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Que utilização deve ter o nosso património nacional?

A Cruz (qual calvário) das Convertidas

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Ideias

2017-11-20 às 06h00

Felisbela Lopes Felisbela Lopes

O jantar no Panteão Nacional de Lisboa promovido pelos organizadores da Web Summit incendiou recentemente as redes sociais e puxou a polémica para o espaço público político. Este fim-de-semana, o ministro da Cultura anunciou, em entrevista ao Expresso, que haverá restrições no uso de monumentos nacionais, nomeadamente nos três panteões. Será esta uma política acertada, mas há quem não concorde com esta decisão. Ora aqui está o mote para pensar como devemos gerir o nosso património.

Acho que todos percebemos que o aluguer do património nacional pode ser uma importante fonte de receitas. No entanto, a exploração de determinados espaços, pelo seu simbolismo, deveria ter algumas restrições que resultarão sempre mais do bom senso de quem decide do que da interpretação restritiva de um qualquer regulamento que jamais poderá prever todas as imaginativas solicitações que poderão surgir.

Como foi reiteradamente explicado, os responsáveis pela gestão do património nacional não terão violado qualquer norma quando deram luz verde para o jantar de encerramento da Web Summit no Panteão Nacional de Lisboa. Aliás, esse tipo de autorização não era inédita. A mesma sala já havia albergado outros jantares num passado recente. Todavia, este teve outra amplitude mediática. Porque estava ligado a um evento hipermediatizado e porque as redes sociais o expandiram sob um ângulo de indignação.

Compreensível. Olhando as fotos e as imagens em movimento do repasto a partir de um ponto exterior àquela “festa”, qualquer um de nós acharia tudo demasiado sinistro. E reprovável. Aquele espaço é, sobretudo, um dos lugares estruturantes da nossa identidade nacional, destinado a homenagear e a perpetuar a memória dos portugueses que se distinguiram por serviços prestados ao País em diferentes campos. Se é consensual a ideia de que não há festas noturnas num cemitério, como aceitá-las num Panteão Nacional?

À dimensão da nossa região, também temos espaços cuja utilização impõe um certo recato. Falo do vasto património religioso, de algum património classificado e de outros espaços simbólicos que deveriam suscitar alguma reserva de exploração. À míngua de um orçamento que permita a execução daquilo que há para fazer, é necessário encontrar criativas formas de receita adicional. E aí o aluguer de espaços revela-se uma solução simples.

Mas que deveria ser pensada com cuidado. Vamos a exemplos: será possível pensar numa basílica como a do Sameiro para um jantar privado? A resposta é evidente. Haverá casos não tão óbvios, mas uma análise mais cuidada conduz à resposta certa. Pensemos, por exemplo, no bonito Salão Medieval do Largo do Paço da Universidade do Minho, em Braga. Caberá aí todo o tipo de festas? Ou, então, pensemos no Salão Nobre do mesmo edifício cujas paredes albergam os quadros de todos os reitores da Academia. Será permitido haver aí qualquer tipo de palestras e aceitar-se-á aí qualquer tipo de conferencista? Colocado assim o problema, ninguém duvida das respostas, mas, se percorrermos tudo aquilo que uma gestão mais imponderada permitiu, os casos que não deveriam ter sido autorizados acumular-se-ão certamente...

Na entrevista dada ao Expresso, Luís Filipe Castro Mendes anunciou que a tabela de alugueres vai subir e que os panteões nacionais (os Mosteiros dos Jerónimos e da Batalha, a Igreja de Santa Clara de Coimbra e o Panteão Nacional na Igreja de Santa Engrácia em Lisboa) vão ser vedados a utilizações festivas e a qualquer serviço de refeição ou de catering. Parece-me bem. No entanto, ontem o presidente da Câmara Municipal da Batalha considerou a decisão um “disparate”, falando até que tal posição parecia atirá-los para uma eventual solução de colocar tendas e roulottes à porta do monumento nacional para servir as tais refeições que o poder central impediria... Assim não! Nunca conseguiremos valorizar o nossa património, quando em cargos de gestão se encontram pessoas que revelam uma certa dificuldade de apreender o simbolismo daquilo que são chamados a gerir.

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