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O regresso glorioso das freguesias!!!

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O regresso glorioso das freguesias!!!

Ideias

2025-01-26 às 06h00

Artur Coimbra Artur Coimbra

Todos nos recordamos que, em pleno período de domínio da tróica, por 2012, o negregado governo de Passos Coelho, assumidamente mais troikista que a dita cuja, empolgou-se na tarefa de empreender o que apelidava de “reformas estruturais” de que o país alegadamente necessitava e que há longos anos estariam adiadas, supostamente por pressão das “corporações” que em todos os sectores emperrariam a “modernização”. Esse o eterno discurso oficial, martelado vezes sem conta por tudo quanto era comunicação social, numa altura em que as redes sociais ainda estavam numa fase incipiente. Todavia, aos olhos dos mais conscientes o que se verificava é que não aconteceram reformas absolutamente nenhumas; o que se registou foram cortes brutais em diferentes áreas sociais que tiveram como único objectivo poupar e economizar, a pretexto do “ajustamento financeiro” que a tróica impôs. Porque, ao falar-se de “reformas”, estaríamos a falar de “melhorar” uma situação, concretizada na “mudança ou modificação para bem”, segundo os dicionários. As “reformas”, no sentido positivo, fazem-se para melhor servir os cidadãos, nas várias áreas.
No entanto, as alegadas reformas que os governantes alardeavam não tiveram, de forma alguma, esse sentido. Elas não passaram de reiterados exercícios contabilísticos que se destinavam apenas a conter e diminuir a despesa pública.
Isso é história, perfeitamente comprovada. E traduziu-se no corte a eito de serviços, estruturas, pessoal, em diferentes áreas, para cumprir as determinações dos troikistas, à revelia do conhecimento mínimo da realidade do país e do sentir do seu povo.
Venderam-nos a narrativa de que estávamos num momento excepcional do devir social e económico do país e que nos deveríamos contentar e ajustar, valha-nos Deus, aos ditames dos que de fora cortavam e riscavam, sem dó nem piedade. E o mais grave, no meio da situação, era um governo que se comprazia “em ir além da tróica”, disso fazendo gala e parangonas políticas.
Lembramo-nos, por exemplo, que na justiça a então ministra Paula Teixeira da Cruz ufanava-se de estar a levar a cabo a maior reforma do sector feita nas últimas décadas. Trocando por miúdos, o que assistimos então não foi a uma melhor justiça, a uma justiça mais célere, adequada e consistente, como seria de esperar, e que ainda hoje não existe, lamentavelmente, quanto mais naquela altura crítica, mas apenas se traduziu no encerramento de meia centena de tribunais, no desmantelamento e diminuição de serviços em outros. As populações ficaram melhor servidas? Claramente, não, porque o recurso à justiça ficou para muitos mais distante e dispendioso. Mas pouparam-se uns amendoins, para vanglória do governo e contentamento dos agiotas que nos emprestaram dinheiro.
O mesmo se passou na educação: os mega-agrupamentos então criados, o aumento do número de alunos por turma, os ajustamentos nos conteúdos programáticos tiveram como propósito basilar melhorar o sistema de ensino, facilitar as aprendizagens, tornar a escola lugar de melhores professores e melhores alunos, como seria desejável? Obviamente que não. Foram apenas instrumentos para reduzir custos, na maior percentagem possível, diminuindo o número de docentes e cortando nas despesas desta importante área social.
Foi assim em todos os sectores da vida social, económica, cultural e em todos os outros vectores.
Na mesma linha destruidora do país esteve a aprovação de um projecto de lei da maioria PSD/CDS-PP para a reorganização administrativa das freguesias, que se saldou na redução de 1165 freguesias das 4250 então existentes. Foi a tristemente famosa “Lei Relvas”. Quando se pensaria que uma tão monstruosa redução redundaria num ganho que se visse, apurou-se na altura que a poupança era de apenas 6,5 milhões de euros. Uma gota no oceano orçamental. A tão badalada “reforma” resumiu-se, como bem escreveu na altura o decano Mário de Almeida, presidente da Câmara de Vila do Conde durante vários mandatos, à extinção de juntas de freguesia, feita a “régua e esquadro”, de uma forma irresponsável, que causou em muitos casos imensos prejuízos às populações.
Provocou repúdio a argumentação dos subscritores deste erro histórico, ao sublinharem que as populações seriam até melhor servidas com a agregação das freguesias. Na verdade, era um raciocínio de cabo de esquadra, salvo o devido respeito pelos ditos: encerravam-se serviços, atentava-se contra a identidade das populações, acabava-se com uma das instituições mais antigas do país, ao arrepio de uma exigência de proximidade, tornando mais longínqua a relação dos cidadãos com quem estava habituado a resolver-lhe os problemas mais imediatos, e ainda se vinha sustentar, no fundo, que até era para bem dos prejudicados…
Eram essas as “reformas estruturais” de que se gabavam Passos Coelho e sus muchachos. Podem agradar aos credores e aos subservientes que por aqueles dias aplicavam o famigerado “memorando”.
Até que doze anos depois, finalmente, a Assembleia da República aprovou, e bem, a reposição de 302 freguesias no país, por desagregação de uniões de freguesias criadas pela infeliz reforma administrativa que vigorou para as eleições autárquicas de 2013. Quem reivindicou a sua autonomia e se enquadra nos critérios estabelecidos pelo parlamento, ainda bem que conseguiu repor a justiça sonegada há uma dúzia de anos.
O projecto de lei teve os votos a favor dos proponentes PSD, PS, BE, PCP, Livre, PAN e CDS-PP, o voto contra da Iniciativa Liberal e a abstenção do Chega. Estas freguesias que agora vão ser repostas foram agregadas em 135 uniões de freguesia ou extintas e os seus territórios distribuídos por outras autarquias durante a reforma administrativa anterior.
Segundo o enunciado do projecto conjunto, nos próximos meses existirá um trabalho intenso para preparar a reposição das freguesias a tempo de serem incluídas nos boletins de voto nas próximas eleições autárquicas, previstas para Setembro ou Outubro deste ano.
Pois bem: quando se esperaria que o principal autor de uma das mais controversas “reformas” dos troikistas se remetesse ao silêncio de Conrado, eis que Miguel Relvas ressuscitou, para afirmar que se trata de um erro que pagaremos caro.
Não se coibiu de apelidar a votação maioritária da Assembleia da República de um “retrocesso político” e de uma decisão “inaceitável” que “pagaremos caro”.
O ex-ministro dos Assuntos Parlamentares disse que se deveria “andar a olhar para as assimetrias regionais” ao invés de “criar mais lugares clientelares”. E sublinhou que são os municípios “mais pobres e com menos dimensões” que passam a ter mais freguesias. “Nos concelhos mais ricos, esses sabem que a escala é uma solução para os problemas”, referiu.
Deveria saber Miguel Relvas que as freguesias não são apenas divisões administrativas no território português, como levianamente as considera. São entidades históricas, bem antigas, que naturalmente foram mudando ao longo dos séculos, em função das suas competências e atribuições, mas assumem-se como instituições identitárias dos povos, sobretudo os mais isolados, a que se acrescentam factores como a proximidade e a acessibilidade face aos poderes autárquicos. Obviamente, nem todas as freguesias agregadas quiseram independentizar-se nesta altura, o que deve respeitar-se. Como deve respeitar-se as que o quiseram fazer.
Os custos do funcionamento dos órgãos autárquicos são o preço das Democracia, como acontece com os parlamentos e os governos. Nas ditaduras, manda o iluminado e todos obedecem. Fica muito mais barato. Mas é sempre preferível a pior das democracias à melhor das ditaduras!

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