Um batizado especial
Ideias
2023-02-04 às 06h00
Em novembro de 1993, entrou em aplicação o Tratado da União Europeia (Maastricht). Na verdade, o Tratado foi assinado ainda numa europa integrando 12 Estados membros, em 7 de fevereiro de 1992. Passou, em alguns referendos nacionais, antes da respetiva ratificação. Também “chumbou” na Irlanda, pese embora tal voto de rejeição tivesse aberto um processo de renegociação entre as Instituições europeias e o governo irlandês, conducente a ulterior ratificação irlandesa. O caso mais paradigmático e mediático terá sido o do referendo francês, realizado em setembro de 1992. O “sim” ganhou com cerca de 51%. Em Portugal e por opção política, descartou-se um possível referendo que, de todo o modo, seria, acabaria necessariamente por ser, um referendo à própria integração do país. No entanto, muitos dos argumentos que foram sendo desfiados durante a campanha francesa, quer em favor do “sim”, quer do “não”, teriam sido, com propriedade, transponíveis para um hipotético caso português. Tinta anos depois de Maastricht (2023), que balanço poderá ser feito sobre o impacto e consequências daquele Tratado?
Há poucos dias, chamou-me a atenção uma nota interessante que gostaria de partilhar com os Leitores. Vendo um dos vários documentários disponíveis na Internet (e, em especial, no Youtube), sobre Maastricht e o Tratado da União Europeia, deparei-me com as declarações atuais de alguém que foi o principal assessor de um antigo político francês (Philippe Séguin) – político esse que, há trinta anos atrás, foi um vigoroso e mediático rosto do “não” ao Tratado, durante a campanha para o já referido referendo gaulês. Dizia, agora, tal quadro político que, bem vistas as coisas, a crítica que poderia continuar a fazer ao Tratado que instituiu a União Europeia era a de que tal ato europeu acabou por apressar (precipitar) “o destino da Europa e dos europeus”. Fiquei a pensar naquela ideia, expressa por um vigoroso partidário do “não a Maastricht” de há trinta anos atrás: na verdade, o ensinamento que a História nos deu (implícito naquela afirmação), bem vistas as coisas, foi o de que o caminho apontado para a integração europeia pelo Tratado, acabou por ser o naturalmente inevitável. O passo dado – independentemente de ter apressado ou não a História – foi no sentido correto! E talvez, hoje, durante a guerra na Ucrânia, a ameaça russa e o contexto geopolítico que pressiona a Europa, Maastricht e o passo então dado no aprofundamento da integração, revela-se ainda mais notoriamente acertado e fundamental.
Recapitulemos alguns dados relevantes: o Tratado de Maastricht veio abrir o caminho para aquilo que, desde o início da integração (1951, com o Tratado de Paris que criou a CECA), era o objetivo político mediato da construção europeia. Era necessário encontrar-se uma nova fórmula de interligação e de unidade política entre os Estados europeus que pudesse garantir uma paz estável e potenciadora do crescimento e da melhoria das condições de vida dos povos do” velho continente”. Era necessário superar-se, de vez, o estado de guerra permanente que assolava a Europa, desde o século XIX (pelo menos). A integração económica foi o método escolhido e consagrado. Integração económica que, sendo cumprida, conduziria a uma União – implicando uma, também ela inevitável, integração política. Assumia-se que o sentido da integração já não seria, de então em diante, predominantemente económico; era a questão da unidade política que estaria, sem inibições, em causa. Portanto, aquilo que foi consagrado com Maastricht, estava já contido implicitamente no plano e na arquitetura da integração, desde 1951.
Com Maastricht assumiu-se, entre outros aspetos de uma União Económica (segundo a teoria da integração económica) uma política monetária comum, com uma moeda única, com um Banco Central europeu e uma cidadania europeia (ou seja, apontou-se para o cidadão como sendo o principal ator/beneficiário da integração). Aprofundou-se a integração e reforçou-se a garantia de paz, a tal ponto que criamos e fomos vivendo, mesmo, uma ilusão de “era do fim da guerra”. Até fevereiro de 2022! Portanto, nessa ótica, Maastricht cumpriu o seu papel e bem. Porém, a guerra na Ucrânia veio colocar uma pressão e uma crise de contornos geopolíticos à União (à União europeia, saída de Maastricht e do respetivo Tratado). De alguma forma, um outro cenário e um outro sentido norteador para a integração, sairão desta guerra que vivemos. De alguma forma, a “era Maastricht” acabou em fevereiro de 2022. Outro(s) Maastricht, refundadores e/ou, no mínimo, reajustando a construção europeia, provavelmente surgirão a breve prazo.
Com a sessão iniciada poderá fazer download do jornal e poderá escolher a frequência com que recebe a nossa newsletter.
Escolha as categorias que farão parte da sua página inicial.
Continuará a ver as manchetes com maior destaque.
Faça login para uma melhor experiência no site Correio do Minho. O Correio do Minho tem mais a oferecer quando efectuar o login da sua conta.
Se ainda não é um utilizador do Correio do Minho:
RegistoRegiste-se gratuitamente no "Correio Do Minho online" para poder desfrutar de todas as potencialidades do site!
Se já é um utilizador do Correio do Minho:
LoginSe esqueceu da palavra-passe de acesso, introduza o endereço de e-mail que escolheu no registo e clique em "Recuperar".
Receberá uma mensagem de e-mail com as instruções para criar uma nova palavra-passe. Poderá alterá-la posteriormente na sua área de utilizador.
Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos.
Deixa o teu comentário