Automatocracia
Ideias
2023-11-27 às 06h00
O mundo muda a cada dia que passa e muda a uma velocidade cada vez maior e estonteante, surpreendente quer nos seus efeitos, quer nas suas causas. A uma velocidade tão superior e surpreendente quanto, tantas outras vezes, inevitável e previsível, fazendo que nos interroguemos “como foi possível não perceber e actuar; como foi possível não antecipar e prevenir?”
Há exemplos evidentes e cabais deste processo de mudança em toda a latitude do mundo, em toda a sua escala e dimensão. Porventura, todos nós reservamos um desses exemplos como experiência directa e singular.
Talvez porque muita dessa “mudança” seja perceptível e, dir-se-á, reclamada; talvez porque muita dessa necessidade de alteração e desse ajustamento sejam resultado da nossa acção directa, causa e efeito, surpreende que, vezes sem conta, deixemos que a reacção tome conta de nós e, perante a inerência de actuar, nos acomodemos e tudo evolua para, quando já a produzir efeitos (sejam eles positivos ou negativos) nos interroguemos sobre “o que se passa”, nos confrontemos sobre a “necessidade de fazer alguma coisa” e nos desafiemos a executar, numa atitude de conserto e remendo, não de construção e inovação.
No campo doméstico das (nossas) cidades e do mundo do urbanismo, planos e transformação do território, o plano director municipal (PDM) é tema recorrente e omnipresente, sempre tido por uns como fundamental para a boa construção e transformação do território, tido por outros como anátema castrador da potenciação do solo e da actividade humana, consensualmente tido como resultado de um processo técnico e administrativo longo, moroso, burocrático, por vezes, inconsequente e nefasto, tantas vezes, anacrónico e ineficaz.
No momento actual “corre” período de revisão dos PDM, experimentando múltiplos municípios processos de adaptação e acomodação dos seus instrumentos de planeamento à le-gislação em vigor e ao contexto urbanístico do momento e perspectivado, período esse que conhece (também) o fim do presente ano como data limite para a conclusão formal de todo o trabalho (prazo e data estes que conheceram já dois adiamentos, fazendo “arrastar” todo o processo, e seus efeitos, para lá de mais dois anos…).
Apesar de tal, recentemente, leu-se e ouviu-se reclamar novo adiamento temporal de modo a não só robustecer as propostas técnicas – dando mais tempo para aprofundar e consolidar as opções e modelos, para alargar e minuciar os trabalhos de campo e diagnóstico – como facilitar e não pressionar as análises e concertações técnicas posteriores das entidades responsáveis pela “validação” das propostas, sejam tutelas sectoriais, seja aquela mais global e estratégica (do ponto de vista estritamente técnico).
Ao contrário do que se possa transparecer, depois de dois adiamentos e de um processo que congela e adia expectativas, que condiciona e limita decisões e investimentos, que sobrecarrega e pressiona serviços técnicos, que desencontra o tempo de execução e o tempo da decisão, não surpreende nem se julga necessariamente criticável tal adiamento. Afinal, se não há condições para produzir um bom trabalho, se a satisfação das necessidades e objectivos não se esgota até ao final do ano, revelando carecer de mais tempo e substância para ser real e profícua, então é preferível “adiar para ganhar” do que “cumprir e ficar a perder”.
O que impressiona e surpreende é não se questionar, não se reflectir e discutir, para depois actuar e materializar o próprio processo, a sua morosidade temporal, a sua complexidade burocrática, a sua intrincada teia de pareceres e consultas, a sua miríade de requisitos técnicos que, invariavelmente, se traduzem na imagem actual das “revisões dos planos”: lentas, atrasadas, inconsequentes, perturbadoras… O que surpreende é não se concentrar na “causa das causas” e satisfazermo-nos com o regular adiamento. Será este o nosso fado: procrastinar?
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