A responsabilidade de todos
Escreve quem sabe
2019-02-20 às 06h00
As comemorações do 40.º aniversário da Casa do Professor tiveram no passado domingo, dia 17 de fevereiro, alguns momentos especialmente marcantes, não apenas pelo que representam num evento tão significativo como este, mas também pela surpreendente (re)descoberta da riqueza patrimonial que se encontra em cada recanto de Braga. Este foi o caso dado a conhecer a algumas das pessoas presentes na eucaristia integrada nas celebrações, uma preciosidade que passa facilmente despercebida a quem circula no largo fronteiro ao Colégio D. Pedro V – a Capela de Nossa Senhora da Penha de França.
A relevância da apresentação desta capela monástica deve-se precisamente ao facto de ser desconhecida de muitos bracarenses, mas que bem merece uma visita atenta, em especial por parte de quem aprecia arquitetura religiosa. A capela, erigida em 1652 no Campo de Santa Ana – assim se chamou até 1912 a Avenida Central, idealizada por D. Diogo de Sousa no início do século XVI –, foi lugar de recolhimento de mulheres virtuosas – beatas capuchas, donzelas ou viúvas, que se regiam pela Terceira Regra de São Francisco. Cerca de meio século mais tarde (1717), D. Rodrigo de Moura Teles transformou esse espaço de recolhimento de sete mulheres em convento feminino capucho, sujeito a clausura e à Regra de Nossa Senhora da Conceição. No ano de 1879, o edifício conventual foi cedido para instalar o Asilo da Infância Desvalida D. Pedro V.
A arquitetura religiosa, maneirista e barroca é composta por igreja de planta transversal, com nave única, capela-mor e sacristia em eixo, a que se adossa lateralmente à nave, o corpo do claustro. A sobriedade da fachada é tipicamente maneirista, com portal principal de verga reta, com moldura rusticada, encimado por edícula.
O claustro é maneirista, com arcaria toscana (http://www.monumentos.gov.pt/Site/APP_PagesUser/SIPA.aspx?id=11127). A decoração interior é totalmente barroca – um mar de talha –, com paredes integralmente forradas a azulejos figurativos joaninos, da autoria de Policarpo de Oliveira Bernardes.
Segundo o historiador Eduardo Pires de Oliveira, nela se podem ver o mais belo púlpito barroco da cidade e do norte de Portugal, assim como as mais belas sanefas, talvez saídas da arte de Marceliano de Araújo, esse extraordinário escultor e imaginário setecentista bracarense. Os retábulos, igualmente de estilo barroco nacional, apresentam no retábulo-mor já alguns elementos joaninos, com é o caso do recurso a grandes anjos atlantes. A sacristia mostra azulejos seiscentistas de padrão reaproveitados e dispostos aleatoriamente.
Mas a Avenida Central tem ainda mais motivos de interesse, tendo por referência os séculos XVII e XVIII, o designado período de ouro da cidade. Além do edifício da Arcada (1715), foi contruída por volta de 1730 a casa daquele que talvez tenha sido o homem mais rico da cidade, Manuel Rebelo da Costa, hoje a sede da Casa do Professor. Esta estrutura física de forte caráter arquitetónico, com cinco vistosas sacadas, apresenta uma fachada fidedigna à simplicidade, harmonia e equilíbrio do neoclassicismo, um quadro revivalista dos princípios estéticos da antiguidade clássica, numa reação contrastante com o barroco e o rococó.
E não se ficou por aqui a construção de magníficos edificados civis e religiosos. No ano de 1724, surgiu um outro, também um recolhimento, dedicado a Santa Maria Madalena. Quem passa não deixa de o ver, mais pelo volume do que pela beleza das suas linhas – é o Recolhimento das Convertidas. Mas se entrar na capela e na miríade de quartos, os sentidos do visitante transformam-se. Talvez em nenhum outro ponto do país, refere Eduardo Pires de Oliveira, haja um edifício que conserve com tanta qualidade os espaços originais.
A construção destes exemplares e de muitos outros levou a que a Câmara Municipal, corria o ano de 1856, começasse a pensar em construir na Avenida Central o principal passeio público da cidade (destruído em 1914) e que a margem norte da praça fosse preenchida com edifícios de certo vulto e qualidade, entre os quais se destaca a casa que pertenceu a António Augusto Nogueira da Silva, o fundador da Casa da Sorte, que a deixou em testamento à Universidade do Minho, estando hoje transformada num pequeno museu. Os seus jardins são conhecidos por enquadrarem o mais belo conjunto de roseiras da cidade.
Ontem como hoje, numa cidade multissecular tão rica em património, o que verdadeiramente se releva é o compromisso individual com a (re)afirmação sucessiva de um passado coletivo, que nos identifica e valoriza enquanto bracarenses, sabendo-se que é caminhando com fidelidade à memória que o homo viator (homem viajante) dá verdadeiro sentido à vida.
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