Os perigos do consumo impulsivo na compra de um automóvel
Ideias
2021-11-02 às 06h00
...perguntou ao tempo “quanto tempo o tempo tem?”. O tempo respondeu ao tempo que “o tempo tem tanto tempo quanto tempo o tempo tem”.
Esta recordação da infância veio-me à memória a propósito da recente discussão sobre a marcação de eleições legislativas antecipadas. Tudo porque tem sido tema de central importância perceber-se o(s) tempo(s) que está(ão) em jogo para cada um dos intervenientes da cena política nacional.
De um lado, o Presidente da República esperaria não ter de perder tempo com o tempo que o país vai perder num ato eleitoral que é tão inesperado na sua origem quanto pode vir a ser desesperante no seu término.
Ainda assim, ao ver-se na iminência de dissolver a Assembleia da República, Marcelo Rebelo de Sousa precipita um tempo cuja elasticidade tem prazo constitucionalmente fixado (60 dias) e não espera por ninguém. Daí a necessidade de laboriosa e sabiamente urdir a malha que há de justificar uma data que não convenha a ninguém, mas que também (quase) ninguém comprometa, sempre com o interesse nacional como bússola.
Os próximos dias trarão novidades a este propósito, sendo certo que o oráculo presidencial, que toma por nome de guerra Marques Mendes, já anunciou ao país que uma eleição com esta importância não se compadece com debates entre filhoses e rabanadas. Traduzindo, Marcelo não deverá marcar eleições para data próxima do início do ano, esperando-se o final de janeiro ou início de fevereiro como data provável para o plebiscito.
Deverá ser este, portanto, o tempo que sobra aos partidos da oposição, com o PSD à cabeça, para resolver a sua situação interna e apresentar ao país a solução que irá a votos. Tempo suficiente, supõe-se, para não evitar a contenda interna já agendada para 4 de dezembro, mas que obrigará, por certo, a uma antecipação do congresso.
No CDS, prescindiu-se administrativamente do tempo, decretando-se sem efeito as eleições e congresso já convocados, tudo olimpicamente assumido por aqueles que os haviam marcado. Uma originalidade democrática que não parece augurar nada de bom para o futuro de um partido que dá sinais de querer condenar-se à insignificância.
Os partidos da esquerda têm visões diferentes sobre a temática do tempo. O PCP queria mais, não para salvar o que existe, mas para tentar criar o que até aqui nunca existiu. De acordo com os comunistas, dissolver a Assembleia da República é precipitado, preferindo-se a opção de permitir ao PS apresentar um novo orçamento que pudesse ser a base de renovação do entendimento que manteve a geringonça em funcionamento até aqui. É irrelevante para o PCP que o PS tenha dito que “tudo” fez para que o orçamento passasse, restando as famigeradas “linhas vermelhas”, designadamente no domínio laboral, para delimitar o espaço entre o possível e o impossível.
Aquelas que todos sabemos serem verdadeiras barreiras intransponíveis entre o mundo real em que o país tem de continuar a viver e o mundo utópico que o PC tem como missão e desígnio erigir, independentemente da vontade dos “trabalhadores e do povo”. Os tais “legados da troika” que, por muito que custe à esquerda admitir, significam a diferença entre atrair ou repelir o investimento e o emprego.
O Bloco de Esquerda não saberá bem o que fazer com o tempo de que agora dispõe, uma vez que será difícil descortinar a justificação, perante os seus eleitores, para que, desde 1999, data da sua fundação, 2 dos 3 governos do PS que lideraram o país nesse período tenham sido derrubados com a sua preciosa ajuda. Agarrar-se a bandeiras transformativas da sociedade e potenciadoras dos “avanços da esquerda” pode ser curto, agora que nem sequer poderá dizer presente a uma solução de governo liderada por António Costa sem parecer descaradamente falso ou oportunista.
No PS, pede-se que o tempo corra ligeiro e que as eleições surjam o mais rapidamente possível. Antes que se perceba que o modelo de coligação informal à esquerda se esgotou; antes que sejam (ainda mais) óbvios os atrasos irremediáveis a que Portugal está a ser sujeito em matéria de desenvolvimento económico e competitividade, agora que o leste da Europa começa a ver-nos pelo retrovisor; antes que seja perfeitamente interiorizado pelo eleitorado que a impossibilidade de uma maioria absoluta socialista equivale à inutilidade do voto no PS; antes que o PSD se organize e demonstre, ainda que minimamente, ser a única alternativa viável ao PS enquanto protagonista maior de um governo nacional, independentemente das geometrias que tenha de considerar nos entendimentos a traçar no espaço político não socialista.
Perante tantas variáveis temporais, haverá até quem diga que “o diabo finalmente chegou”. Valha-nos a constância de saber que se o tempo voltar a perguntar ao tempo quanto tempo o tempo tem, seguramente que o tempo continuará a responder ao tempo que o tempo tem tanto tempo quanto tempo o tempo tem. Porque a vida, essa, continua.
15 Junho 2025
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