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Não há “ruínas” na Literatura de Roma Antiga

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Não há “ruínas” na Literatura de Roma Antiga

Voz às Bibliotecas

2025-05-15 às 06h00

Aida Alves Aida Alves

Há algo de eternamente presente na literatura romana. Embora os séculos tenham corroído colunas e apagado muralhas, os textos e os respetivos autores resistem — inscritos não em pedra, mas na memória dos livros e da Humanidade que lê, comunica e ensina. Lê-se Vergílio, Horácio, Ovídio, entre outros, e tem-se a estranha sensação de que os antigos sabiam, talvez melhor do que nós, o que é ser humano.
A literatura de Roma Antiga nasceu muito do pragmatismo do povo romano e incidiram muito na renovação de estilos e declínios oriundos da Grécia. Os autores escreviam sobre o real — sobre o império, o dever, o amor e a decadência.
A Eneida, de Vergílio (na época do Imperador Augusto, século I a.C.), é mais do que uma epopeia: é um manifesto de identidade nacional, onde se assiste à celebração dos vencedores e às razões dos vencidos. Eneias, o herói, é menos herói do que veículo — leva nos ombros o peso de Roma futura. Quando tudo parece perdido, é ele quem recorda aos companheiros: "Forsan et haec olim meminisse juvabit" — “Talvez um dia seja agradável recordar até estas coisas.” E certo é que quando relemos a História, recordamos no nosso futuro o seu passado. Com Vergílio também assistimos às bucólicas, ao mundo pastoril, à importância da relação homem e natureza, à reflexão da morte e da ressurreição. É um dos poetas mais consagrados e expoente da literatura latina que deverá ser revisitado.
Horácio (séc. I a.C.), outro escritor de Roma, ensinou-nos a viver “o agora”, com o seu famoso "Carpe diem, quam minimum credula postero" — “Aproveita o dia, confiando o mínimo possível no amanhã.” Uma máxima que atravessou os séculos, desafiando o medo e a procrastinação. Foi um autor reconhecido por muitos autores mais contemporâneos, por exemplo Ricardo Reis (heterónimo de Fernando Pessoa), poeta que se baseou muito na tradição clássica. Este heterónimo faz muito o uso de arcaísmos e latinismos, sintaxe latinizante, rígido esquema métrico, sob o ponto de vista temático e filosófico pautado por uma atitude de indiferença perante a transitoriedade e efemeridade da vida, numa disciplina estoico-epicurista, culto dos deuses.
Já Ovídio (séc. I a.C.), com sua Arte de Amar, na sua poesia erótica, ousou rir-se da moral romana enquanto esculpia em palavras a arte da sedução e a leveza da transformação. Mas foi também ele quem nos lembrou, com melancolia poética: "Tempus edax rerum" — “O tempo devora todas as coisas.” Ovídio numa das suas obras mais famosas “Metamorfoses”, com cerca de 250 narrativas em doze mil versos, ao contrário do pensamento de ordem e estabilidade do imperador Augusto, mostra um mundo em constante mutação. Uniu livremente os deuses aos mortais em histórias de amor, incesto, ciúme, crime, transfigurando os homens e os deuses mitológicos em árvores, rios, pedras, animais, representando o princípio dos tempos.
No outro extremo da emoção, Séneca (finais do séc. I a.C., 65) ofereceu conselhos estoicos, como se fossem cartas de um amigo que já viveu demasiado. E escreveu: "Non scholae sed vitae discimus" — “Não aprendemos para a escola, mas para a vida.” Uma lição ainda válida numa era de valorização dos diplomas e às vezes de pouco tempo de reflexão e maturação das aprendizagens.
Por fim, Cícero (na época do Imperador César, I a.C.) — tribuno, filósofo, orador — deixou um alerta que ecoa com uma força especial hoje: "Historia magistra vitae est." A história é mestra da vida”. Não para ser decorada, mas compreendida. A sua retórica pode ser lida nos seus diálogos políticos, com muita filosofia e relação com a sociedade.
Hoje, quando o ruído digital nos sufoca, talvez devêssemos ouvir mais esses ecos antigos. Eles falam de virtudes e vícios que ainda reconhecemos ao espelho. E lembrar-nos que, mesmo na queda de impérios, as palavras — se bem escolhidas — ficam. Leia mais.

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