Correio do Minho

Braga, quinta-feira

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PDM…&M’s

Entre a vergonha e o medo

PDM…&M’s

Ideias

2019-03-19 às 06h00

João Marques João Marques

Sem querer fazer publicidade a marcas, e até porque sou do tempo em que as Pintarolas dominavam as bancas de café, não resisto, ainda assim, a fazer o paralelismo entre os célebres e arredondados pedaços coloridos de chocolate e o PDM, esse mesmo, o Plano Diretor Municipal. Tudo porque se encontra em fase de (nova) revisão o instrumento estratégico de gestão do território no concelho. Sublinhe-se que este é já o segundo processo de revisão do PDM que o executivo de Ricardo Rio enfrenta, algo que seguramente implica um esforço significativo por parte de todo o pelouro do urbanismo e dos dirigentes e funcionários municipais que diretamente respondem pela sua feitura.
Comparar a revisão de um instrumento tão sério e rigoroso com os triviais M&M’s pode parecer deslocado, mas se seguirmos de perto como se desenrola esse processo, sobretudo na ótica dos munícipes, vemos que a comparação não é assim tão descabida.
É o PDM um instrumento de planeamento e gestão territorial de grande escala, mais preocupado em coser as linhas do concelho do que os remendos do pequeno proprietário? Sim e não. Com efeito, pretende-se desenhar um todo tão harmonioso quanto possível, com resposta aos desígnios ambientais, económicos e sociais que animam a gestão política da urbe. Sendo também verdade que essa pretensão se quer tão participada na preparação como unânime nos resultados, merecendo aqui um louvor expressivo Miguel Bandeira, vereador do urbanismo, pela publicidade e integração de visões distintas que soube potenciar na última revisão, aspeto que se repetirá neste novo processo de alteração do plano.
Mas o que se ganha em visão macro, em capacidade de gestão infraestrutural e no delinear das soluções de mobilidade que mais convêm à população não pode esquecer os legítimos interesses de quem pretende edificar uma casa, implantar um complexo industrial ou simplesmente (que de simples tem pouco) cultivar os seus terrenos. E todos aqueles que acompanham de perto estas revisões dos PDM sabem quantas pretensões contrastantes existem no contexto de um território como o de Braga. São conhecidos os fenómenos de multiplicação dos ímpetos processuais tendentes a requalificar solos até aí destinados a outros fins. Pergunte-se a quem gere estes processos e ver-se-á quantos pedidos piedosos de aumento ou atribuição de capacidade construtiva chegam às suas secretárias, seja pela porta, pela janela ou pelo portão dos fundos… São como…. M&M’s, de todas cores, para todos os gostos e nem sempre chegam a saciar a fome (quando não a gula) de quem quer ver crescer em altura o que teima em não sair do plano raso das duas dimensões do papel.
Nesta nova revisão, pode mesmo acontecer que não haja M&M’s para todos, ou, pelo menos, para a grande maioria de quem os reclama. As alterações legislativas de 2014 e 2015 consagravam uma nova visão para os PDMs. Finda que estava a necessidade fulgurante de dotar o país de novas edificações, de novas infraestruturas, enfim, de betão, o legislador mudou a agulha para um novo paradigma. Era, e é, tempo de pensar na sustentabilidade do território, na requalificação do edificado existente e, concomitantemente, na penalização da propriedade mumificada, ou seja, despojada de rendimentos ou de uso consignado.
Com estas alterações, restringiu-se fortemente a capacidade de alteração do uso dos solos. A partir de agora há dois tipos de solos: urbanos, ou rurais; e não se pense que a sua reconversão será tarefa fácil. Num processo que só agora se consolidará, deixaremos de ter a abertura do passado para a requalificação do uso dos solos e é natural, até, que muitos proprietários menos atentos sejam surpreendidos pela impossibilidade, no futuro, de transformar terrenos pejados de tubérculos em prédios que tapem o Sameiro.
Certo é que o processo que aí vem será duro para todos. Para os proprietários, que verão dificultados os seus intentos de “urbanização” dos terrenos; para os técnicos encarregues de criar e consolidar um PDM que ainda terá que ser avaliado e avalizado por inúmeras entidades; e, igualmente, para quem está ao leme político deste processo, com a difícil missão de concertar interesses divergentes.
Desengane-se quem vê nestas linhas uma crítica mais ou menos velada às “inovações” legislativas que, de resto, não foram subvertidas pela última transição de governos. Portugal está hoje num patamar distinto daquele que existia há vinte anos, quando os PDM começaram verdadeiramente a ser olhados, concebidos e implementados com a dignidade que hoje lhes atribuímos. Sem ignorar que persistem desequilíbrios sensíveis no território do nosso concelho, com juntas de freguesia que merecem uma atenção especial no seu esforço de fixar população, combater assimetrias e harmonizar o território, não podemos, por outro lado, deixar de reconhecer que, até em matéria de ordenamento, há em Braga um tempo novo que não pode voltar para trás.

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