A responsabilidade de todos
Voz à Saúde
2020-09-19 às 06h00
São preocupantes os dados epidemiológicos relativos à prevalência de demência, situando-a como um problema global, do presente e do futuro. Afeta 50 milhões de pessoas no mundo (será o triplo em 30 anos) e 200 000 pessoas em Portugal. A sua incidência aumenta com o envelhecimento, atingindo mais de 50% da população a partir dos 90 anos de idade.
A doença de Alzheimer é a principal causa de demência. O primeiro e principal sintoma é a perda de memória para os eventos recentes. No decorrer da sua evolução, outras funções cerebrais são perturbadas, como planear objetivos, orientar no tempo e espaço, comunicar através da fala e escrita, reconhecer pessoas, utilizar objetos. A deterioração gradual destas faculdades retira ao doente autonomia e confere-lhe um estado de dependência funcional que acarreta grande sobrecarga aos cuidadores.
Tem sido realizado um enorme esforço científico na busca de um tratamento curativo. Atualmente existem medicamentos a serem testados em ensaios clínicos com resultados promissores, embora sem eficácia clínica demonstrada.
No entanto, é cada vez maior o conhecimento acerca dos mecanismos patológicos causadores da doença, sabendo-se resultarem da combinação de múltiplos fatores, que podem ser divididos em não modificáveis (idade e genética) e modificáveis (relacionados com o ambiente, estilo de vida, doenças médicas). A interação entre estes fatores ocorre de maneira dinâmica ao longo da vida e começa em idade jovem. De forma simples, um cérebro estimulado desde cedo, em exercício permanente e protegido de potenciais agressores, será mais resistente aos efeitos da doença.
Dividem-se em dois grupos as condições de saúde que podem ser alvo de intervenção: as relacionadas com hábitos/comportamentos e as resultantes de doenças médicas.
No primeiro grupo, é fundamental:
1) aumentar a reserva cognitiva, na juventude através da escolaridade e na idade adulta incentivando a atividade mental (leitura e ocupação profissional complexa);
2) promover a atividade social através do alargamento da rede de contatos e evitar o isolamento;
3) praticar regularmente exercício físico aeróbico;
4) ter cuidados alimentares, seguindo uma dieta do tipo Mediterrânico, evitar fumar ou consumir álcool em excesso.
No segundo grupo, é necessário:
1) controlar e tratar com rigor doenças como a hipertensão arterial, diabetes e hipercolesterolemia;
2) identificar atempadamente sintomas depressivos pela possibilidade de serem sinais precoces e fatores predisponentes ao desenvolvimento de demência;
3) não desvalorizar e tratar as condições associadas a privação dos sentidos que surgem com o envelhecimento, em particular a surdez.
Estima-se que a contribuição de fatores potencialmente modificáveis no risco de demência seja de 35%, um valor-oportunidade que não podemos desperdiçar!
Prevenir deve ser a primeira intervenção no combate à demência, sendo até ao momento a mais eficaz. Implementar estas medidas, além do empenho individual exige à sociedade uma estratégia coletiva, articulada, exigente e desafiante. Muito pode partir do reforço do diálogo intergeracional nas suas variadas vertentes: aproximando os espaços físicos (infantários e lares), recriando memórias e tradições (música, conto, pintura) e tecendo laços de solidariedade (voluntariado e associativismo).
Proteger o cérebro é um objetivo ao nosso alcance. Para tal, dependemos uns dos outros.
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05 Março 2024
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