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O PS e as presidenciais

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O PS e as presidenciais

Ideias

2020-06-02 às 06h00

Jorge Cruz Jorge Cruz

As eleições presidenciais constituem, naturalmente, um momento alto para a Democracia portuguesa mas a verdade impõe que se diga que para o Partido Socialista esses processos eleitorais nem sempre se revestem do almejado clima interno de paz. Essa tem sido, de facto, a (triste) realidade quase constante no seio dos socialistas portugueses. E, a julgar pelos mais recentes acontecimentos, a história vai repetir-se uma vez mais em 2021.

Muitos ainda se recordarão da autossuspensão do então secretário-geral do PS, quando o partido decidiu apoiar Ramalho Eanes o qual, aliás, viria a ser reeleito logo à primeira volta. Nessa altura, estávamos em 1980, Mário Soares acabaria por quedar-se, embora conjunturalmente, ao lado dos perdedores – Soares Carneiro, o candidato derrotado, o então Primeiro-ministro Sá Carneiro, e a chamada Aliança Democrática, a coligação de centro-direita constituída pelo PSD, pelo CDS e pelo PPM, que pouco antes tinha ganho as legislativas.

Os socialistas, encartados ou não, que dedicam maior atenção à realidade política nacional também não esqueceram as manobras mais ou menos subterrâneas, com menor ou maior intensidade, em todo o caso infrutíferas mas que foram experimentadas, quando Jorge Sampaio manifestou intenção de se candidatar a Presidente da República.
Ainda bem frescas na memória de muitos estarão também as incríveis trapalhadas de 2006 e que tiveram como consequência imediata a eleição do candidato da direita, logo à primeira volta. Mário Soares, o candidato apoiado pelo PS num processo pouco claro e que deixou marcas, sofreu uma pesada derrota mas o mais desastroso para a esquerda foi o facto de essa candidatura ter impedido que Manuel Alegre forçasse a realização de segunda volta.

Dando mostras de nada ter aprendido com os sucessivos desaires, nas últimas presidenciais a história repetiu-se. O cenário algo estimulante, diria mesmo encorajador, que seria o apoio à candidatura de Sampaio da Nóvoa, um independente da área socialista a quem inicialmente o mesmo terá sido timidamente prometido, não se confirmou. E o resultado, expectável de resto, foi a dispersão dos votos socialistas por Sampaio da Nóvoa e por Maria de Belém, e a eleição do actual Presidente da República à primeira volta.

Estou plenamente convicto de que nas eleições do início do próximo ano o PS vai manter oficialmente a neutralidade que adoptou nas presidenciais de 2016, agora apoiando embora sem o declarar formalmente, a recandidatura de Marcelo Rebelo de Sousa. As inopinadas declarações de António Costa na Autoeuropa parecem deixar antever uma solução desse género. Mas será que um partido com a história e a dimensão do PS pode continuar a desvalorizar assim as eleições presidenciais?
Não me custa admitir que a polémica criada à volta das palavras do líder socialista se inscrevam numa estratégia que visa, por um lado, adiantar-se à família política de Rebelo de Sousa e, por outro, assegurar a manutenção do clima de coabitação harmoniosa que tem existido. Se no primeiro caso poderá existir alguma vantagem política pelo facto de “obrigar” a direita a acompanhar o PS, já no segundo o que estará em causa será porventura uma tentativa de “prender” Marcelo ao apoio de Costa.

A continuidade da coabitação institucional nos termos em que se tem desenvolvido assumirá, no futuro próximo, particular relevância, uma vez que não será difícil prever que os próximos meses serão particularmente difíceis. Ora, num mais que provável clima de crise económica e social, é óbvio que o Presidente da República não aceitará ficar confinado em Belém, bem pelo contrário, será previsível que venha a manter grande actividade e, desse modo, ocupando todos os palcos mediáticos disponíveis.
Sendo por demais conhecida a sagacidade de Marcelo, parece-me óbvio que, nesse como aliás em qualquer outro cenário, o PR e putativo recandidato não se deixará “prender”, embora admita que o apoio de Costa possa de algum modo contribuir para amaciar eventuais críticas presidenciais.

Como quer que seja, mesmo condescendendo com tal eventual tacticismo do líder socialista, a verdade é que ninguém sabe como será um segundo mandato do actual Presidente. Desse ponto de vista, a nossa história recente não deveria tranquilizar António Costa, mesmo reconhecendo nele o “optimista irritante” de que Marcelo falou. Aliás, será oportuno recordar, antes que seja tarde, que na caracterização que fez do Primeiro-ministro, o Presidente também falou da “outra face da realidade”. E, nesse particular, observou que “tudo tem um preço” e que “o irritante maximiza os cenários favoráveis e minimiza a hipótese de cenários desfavoráveis”. Para bom entendedor…

Um velho provérbio que chegou até aos nossos dias mantendo plena oportunidade diz que “cautela e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém”. Parece ser a conveniência de aplicar a ideia que tal ditado encerra que está a agitar o interior do PS, sendo certo que uma parte do partido alerta justamente para a eventualidade de tais cenários adversos, enquanto outra invoca questões de ordem ideológica. Os sinais que têm surgido quanto ao rumo a seguir nesta matéria parecem claros. Mas, conforme o partido já tem afirmado em relação a outros temas, a seu tempo os órgãos competentes tomarão as decisões. Há, pois, que esperar para ver se o tacticismo se impõe à ideologia.

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