Portugueses bacteriologicamente impuros
Escreve quem sabe
2022-02-15 às 06h00
O mundo começa a abrir-se novamente. Talvez mais reabilitado, ou talvez diferente, mas, o que é certo, é que nós e o mundo nos vamos encontrando outra vez, lentamente, em movimento. E esta dinâmica vai exigir algumas mudanças e transformações, muita vontade e criatividade. Vai acarretar igualmente uma grande dose de paciência e uma certa mansidão, embora a capacidade de indignação deva permanecer inalterada. Não, não tenho nenhuma bola de cristal para fazer «futurismo», mas observando a realidade à minha volta, que é ampla e heterogénea, permito-me a este risco, o de admitir algumas condições que, de uma forma ou de outra, talvez sejam estruturantes para aquilo que pode vir.
Se esta é a altura de preparar este novo retomar, também é altura de refletir sobre a melhor forma de agradecer aos que tanto deram de si durante os últimos dois anos. Os sistemas de saúde, privados e públicos, necessitam de atenção e necessitam de cuidados, para que lhes seja possível cumprir com as suas missões e os seus mandatos sociais. Veja-se: há uma necessidade de tratar e de curar daqueles que profissionalmente o fazem, há uma urgência em apostar em novos rumos e sentidos para a saúde. E esta indispensabilidade não ocorre apenas em território nacional, é internacional e diz respeito a todos os povos.
É provável que exista uma saúde «pré» e «pós» pandemia. Aconteceu isso anteriormente, a história da saúde indica esse roteiro, e devemos aproveitar as reflexões já realizadas em tempos idos a nosso favor. Por isso, e por tantas outras coisas, é altura que olhar com mais atenção para aqueles que cuidaram da saúde durante estes últimos anos – começam a ser poucos e estão (muito) cansados. O Conselho Internacional de Enfermeiros (International Council of Nurses), num dos seus relatórios de 20221, indica que no período entre 2019 e 2020 havia um número aproximado de 27,9 milhões de enfermeiros a trabalhar por esse mundo fora, mas indica ainda que, já nessa altura, existia também uma escassez de cerca de 5,9 milhões de enfermeiros, o que era preocupante. No entanto, ainda de acordo com a previsão desse Concelho, nos próximos dez anos essa escassez irá aumentar, apontando-se uma falta de, aproximadamente, 13 milhões de enfermeiros a nível internacional, mas com uma maior incidência nos países de menores recursos financeiros.
De facto, é deveras alarmante que o número de enfermeiros em falta duplique num período tão curto de tempo. Aliás, é inquietante o que se passa já no momento atual, visto que os serviços de saúde começam a dar sinais dessa falta, colocando em risco a qualidade dos cuidados de saúde e o bem-estar da população. É necessário investir mais na formação desses profissionais de saúde, não em quantidade, mas em qualidade, dando-lhes igualmente condições para que se sintam satisfeitos nas instituições de trabalho que os acolhem e oferecendo-lhes oportunidades e recompensas, que não visam somente as questões de salário. É identicamente importante trazer para os nossos espaços nacionais os enfermeiros que se encontram no exterior, que são educados cá, mas que fazem as delícias das instituições de saúde de outros países, em particular no espaço europeu.
Existem algumas variáveis que irão afetar esses próximos dez anos e a escassez de enfermeiros. Uma delas vai ser a migração, que irá aumentar e deslocar pessoas competentes de sítios onde são necessárias para outros sítios onde as mesmas possam melhorar a sua qualidade de vida. Outras variáveis a considerar serão o turnover e o absentismo, que, aliás, já começam a ser preocupantes a nível nacional. Continuo a considerar um desperdício que o país esteja a formar profissionais de saúde (enfermeiros, médicos, fisioterapeutas, etc.) e custear quase a totalidade da sua educação, para que depois estes trabalhem noutros países e contribuam para a saúde de outros – quando, na realidade, são necessários cá. Por último, apresento uma outra variável, essencial, que bem estudada ajudaria a entender qual a melhor estratégia a seguir para promover uma maior estabilidade dos enfermeiros por terras lusas, e que diz respeito às necessidades de saúde da população portuguesa.
Sim, é verdade que não há realidades perfeitas. E também é verdade que não é possível realizar tudo de uma só vez e assentada. No entanto, é possível seguir em frente, com passos seguros, se se atender ao que se passa no momento atual e às razões que o conduzem a estar como está. Se esta é a altura de nos colocarmos, todos, novamente em movimento, então também é altura de se olhar para as ações passadas e presentes, para se conseguir perceber qual é o melhor caminho a seguir. E não só no âmbito da saúde – todavia sem a esquecer.
1Buchan, J., Catton, H. & Shaffer, F. A. (2022). The Global Nursing Workforce and the COVID-19 Pandemic. Disponível em: https://www.icn.ch/news/new-report-calls-global-action-plan-address-nursing-workforce-crisis-and-prevent-avoidable
15 Junho 2025
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