Entre a vergonha e o medo
Ideias
2023-06-13 às 06h00
Vivemos um tempo em que a artificialidade tomou conta de muita da autenticidade das nossas vidas. Da gastronomia ao turismo, da cultura ao desporto, as nossas raízes vêm sendo defenestradas pelo triunfo do artificial, tendo este chegado mesmo a classificar a inteligência.
É o resultado da evolução das sociedades, da tecnologia e da globalização. A face menos positiva de uma progressiva uniformização das comunidades.
E isso será algo com que teremos de nos ir conformando, ainda que não devamos deixar de lutar pela preservação de alguma da singularidade com que construímos a nossa identidade coletiva. Uma identidade composta, como é óbvio, por virtude e defeitos.
Em Portugal, os defeitos serão muitos, sendo um desses justamente o defeito de elencar demasiados defeitos quando falamos de nós próprios.
Para o que me interessa, o defeito que verdadeiramente me perturba é o da eterna insatisfação e temor, também apelidado de “síndrome do Velho do Restelo”.
Adoramos colocar entraves e problemas no que ainda não foi feito, apenas para, por via das dúvidas, acautelar uma concretização insatisfatória desses projetos e assim podermos triunfantemente dizer, no final, “eu avisei”.
Cá no burgo, os políticos da oposição parecem ter adotado o mote e aplicado a “síndrome do Velho do Restelo” à sua ação política. Está visto que o único triunfo que esperam ter no futuro não é o da razão quanto à ambição da alternativa, mas o da pequenez da junção combinada dos diferentes desconfortos sentidos pela população. É uma tática, possível, legítima e eventualmente de algum acerto, mas dificilmente ganhadora.
De resto, e até agora, nunca a oposição colheu ganhos nos entraves que colocou às grandes obras da atual maioria.
Assinalaram soezes trocas de favor nas permutas de terrenos no parque da rodovia e viram o Ministério Público rejeitar qualquer irregularidade e sublinhar que a troca foi benéfica para os interesses municipais.
Levantaram suspeitas de ilegalidades na Quinta das Portas, apenas para verem nascer uma obra e um espaço que dignificou uma zona, até aí, descartada como polo de qualidade de vida. Mais uma vez a justiça arquivou e desmereceu qualquer inobservância da lei.
Agora, sem que mais uma vez apresentem uma ideia alternativa para a mobilidade de Braga, ao invés de se assumirem como portadores de propostas de valor e que afirmem uma identidade autêntica e insubstituível, lembram-se de artificialmente criticar as obras da Avenida da Liberdade porque estas “afetam os festejos do S. João”.
A grande iniciativa política neste âmbito é “pedir um mesinho de adiamento” para que o corso chegue à Ponte…
Sem desprimor por todos aqueles que, como eu, sofrerão as dificuldades inerentes à supressão de faixas de rodagem, ou que, como os comerciantes, verão os seus negócios prejudicados e, sobretudo, como os moradores desta zona, cujo dia-a-dia será fortemente condicionado, é papel dos políticos autênticos tomar decisões difíceis, estruturantes e reais. Rejeitando críticas artificiais baseadas em questões de conjuntura e com o único propósito de imobilizar quem quer fazer.
Não há omeletes sem ovos e não se revoluciona a mobilidade de uma cidade sem o inconveniente de obras muito profundas e complexas. Sobretudo quando o que se projeta é a indiscutível necessidade de limitação da velocidade de circulação, o aumento das vias dedicadas a meios suaves de transporte e a priorização dos peões e dos transportes públicos face ao automóvel. Tudo objetivos centrais que deveriam ser partilhados por quem conhece (ou diz conhecer) os anseios da população.
Para além de que, como já foi explicado repetidas vezes pelo executivo, qualquer adiamento da intervenção de requalificação da Avenida da Liberdade significaria um prejuízo financeiro muito sensível, já que está em causa a execução de fundos comunitários que dependem da observação de prazos muito restritos.
O que se esperaria de quem supostamente lidera a oposição em Braga era maior sentido de responsabilidade, por um lado, e menor insensatez nas propostas que impactam diretamente na gestão do erário público, por outro.
Quem vive no curto prazo tentando aproveitar-se da insatisfação coletiva, vidrado em causas artificias e conjunturais, dificilmente sobrevive à corrida de médio-longo prazo que é a da consolidação de uma alternativa política de qualidade e com os olhos postos na vitória em 2025.
Tal como se apontava numa recente campanha publicitária na Bélgica, a inteligência artificial não consegue acabar um edifício, uma rua, ou um caminho. E, como está bom de ver, também não consegue ajudar a construir uma oposição.
13 Junho 2025
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