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O Design como ferramenta de transformação social

Portugal deve ratificar o Tratado para a Biodiversidade dos Oceanos em Alto Mar

Ensino

2025-01-31 às 06h00

Ana Curralo Ana Curralo

Com a produção industrial e consumo de massas, o design ramificou-se entre as elites e as massas, permeando virtualmente tudo o que adquirimos, incluindo vestuário, telemóveis, electrodomésticos e viaturas, não esquecendo as imagens de marca. Também a política, como actividade que diz respeito à vida pública, permeia todas as instâncias da vida quotidiana em sociedade.
Mas poderá o design influenciar a sociedade em termos de ética ou ecologia? Sendo uma atividade criativa orientada para a funcionalidade, poderá o design ter uma vertente política enquanto ferramenta de persuasão e mobilização?
O poder do design de comunicação na construção de identidades coletivas e na promoção de visões políticas está patente nos cartazes produzidos na Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Na sua propaganda, as forças partidárias usam o poder do design, aliado à imagem, para moldar perceções e conquistar o apoio da sociedade. São cartazes que incentivam o recrutamento e mobilizam as populações. No exemplo de Rosie the Riveter, "We Can Do It!”, em 1943 as mulheres são encorajadas a entrar no mercado de trabalho para apoiar o esforço de guerra.

Tornou-se num símbolo duradouro de empoderamento feminino, transcendendo o contexto original da guerra. Mais recentemente, em 2008, o cartaz de Shepard Fairey, "Hope", tornou-se um símbolo poderoso da campanha presidencial de Barack Obama e dos ideais de optimismo e poder da mudança.
Ao longo da história, os cartazes revelaram-se uma forma acessível e eficaz de comunicação, capaz de transcender barreiras linguísticas e sociais. Eles encapsulam os valores e aspirações de uma época, sendo, muitas vezes, mais do que simples ferramentas de propaganda: são artefactos culturais que documentam as lutas, as esperanças e as mudanças de sociedades inteiras.
Segundo o designer e teórico Victor Papanek (1923-1998), na sua obra "Design for the Real World" (1971), a vertente do design político envolve o uso consciente do design para promover ideologias, apoiar movimentos sociais e desafiar o status quo. Na prática, ao criar produtos, serviços, ambientes ou interfaces, os designers buscam soluções e tomam decisões que impactam indivíduos e sociedades de forma mais subtil ou mais explicita. Os produtos criados têm impacto social pelas escolhas de projeto, matérias-primas, produção e utilização. Porém, as escolhas e decisões não são neutras, reflectem visões do mundo, hierarquias de valores e prioridades, ao mesmo tempo que espelham influências socioeconómicas, culturais e políticas.

Nos assuntos públicos, parques e praças são um meio de valorização e promoção do convívio social e sentido de comunidade, mas o design de exteriores tanto pode priorizar a exclusão como a inclusão. A acessibilidade é uma manifestação política do design, em que recursos como rampas ou casas de banho adaptadas são manifestos em defesa da inclusão social de minorias desfavorecidas de cidadãos com necessidades especiais. Grandes parques caracterizam grandes cidades, como Nova Iorque, Paris ou Londres. Copenhaga, capital da Dinamarca, pretende agora ser um exemplo de urbanismo sustentável que prioriza a acessibilidade. A qualidade e disponibilidade destes locais públicos reflete e impacta atitudes quanto ao interesse público e organização social.

No design de produtos e serviços digitais, como as redes sociais, algoritmos e interfaces influenciam o que a população vê e partilha, afectando discursos e até eleições. Produtos tecnológicos podem ter tantas finalidades como a imaginação humana contemplar. Desde um drone para vigilância e segurança, ou monitorização e controlo, como arma de guerra. Impacta vidas e influência comportamentos e opiniões.
Aliado da produção industrial e consumo de massas, do marketing e publicidade, o design é indissociável da marca humana. Na sua origem e no seu alvo está o homem, em toda a sua complexidade bio-socio-cultural, na sua relação consigo mesmo e com o mundo. Seja no design gráfico, de moda, de máquinas, produtos ou digital, as escolhas que os designers fazem refletem e afetam relações sociais e de poder.

Designers críticos e ativistas utilizam o seu trabalho para desafiar o status quo, que no caso de promover a inclusão, sustentabilidade e igualdade destacam o design como ferramenta de questionamento da tradição e subversão do instituído. Noutras mãos, o design reforça a desigualdade, exclusão e consumismo. Decisões de designers reflectem as suas escolhas, que por sua vez reflectem hierarquias de valores. Veículo de decisões, escolhas e valores, o design tem impacto na sociedade e molda a forma como interagimos, seja no parque público, no mobiliário que nos rodeia, no jogo online ou na moda que nos veste. O design influencia mentalidades e a moral normativa da sociedade civil.

Mais do que actividade política no sentido panfletário e partidário, o design é político no seu contributo social como ferramenta de transformação. Com o seu potencial de desafio e reforço, o design serve necessidades sociais como a sustentabilidade, a acessibilidade e a inclusão. Serve também o arquétipo de marca, porque a mão por detrás do design é a mão do homem. Assim sendo, o design é indissociável do seu tempo e circunstâncias, e da sua dimensão humana e de transformação social.

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