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Santos, mas muito pecadores

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Santos, mas muito pecadores

Ideias

2023-11-08 às 06h00

José Manuel Cruz José Manuel Cruz

Neste fim-de-semana uma mulher judia foi apunhalada à porta do apartamento em Lyon. Dois golpes. O agressor deixou a faca no abdómen da vítima e sumiu escada abaixo. A agressão não foi grave. A Procuradoria reteve a ocorrência como uma acção antissemita, como um crime de ódio, portanto, embora tenha sido solicitada uma perícia, para descartar a eventualidade de agressão autoinfligida. A maluqueira toca a todos, e não me refiro à autoridade encarregue de fazer andar o caso. Veremos no que o exame dá.
Em cima do fim-de-semana um homem judeu foi agredido, naturalmente insultado, e roubado em Rosny-sous-bois. Não me constou que as autoridades suspeitem de falsas declarações, com vista a burla de companhia de seguros. Por outro lado, é tudo menos certo que o trio de facínoras seja identificado.
Nos últimos tempos, por grosso, os judeus franceses fazem-se o mais discretos possível – nem quipá na cabeça, nem tsitsit à cintura, as encomendas para entrega ao domicílio são feitas em nome sem ressonância hebraica, e tudo se compreende, já que no último mês montam a perto de nove centenas os actos antijudaicos, o que é mais do que o dobro do registado em todo o ano passado.
A 12 de Outubro, o imã da mesquita de Beaucaire publicou na sua conta fb o seguinte hádice: «vós combatereis os judeus e vos sobreporeis a eles, de tal sorte que a pedra diga: ó muçulmano, eis que um judeu se esconde atrás de mim – vem e mata-o». Os hádices são conselhos ou instruções tomados a Maomé pelos seus próximos e, não sendo texto sagrado, comportam ainda assim valor jurídico e religioso. Ora bem, para que ninguém falhe compreender, aqui fica a precisão – o judeu já era passível de morte antes de qualquer usurpação de solo árabe, ou a quem faziam eles frente pelo sétimo século?
Quero ir à pena caricata imposta ao imã, mas antes, com o pouco que sei dos nabateus, quero ir à «pedra». Quem hoje denominamos por árabes, em temos que já lá vão designaríamos por nabateus. Idólatras, pelo maior, veneravam as formações rochosas, que tomavam por uma manifestação da obra de deus, e em Meca – que à época de Maomé era uma cidade multiconfessional – a Pedra Negra, esse meteorito que tinham como um sinal da aliança de deus com eles. Ora, a pedra que fala no hádice, e que impele o fiel a matar o judeu, é implicitamente assimilável a uma declaração do todo-poderoso.
Demonstração feita das canduras de quem muito tomamos dores europa fora, vou então à pena aplicada ao imã – oito meses de pena suspensa, um ano de interdição de funções religiosas. O caricato, pois, é que a pena de referência para um caso como o presente, que faz uma apologia clara do terrorismo e que incita ao ódio, é de um ano de prisão efectiva e 45.000€ de multa. O Ministério Público recorreu da sentença, mas o que fica evidente é que o tribunal foi muito compreensivo.
Antecipa-se em França uma deterioração do ambiente social e, uns meses após os motins de junho-julho, podem as autoridades locais ver-se confrontadas com um falhanço rotundo na defesa da integridade física, mesmo da vida, de uma parte importante da população. Com que força ripostarão? Fá-lo-ão com os meios que o nível de desafio suponha? Ou com a complacência com que ouvimos o tiranete turco, que de tudo acusa o ocidente, sem que as nações ocidentais se dêem a brios de chamar os respectivos embaixadores?
Falhará o governo tíbio de Macron o que uma opinião pública envergonhada e enraivecida não possa desculpar-lhe, impondo a queda do executivo e eleições, de que venha a resultar a vitória de Le Pen? Como ficarão os «territórios perdidos da república», essas urbanizações que funcionam como verdadeiros enclaves de um poder alheio?

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