Um batizado especial
Ideias
2020-05-30 às 06h00
A recuperação pós-Covid 19 tem estado no centro das preocupações de todos. E bem. Diria que trata-se do tema existencial que presentemente e nos próximos tempos determinará as nossas vidas. Muita esperança se tem, igualmente, depositado na ação das Instituições europeias; em grande medida, a crise que vivemos é o mais duro desafio à viabilidade próxima do projeto de integração. E- repare-se – as ondas de choque do Brexit diluíram-se na pandemia. De resto, tudo se diluiu na pandemia….
Há algumas notas que importa termos presentes, como enquadramento da nossa discussão existencial: assim, o efeito da pandemia faz-se sentir efetivamente de uma forma universal. Sob o ponto de vista económico, advinha-se não uma mera crise ou recessão (com reflexos na retração do PIB) mas uma alteração (mais ou menos dolorosa) de paradigmas de vida. A economia funciona, porém, não de forma suficiente para garantir a satisfação das necessidades (já) sentidas. Se a nossa referência for o passado (entenda-se, aquilo que sucedia há 3 meses atrás), então, o funcionamento económico é manifestamente insuficiente; inexistente, em certos setores. Isso levará necessariamente a uma reformulação de sistema e do capitalismo. Correr atrás do passado, atrás de uma alegada normalidade (que dificilmente, em toda a sua plenitude regressará às nossas vidas futuras) é uma ilusão perigosa….
Temos que acudir às situações prementes, tentar reestabelecer um quadro de vida, por enquanto, o mais parecido com esse passado; porém, sabendo que definitivamente ele nunca mais voltará. Logo, temos que pensar, consequente e operativamente, em cenários diferentes que se implantarão num prazo muito mais curto do que aquele que projetávamos há pouco tempo atrás. Na realidade, a digitalização crescente será uma das vias para o restabelecimento da economia, para um funcionamento económico capaz de produzir riqueza suficiente para suprir as necessidades. Exponenciá-la, mesmo. Porém, isso significará também mudanças estruturais nas relações e nas formas de trabalho, na mobilidade das pessoas, na assistência social que os Estados (com ou sem a ajuda da União) terão que garantir. Isso, por exemplo, aumentará exponencialmente o desemprego, de uma forma estrutural e irremediável.
Certos aspetos da globalização serão retardados. Haverá menos cosmopolitismo (menos crescimento urbano) e, de um modo geral, um certo empobrecimento generalizado. O nosso nível de “bem estar” fragilizar-se-á, comparativamente com o que tem sucedido, em termos gerais, até agora.
Os fundos europeus que se anunciam poderão ajudar a reconstrução e sobretudo, a mudança de paradigmas de vida, competindo às autoridades nacionais aproveitá-los bem e exponenciar os respetivos efeitos….
Isso, na realidade, só será alcançado com imaginação. Com ousadia e com medidas inovadoras, para tempos também eles novos….
Há várias propostas, tópicos de discussão e de políticas públicas que poderão ter agora o respetivo campo de implementação. Ou, no mínimo, de experimentação. Uma delas – que já tem sido discutida doutrinalmente – é a criação de um Rendimento Universal Garantido. Todos teriam direito a um apoio igual do Estado. Uma espécie de ordenado à cabeça, para fazerem o que quiserem…Desde logo, para suprir necessidades básicas para quem for mais afetado pelos efeitos da pandemia. Uma medida com efeitos sociais imediatos e igualmente aceite pelo pensamento liberal. Na realidade, como não há almoços grátis, isso significaria uma possibilidade/contrapartida para os Estados de, pelo menos, não expandirem a sua presença direta (e burocrática) no campo da assistência social – preservando-se simultaneamente a liberdade individual e a responsabilidade de cada um. Tem muitos “prós” e “contras”….mas é de medidas diferentes que precisamos, pelo menos, para refletir política e proficuamente.
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