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Ideias
2015-09-26 às 06h00
Vejamos, antes de mais, a evolução da desigualdade em Portugal tendo por base recentes publicações do Banco de Portugal e, nomeadamente do Instituto Nacional de Estatística sobre o “Rendimento e Condições de Vida, 2014, Dados Provisórios”, que indica sem sombra de dúvida que a desigualdade em Portugal tem vindo a aumentar muito aceleradamente nos últimos anos, anos de austeridade excessiva.
Assim, em 2013, “10% dos mais ricos possuíam 58,3% da riqueza total produzida no País. Igualmente, o número de milionários cresceu 28% no período entre 2010 e 2013, apesar de toda a crise económica e financeira em que temos vivido. Pelo contrário, a taxa de risco da pobreza entre 2010 e 2014 tem vindo a aumentar sistematicamente, tendo passado de 17,9% em 2010 para 25,9% em 2014, ou seja, 2,5 milhões de portugueses. Sem surpresa, Portugal aparece como um dos países da União Europeia onde a desigualdade é das maiores.
Observe-se ainda que à profunda desigualdade se associa aumento da injustiça e maior dificuldade económica da maioria da população, tudo isso, sendo num enorme obstáculo a um saudável crescimento económico sustentado e equilibrado. Uma explicação para esta crescente disparidade económica e social, ricos cada vez mais ricos, desaparecimento da classe média e aumento generalizado da pobreza está na crescente promiscuidade entre as esferas política, económica e financeira.
A propósito, passamos a citar o prémio Nobel em Economia (2001), o americano Joseph Stiglitz na sua obra “O Preço da Desigualdade, 2013”: “uma das formas como a elite financeira faz dinheiro é tirando vantagem do seu poder de mercado e poder político para se favorecer, para aumentar os seus rendimentos à custa dos outros”. Passemos então ao assunto central deste texto procedendo a uma avaliação em termos evolutivos da repartição da riqueza produzida (Produto Interno Bruto, PIB) entre a Remuneração do Trabalho “RT” e o “Rendimento do Capital” (ou Excedente Bruto da Exploração, “EBE”, lucros).
Numa visão de longo prazo podemos dizer que em geral se verifica a tendência para flutuações do peso relativo do Trabalho “RT” face ao Capital “EBE” na repartição da riqueza produzida, ora melhorando, ora piorando. Assim, temos, por exemplo, os seguintes valores amostrais: (a) década de 1950: em média, “RT” (44,3) - EBE” (45,6), (b) década de 1960 até ao 25 de Abril de 1974: em média, “RT” (45,9) - “EBE” (40,8), (c) pós-25 de Abril: 1975: “RT” (59,0) - “EBE” (24,3), ano de maior peso relativo do Trabalho face ao Capital, (d) 1980: “RT” (43,0) - “EBE” (41,4), (e) 1990: “RT” (35,1) - “EBE” (43,1) e (f) 2000: “RT” (39,0) e “EBE” (39,2).
E o que se tem passado nos últimos anos (2010 a 2014), anos de crise económica e financeira e de adoção de política de austeridade “excessiva”?
A resposta é indubitável, tem ocorrido uma diminuição sistemática do peso relativo do Trabalho “RT” face ao Capital “EBE” (para além, como referimos, de uma forte contração económica e de aumento do desemprego), com o valor da riqueza produzida (PIB) em 2014, 173 mil milhões de euros para um valor superior de 180 mil milhões em 2010, isto é, - 4%. Quer dizer, em apenas 4 anos houve uma perda de peso relativo do Trabalho “RT” na riqueza produzida (PIB) em 3%, passando de 47,15% em 2010 para 44,14% em 2014, pelo contrário, o peso relativo do Capital “EBE” nessa riqueza aumentou passando de 41,27% em 2010 para 43,35% em 2014.
Em consequência, verificou-se uma redução do emprego remunerado em - 6,44%, abaixo da redução em “RT” (Trabalho) o que provocou uma baixa da remuneração média dos trabalhadores e, logo, como a baixa do emprego remunerado foi maior que a redução da riqueza produzida (PIB) houve uma diminuição do custo do trabalho por unidade produzida (CTUP). Podemos então extrair daqui considerações importantes:
(1) Havendo uma notória dificuldade da economia portuguesa em aumentar a sua produtividade real (através de reformas estruturais, por exemplo, em investigação e inovação), o aumento da competitividade externa das mercadorias produzidas e, logo, o aumento dos lucros (Capital) tem vindo a processar-se, por um lado, pela via da redução dos custos laborais de produção (incluindo as contribuições patronais para a Segurança Social - TSU das empresas), transformando a força de trabalho de custo fixo em custo variável, através da disseminação da precarização do trabalho, dos falsos recibos verdes, etc.) e, por outro, pela via da desqualificação do nível de habilitação escolar, através da anulação da relação positiva entre crescimento dos salários e maiores habilitações escolares, assim como, da expansão dos chamados cursos profissionalizantes;
(2) Criação do “banco de horas” procurando encurtar a diferença entre tempo de trabalho e tempo de produção.
Concluindo, a abordagem económica que tem vindo a ser prosseguida no País nos últimos anos, assenta numa lógica de criação de um “modelo exportador”, onde se torna essencial a redução dos custos laborais de produção (CTUP), visando, por um lado, restringir a procura interna e, por outro, incrementar a procura externa (exportações) como resultado de ganhos de competitividade externa, embora este ganho não esteja relacionado com aumentos da produtividade real da economia, mas sim de uma indesejada e nefasta (a prazo) política de baixos salários.
20 Março 2023
18 Março 2023
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