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Queridos russos,

Os bobos

Queridos russos,

Voz aos Escritores

2022-03-18 às 06h00

Fabíola Lopes Fabíola Lopes

Sim, queridos russos, expressão que inclui as russas também, aprendi que o masculino engloba a representatividade de um povo e inclui nele o género feminino do mesmo. Dizer os russos e as russas parece-me sempre estranho e diferenciador mais do que unificador. Além disso, como vão poder verificar, vou escrever mais para os russos, elementos deste povo pertencendo ao género masculino.
Como estava a dizer:
Queridos russos,
Nem sei muito bem por onde começar. Talvez por dizer que não vos quero mal. Mas gostava que se revoltassem contra o ditador que desgoverna o vosso país. Não só porque está a devastar uma nação independente que luta pela liberdade e democracia, com todos os defeitos que isso possa ter, mas também porque pelo meio vai levar milhões de pessoas para a pobreza e para a fome. Incluindo-vos.
Entendo que estejais a ser endoutrinados e manipulados. Reprimidos muitos de vós. Admiro profundamente a coragem de quem se rebela e revela as suas convicções das mais variadas formas. Talvez não admire o Luka Safronov que se algemou à porta de um McDonald’s, não é um bom exemplo, mas cada um manifesta-se pela parte que lhe dói mais. Sublinhando raios de luz, admiro a coragem da Marina Ovsyannikova (a jornalista do cartaz) e vamos ver o que lhe reserva o futuro. Como ela diz, se muitos mais de indignassem não conseguiriam prender todos.
Não sou arrogante ao ponto de achar que tenho a verdade toda sobre este assunto. Não tenho. Também nós deste lado estamos endoutrinados e revoltamo-nos muito pouco. Lateja-me que a diplomacia tenha falhado, que não tenha conseguido evitar esta guerra, que o mundo ocidental tenha andado muito distraído nos seus umbiguinhos e que quando Putin avançou para a Crimeia não tenhamos reagido. Sim, lá atrás, onde tudo isto foi decidido e começou a ser preparado. Mas é fácil, e até leviano, criticar o passado a partir do futuro.
Por isso, queridos russos, queria dizer-vos que nós por cá também tivemos um ditador, não tão feroz nem com tantas raivas alimentadas. Mas também tivemos uma polícia política, a PIDE, também tivemos manifestantes e também tivemos presos políticos e censuras e torturas e desaparecimentos. Também tivemos uma guerra, a colonial, contra a qual os jovens se manifestavam. Uma guerra que fez muitas mães chorarem os filhos, muitas mulheres despedirem-se dos maridos e algumas crianças crescerem sem pai. O que valeu foi a junção dos militares ao povo e a calma e autocontrolo dos mesmos. Nasceu assim um Portugal novo, a descobrir-se e a desenhar-se, com olhos num futuro democrático e livre, a construir-se numa nova identidade. Faz este ano 48 anos, fresquinhos que estamos nestas andanças. A Ucrânia tem cerca de 30 anos, uma jovem. Não lhe partam as pernas, não lhe queimem o futuro.
Os nossos países têm paralelismo histórico como muitos mais terão. Mas é importante aprendermos uns com outros, com a história, e promover uma educação global para a paz. Os ucranianos lutam pelo seu país, pelo seu pedaço de chão amado, pelas suas casas, pelos seus filhos. Pelo futuro. Um futuro que falta nos olhos de tantas mulheres que se arrastam além fronteiras em nome da segurança dos filhos. Lutam, uns dentro outros fora, pela liberdade.
Vós, russos, pelo que lutais?
Por quem?
Já imaginaram como seria se todos pousassem as armas e as ornamentassem com camomilas ou girassóis? Os cravos vermelhos funcionaram bem connosco. Nesta altura do ano pode não haver, por isso podem ser feitas de papel. O importante é o simbolismo.
Amanhã festejamos por cá o dia do pai. O pai que cuida, que protege, que cria, que dá o exemplo, que educa, que salva. Por aí, na Rússia, foi celebrado no dia 23 de fevereiro. A invasão da Ucrânia teve início na madrugada de dia 24. No mínimo, uma ironia.

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