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Os impactos do aumento das taxas de juro

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Os impactos do aumento das taxas de juro

Escreve quem sabe

2022-12-16 às 06h00

Rui Marques Rui Marques

Desde julho que o Banco Central Europeu (BCE) tem vindo a aumentar sucessivamente as taxas de juro numa esforçada tentativa de travar a inflação galopante na zona Euro. Este aperto da política monetária do BCE já conduziu a um aumento de 200 pontos base nas taxas diretoras, na sequência de três subidas dos juros num curtíssimo espaço de tempo (50 pontos base a 27 de julho, 75 pontos base a 14 de setembro e mais 75 pontos base a 2 de novembro).
Ontem mesmo, foi anunciada uma nova subida de 50 pontos base, à semelhança do que já se tinha verificado no dia anterior pela Reserva Federal Norte-Americana (FED), não estando afastada, de acordo com a Presidente do BCE, Christine Lagarde, a possibilidade de novos aumentos durante o ano de 2023.
Lembremo-nos que, durante muito tempo, as taxas Euribor negociaram em valores negativos, à boleia dos juros baixos do banco central, que procurava animar a economia e evitar um cenário de deflação.
Entretanto, o acelerado processo de retoma económica pós-pandemia, conjugado com os persistentes problemas nas cadeias de abastecimento e a crise energética provocada pela guerra na Ucrânia alterou radicalmente o contexto. Num instante, passamos de um cenário de deflação para um cenário de inflação como há muito a Europa não tinha memória.
Progressivamente, as taxas Euribor passaram de terreno negativo para se cifrarem, esta quarta-feira, nos 2,87% no caso da taxa a 12 meses, nos 2,52% na taxa a 6 meses e nos 2,08% na taxa a 3 meses.
O propósito da atual política do BCE é muito claro: abrandar o crescimento da economia até ao ponto em que este abrandamento permita baixar a inflação para um intervalo entre os 1,5% e 2%. O problema é que os efeitos da subida das taxas de juro não serão idênticos em todas as economias europeias e as mais expostas ao endividamento e com mais baixo poder de compra, como é o caso de Portugal, serão naturalmente mais penalizadas. Por outro lado, há que ter em conta o tempo que é necessário para que as medidas tomadas comecem a ter impacto na procura. Este hiato temporal pode levar a que o BCE suba as taxas a um nível acima do que a economia é capaz de suportar e provocar uma indesejada recessão económica.
Mas, atentemos a alguns dos impactos que já conseguimos verificar na economia portuguesa depois destes aumentos:
- Os juros dos novos créditos à habitação dispararam e superam os 2%, um valor recorde nos últimos seis anos. Em outubro, a prestação média do crédito habitação foi 18,7% superior à do mês homólogo. Este aumento das taxas de juro provocou, pelo terceiro mês consecutivo, uma desaceleração do crescimento do montante total de empréstimos para habitação, num sinal de que o mercado imobiliário está a arrefecer;
- O montante global de levantamentos nacionais, pagamentos de serviços e compras em terminais TPA apresentou um crescimento homólogo de 14% em novembro. No entanto, desde há 6 meses que se denota um abrandamento no ritmo do crescimento. Ainda assim, o desempenho das atividades económicas dirigidas ao consumidor final tem demonstrado uma boa performance face ao contexto adverso, embora uma parte substancial deste desempenho se deva à inflação;
- Apesar de se estar a registar um abrandamento da atividade económica, o mercado de trabalho continua a mostrar sinais de resiliência. Segundo as projeções do Banco de Portugal a taxa de desemprego em outubro será de 6,1% mantendo-se relativamente estável há cerca de um ano, depois da descida que iniciou no período pós-pandemia;
- Infelizmente, a taxa de inflação homóloga ainda não inverteu a tendência de crescimento que iniciou há cerca de um ano atrás, registando-se em outubro e novembro uma taxa superior a 10%, valores que não se observavam na economia portuguesa há mais de 30 anos.
Mas não nos deslumbremos, a resiliência demonstrada pela atividade económica e pelo mercado de emprego não vai aguentar por muito mais tempo a manutenção desta política recessiva imposta pelo BCE.
A evolução do indicador de confiança dos consumidores, que se tem vindo a agravar nos últimos 9 meses, atingindo em outubro e novembro o valor mais baixo desde o resgaste da “Troika”, deixa antever que os portugueses estão muito receosos do que os espera em 2023. Do mesmo modo, também os empresários têm demonstrado uma enorme preocupação com a evolução da economia nacional e mundial, registando um agravamento considerável do indicador de confiança, o que, naturalmente, vai fazer com que muitos dos seus projetos de investimento sejam adiados.
Com todas as organizações internacionais a reverem constantemente em baixa o desempenho da economia europeia para 2023, é bom que os responsáveis pelo BCE fiquem sensíveis às sucessivas chamadas de atenção feitas por reputados economistas e pela generalidade dos líderes dos governos europeus para que haja bom senso e equilíbrio nas medidas adotadas no combate à inflação, de forma a que “o doente em vez de morrer da doença não venha a morrer da cura”.
São conhecidos os problemas de competitividade da economia europeia face aos blocos asiático e americano, vamos, por isso, evitar entrar numa espiral recessiva de que seja difícil depois sair.

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