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O fantasma da regionalização que nunca mais é!

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O fantasma da regionalização que nunca mais é!

Ideias

2019-09-22 às 06h00

Artur Coimbra Artur Coimbra

Quando se aproximam eleições legislativas, normalmente os temas da regionalização e da descentralização assomam ao topo da actualidade, mais ou menos envergonhadamente, mais por umas forças partidárias do que por outras, como é evidente.
Obviamente, todos são pela descentralização, o que quer que isso seja, e a maioria das vezes é imensamente pouco para o muito que o país está falho em coesão territorial, equilíbrio económico e humano.
Já está mais que demonstrado que a descentralização não corrige assimetrias, não sustém a hemorragia do interior para o litoral, não segura as populações a mais de 70/80 km da beira-mar, não cria empregos, estabilidade, motivação, encanto pelo pinhal, pela neve, pela terra quente transmontana, ou pelo medronho algarvio.

Aliás, não deixa de ser curioso assinalar que grande parte dos autarcas admite a descentralização como primeiro passo para a regionalização, como se fosse possível misturar as coisas. E não é. Aliás, a maioria das competências em diversas áreas que serão descentralizadas para as autarquias, obrigatoriamente a partir de 2021, são daquelas incumbências de que o Estado se quer livrar, alijando-as para os municípios, a troco de uns patacos. Porque se a coisa fosse interessante, o governo não abria mão dessas pérolas.
Quando se fala na possibilidade da regionalização, assoma o regresso de um fantasma que agita consciências e suscita o desfilar da maior demagogia, da desmedida, da deslavada ignorância, do chorrilho de interesses para que nada mude e tudo fique na mesma. Alegadamente porque somos um país pequeno e por isso a regionalização é absurda, como se o norte e o sul não fossem manifestamente diferentes, como se o Minho não tivesse uma idiossincrasia cultural e histórica completamente diversa do Alentejo ou do Algarve.

Aliás, não deixa de ser absolutamente eloquente o facto de que “só Lisboa está contra a regionalização do país”, conforme recente reportagem publicada pelo Jornal de Notícias, que transcreve uma sondagem sobre o tema, revelando que a maioria dos portugueses quer a regionalização.
Lisboa, naturalmente, não quer perder poder e influência, porque o poder e as decisões se concentram historicamente na capital e para qualquer assunto de alguma importância de uma qualquer pessoa ou instituição do país é necessário andar 400 ou 500 Km para ir ao beija-mão de um ministério ou de uma direcção-geral, assuntos que poderiam bem ser resolvidos a 50 Km. E Lisboa tem a maior percentagem per capita do PIB do país, superior em muitos casos a algumas regiões da Europa desenvolvida, o que não deixa de ser uma aberração e um sinal do subdesenvolvimento de Portugal enquanto um todo. Há uma cabeça, uma capital macrocéfala e rica, e um corpo miserável, com rendimentos abaixo das regiões mais pobres da Europa.

A agravar, segundo a sondagem da Pitagórica, os lisboetas não abrem mão de gerir os 26 mil milhões da Europa, a grande maioria geridos a partir de Lisboa, apesar de se destinarem sobretudo às regiões Norte, Centro e Alentejo.
Ou seja, o Terreiro do Paço quer continuar a mandar no país e concentrar o poder, de que o resto do país está mais que farto, urgindo que as coisas mudem, porque os portugueses querem justiça, equidade e igualdade no tratamento.
É claro que, para Lisboa, o resto do país continua a ser a célebre e famigerada “paisagem”, para onde se canaliza o que Lisboa não quer, para onde vão aterros, experiências, a poluição, onde acontecem incêndios, desastres, tragédias, onde viver é quase sempre sobreviver.
Por isso, não admira que o Norte, o Centro, o Alentejo e o Algarve votariam a favor se houvesse um referendo, segundo o que reza a opinião maioritária dos entrevistados, que esperam uma consulta à população pelo menos em 2020.

No caso do Norte, a região tem vindo a tornar-se cada vez mais pobre, estando a afundar-se progressivamente no contexto do país. O que significa que o Norte está a perder paulatinamente o comboio do desenvolvimento, da evolução, da modernização.
Com 3,7 milhões de habitantes e representando 28 por cento da produção nacional e 45 por cento das exportações, o investimento feito nesta região não tem acompanhado os níveis do que se tem registado na região de Lisboa, sempre em favor desta. O que equivale por dizer que, como muitos têm criticado, os grandes investimentos nacionais continuam a ter como palco privilegiado a região de Lisboa e Vale do Tejo, a capital do país, onde tudo acontece, onde tudo se concentra, sumidouro dos recursos financeiros que deveriam ter uma distribuição mais equitativa.
Os dirigentes e as elites do Norte têm o dever de meditar nestes indicadores estatísticos, para que a situação se inverta rapidamente.

Trocado por miúdos, tal significa que só a regionalização do país poderá combater estes gritantes desequilíbrios e reforçar a coesão nacional, de que tantos falam, como papagaios, mas que se verifica ser uma valente treta.
A mudança de paradigma está na institucionalização das regiões. Há que reclamar do governo a fixação do calendário da regionalização. O Norte, cada vez mais descapitalizado, não pode esperar, nem é o centralismo da distribuição dos fundos comunitários que vai resolver a situação, porque Lisboa não abdica do poder.
A regionalização vai, seguramente, nesse sentido de maior justiça!

A descentralização, sendo importante, não resolve os problemas, porque se limita a aceitar fazer o que Lisboa não quer, porque Lisboa se está borrifando para os interesses do país. As grandes decisões económicas, sociais ou culturais continuam a ser ditadas pela macrocefalia lisboeta, conceito que obviamente inclui muitos provincianos que para a capital se deslocam e acabam por assumir os tiques e as taras de quem criticavam, esquecendo-se do que eram e do que prometeram.

Retirados os espúrios fantasmas sem sentido, que atingem todos os partidos políticos, envergonhados de proporem reformas e mudanças substanciais, o país só evoluirá com a regionalização, que aproxima eleitos dos eleitores, que avizinha os decisores dos problemas que necessitam de resolução.
Um poder próximo, mais justo, mais à mão. É esse o passo que é necessário para se construir um país novo!

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