Um batizado especial
Ideias
2023-01-21 às 06h00
Este início de ano trouxe, pelo menos, um pequeno sinal de alguma esperança, pese embora o nosso horizonte de forte inquietação. Esse pequeno sinal é a menos vigorosa subida da taxa de inflação, na generalidade dos países da União. Pelos dados agora conhecidos via Eurostat, houve uma ligeira descida, no último trimestre de 2022. Com efeito, a inflação homóloga, no mês de dezembro, foi de “apenas” 9,2% na “zona euro”, descendo da fasquia de 10,1% apurada, nos mesmos termos, em novembro do último ano. No que respeita aos produtos energéticos, ainda segundo o Eurostat, a quebra foi mais acentuada: num só mês (o último do ano transato), passou de 34,9% para 25,7%. Um bom sinal. Ainda que muito pequeno. Nem sequer se pode falar já de uma andorinha que, de todo o modo, por si só, não faria a Primavera. Até porque houve uma relativa manutenção da denominada “inflação de base”, ou seja, aquela que se refere à generalidade dos produtos existentes numa economia, excluindo os produtos energéticos, os produtos alimentares, o tabaco e o álcool (na medida em que estes são, por via de regra, mais voláteis em termos de alteração de preços). Essa taxa de inflação de base até acabou por subir ligeiramente, de novembro (5%) para dezembro (5,2%).
Esta ligeiríssima evolução não será alheia, de todo o modo, ao fato de o Natal ser em dezembro e de existir – por vezes, visível a olho nu para os consumidores – movimentos de inflação especulativa. Eu próprio – e desculpem os Leitores por invocar experiências pessoais – já pude verificar que, num determinado supermercado, o mesmo produto, sem sair da mesma prateleira (ou seja, sem reposição), subiu regularmente 10 cêntimos, mais ou menos de dois em dois dias. Não terá sido, seguramente, a guerra ou o preço da energia que terão justificado tal subida, sem que o produto tivesse saído da mesmíssima prateleira! Mas essa inflação de base tem um significado: independentemente de vicissitudes de produção (ou escassez dela, face à procura existente), tudo, de um modo geral, está a subir de preço. O custo de vida passará tendencialmente a ser mais elevado. Generalizou-se a inflação e teremos que nos habituar a viver (novamente) com ela. E isso conduzir-nos-á a um dilema (que, de resto, já vivemos): o poder de compra dos salários e, de um modo geral, do rendimento (pelo menos, adveniente do trabalho) diminuirá, a não ser que tais rendimentos aumentem também na mesma proporção da inflação de base. No entanto, nesta fase, um aumento dos salários significará a manutenção da pressão da procura sobre a oferta de bens e serviços e, portanto, a manutenção da tendência de crescimento dessa mesma inflação. No fundo, diríamos, usando uma metáfora corrente, “preso por ter cão e por não ter…” Se os salários aumentarem em conjugação com a inflação, esta mantém-se e poderá mesmo fortificar-se. Mas se não aumentarem, ou aumentarem menos do que a taxa de inflação (sobretudo, considerando os indicadores da dita inflação de base), então o poder de compra dos europeus (e dos portugueses) diminuirá permanentemente, a médio prazo o que motivará menor consumo, menor procura e, por conseguinte, menor crescimento económico.
O problema (chamemos-lhe o “dilema de ter ou não ter cão”) agrava-se em Portugal. Segundo recentes dados estatísticos, entre nós, cerca de 56% dos trabalhadores tem um vencimento inferior a 1000 Euros. Temos, ao invés, preços caros, quer em termos relativos, quer mesmo em termos absolutos, quando comparados com os preços dos mesmos produtos em grande parte dos países da União. Somos, sem dúvida, verdadeiros ilusionistas para sobreviver, trabalhando, em Portugal!
Como alterar esta situação que, no fundo, se agudiza mais sentidamente com a inflação?
Muitos fatores, disfunções de organização e vícios culturais terão contribuído para chegarmos aqui. As causas do nosso estado de coisas poderão ser objeto de inúmeras teses (no mínimo, de doutoramento!). Produzimos pouco, somos pouco competitivos, apesar de, um pouco por todo o lado, fora de Portugal e de “ecossistemas lusos”, os trabalhadores portugueses terem “performances” de topo! O nosso capital, o capital investido em Portugal rende menos do que o capital investido noutros ambientes? Creio que sim…. Desde logo, porque, entre outros fatores, não temos uma cultura concorrencial forte (talvez não a tenhamos, de todo!). Mesmo historicamente, sempre tivemos aversão (cultural, sociológica) ao risco e ao mercantilismo. O velho adágio oitocentista “foge cão, que te fazem barão…para onde, se me fazem visconde?!” ilustra também, em alguma medida, esse estado de espírito.
E, nos tempos mediáticos que correm, importa não esquecer que a corrupção é intrinsecamente anti concorrencial.?
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