a Marianne é ícone da república francesa. De tempos a tempos a imagem é renovada, tomando novo modelo, que de seguida corre país fora como estampilha postal.
Neste Março, Marlène Schiappa, vice-ministra para a cidadania, fez público que a próxima Marianne poderia ser de criação artificial e de perfil «um pouco transgênero». Será uma Marianne todos e ninguém, será uma Marianne de todos os sexos e nenhum, será uma Marianne hiper-real, embora nulo o barro que a molda, e de algoritmo o sopro que lhe insufla vida. Subtil contrassenso, que de código binário se engendre entidade que refractária é a binária divisão animal.
Escusado será dizer que Mme Schiappa emprega argumentário progressista, embora martele sofisma em cima de sofisma. Peculiar, caricato mesmo, é que se haja prestado para capa da Playboy de Abril. Capa entre o vaporoso e o discreto, acompanhada de entrevista a dúzia de páginas. Apontam-lhe o absurdo. Que não, rebate a vice-ministra, posto que todos os espaços são válidos para proclamar as boas novas do Me Too e as verdades últimas da ideologia Não-Gênero. Diria, velho psicanalista, que ela prega o contrário do que lhe pulsa no inconsciente, que desejo teria de ser uma coelhinha, uma sex symbol à moda antiga. Dirá, quem não tenha pachorra para grandes leituras, que a eleita patina em hipocrisias.
A geração que integro fez uma transição marcante em matéria de amores e do que os secunda. Trivial é hoje, o que pelos idos de 60 seria criminoso. Usufrui de plenos direitos agora, quem por essas épocas seria marginalizado. Actualmente podem falar, aqueles que então seriam silenciados. A luz diurna têm palco e pódio no presente, os que em tempos só teriam existência esconsa e sublunar. Progredimos. Estamos melhor, independentemente dos trogloditas que subsistam e saiam em safari ou cruzada em nome dos bons costumes.
Mariana Mortágua diz-se acossada por individualidade do Chega. Diz-se visada por ser de esquerda, e por ser lésbica. No mundo que integro, não tem doce Mariana que sentir-se importunada por amar da forma que entende e por se deleitar com quem lhe venha a paladar. Penso que no meu mundo viva Mariana. Penso que a própria Mariana saiba que o mundo do Chega é um tanto ao lado do nosso, tão ao lado como para conjunto vazio ser o que nos intercepta.
Vivíamos no mesmo mundo, eu e Mariana, e não a sabia eu lésbica, e não me sabia ela heterossexual. Jogo de reciprocidade que espero aprecie, recordando-lhe, de passagem, que os cães ladram e a caravana avança. Acresço, para superior tranquilidade de Mariana, que haveria quem a tomasse de ponta, ainda que nada de recriminável tivesse em activo. O mundo é assim e, em mundo assim, é infinitamente maior o conjunto dos que se estão nas tintas para a sexualidade de Mariana. Eu estou.
Não quero crer que se vitimize, pecadilho em que incorreu Olivier Dussopt, na sequência do fiasco da lei da idade da reforma. Sim, Dussopt é o mal-amado ministro francês do trabalho. Igual lamento, de amo- rável lésbica portuguesa, e de incompreendido homossexual francês. Ela, queixando-se da direita extrema. Ele, da esquerda extrema lá do sítio.
É preciso ver ao longe, para bem enxergar ao perto. Há dias, por acção desabrida de activistas femininas de esquerda, Beigbeder, escritor francês, teve de sair escoltado da Livraria Mollat, onde apresentava livro seu – Confessions d’un hétérosexuel légèrement dépassé.
Ponto assente: ele há cavernícolas por toda a parte. Quanto a mim, quanto aos que vivem no meu mundo, pois nós esperamos mais de Mariana, do que de qualquer paladino de latão do Chega.
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